'Votem o que quiserem, vamos recorrer', diz mãe de irmãos mortos em Ondina; veja vídeo

Após decisão da Justiça de manter absolvição de Kátia, Marinúbia diz que vai até o Superior Tribunal de Justiça

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  • Tailane Muniz

Publicado em 2 de outubro de 2019 às 17:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

Marinúbia desabafou após decisão (Foto: Marina Silva/CORREIO) Na maior parte do tempo, os óculos escuros camuflaram os olhos marejados da enfermeira Marinúbia Gomes, que assistiu em silêncio à sessão que julgou a anulação da absolvição da médica Kátia Vargas, nesta quarta-feira (2).

Marinúbia é mãe dos irmãos Emanuel e Emanuelle Gomes Dias, de 21 e 23 anos, que morreram na manhã de 11 de outubro de 2013, depois que a moto em que eles estavam bateu em um poste em frente ao Ondina Apart Hotel, em um acidente de carro que envolveu também a médica. (Foto: Reprodução) Ao final do julgamento, na sede do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ-BA), os desembargadores decidiram manter a decisão do júri popular, que absolveu a oftalmologista das mortes. Com a sentença dada, a calmaria no salão deu lugar ao apelo desesperado de uma mãe que, há seis anos, pede pela "responsabilização à autora" das mortes dos seus únicos filhos."Mantenho minha confiança na Justiça. Votem o que quiserem, vou à Brasília", disse ela, em aparente esforço para manter o equilíbrio emocional, ao garantir que vai recorrer da decisão junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília.O processo do que poderia cessar um "sofrimento que não tem fim", como descreve Marinúbia, começou por volta de 7h40, quando o desermbargador Nilson Castelo Branco deu continuidade à votação, já executada em outras duas sessões, em agosto e setembro passados, quando sete de 18 desembargadores votantes já haviam se manifestado. 

Restavam 11 magistrados da Turma da Câmara Criminal do TJ-BA dizerem sim ou não à manutenção da liberdade de Kátia - julgada pelo homicídio duplamente qualificado dos filhos de Marinúbia. 

Luta continua Por dez votos a quatro, a maioria decidiu que os sete jurados do tribunal popular estavam certos quando absolveram Kátia Vargas, em dezembro de 2017. No saguão da Corte baiana, minutos depois da decisão, Marinúbia alternava entre a tentativa de acalmar a irmã, Mércia Gomes, e o desejo de garantir que "a luta continua".

"Minha irmã está nervosa", dizia à imprensa, ao pedir que a irmã saísse dali. Mércia estava bastante abalada e gritava palavras de ofensa contra os desembargadores da decisão e a médica.

Em seguida, bastante abatida, Marinúbia disse atribuir "o poder" de resolver a questão de sua vida aos magistrados, a quem classificou como "homens inteligentes, que estudaram e têm a justiça nas mãos". "Quem sou eu para apontar Kátia Vargas? Agora, nós, mães, confiamos nesses homens. Eu confio neles. Que o senhor dê a inocência se ela não tocou neles e que nenhum de nós seja submetido à injustiça. Mas, se ela tocou, que seja responsabilizada". Kátia Vargas foi absolvida (Foto: Reprodução) Julgamento Nesta quarta, na sessão que decidiu manter Kátia livre, o desembargador Nilson Castelo Branco defendeu “a democracia participativa e representativa”. Em discurso de quase duas horas, salientou que “a jurisdição superior tem a competência apenas de controlar a legalidade da decisão do tribunal popular", por isso, nas palavras do magistrado, "não cabe rever a matéria porque isso estaria substituindo o papel do tribunal do júri".

O desembargador usou o tempo para justificar que o voto precisava ser esclarecido, "ainda que repetitivo". Ele leu pontos do processo, incluindo informações do laudo produzido pelo perito contratado por Kátia Vargas, Ricardo Molina, onde o material produzido diz que não houve colisão provocada. 

"Em todas as vezes em que foi interrogada, a ré negou que tenha discutido. Ela diz que acelerou apenas para ultrapassar a moto, cujo condutor andava em zig zag na pista", argumentou.

A desembargadora Ivete Caldas, que já havia votado pela anulação, contra-argumentou: "Votar pela anulação não é desrespeitar a soberania do júri, não é bem assim. Houve decisão contrária à prova dos autos", disse, ao reiterar a decisão.

Castelo Branco solicitou o primeiro adiamento da análise do processo em 7 de agosto, ao justificar que, para ele, havia necessidade de um tempo maior dada a “complexidade do conteúdo”. À época, o placar estava aberto, com um empate, de dois votos contra e dois a favor de manter a absolvição. 

Quando Castelo Branco pediu renovação de vistas, em 4 de setembro, a sessão terminou com quatro votos favoráveis à liberdade de Kátia e três contra a sentença do júri popular. 

A sessão Embora seja formada por 20 desembargadores, a Seção Criminal do TJ-BA, contou, na prática, com 18 votos. Conforme a Corte baiana, dois desembargadores não participaram do julgamento. Um por se considerar "suspeito" - ou seja, não se considera totalmente imparcial -, e o segundo foi impedido porque já participou de um ato processual referente ao caso. Os nomes não foram informados.

Relator do processo, desembargador Lourival Almeida Trindade, decidiu pela manutenção do resultado do júri na sessão de agosto. Ele foi acompanhado pelo desembargador Mário Alberto Hirs, que já havia pronunciado seu posicionamento no julgamento da Segunda Turma da Câmara Criminal do TJ-BA, em agosto de 2018. Na mesma oportunidade, votaram pela anulação o revisor, desembargador Carlos Roberto Araújo, além da desembargadora Ivete Caldas. 

Na segunda sessão de análise do júri, em setembro, votaram contra a anulação os desembargadores Abelardo Paulo da Mata Neto e Soraya Moradillo Pinto. Na contramão, o desembargador José Alfredo Cerqueira da Silva se manifestou a favor de que haja um novo júri.

Nesta quarta, com mais seis magistrados que se declararam a favor da manutenção da absolvição, incluindo Nilson Castelo Branco, o placar foi elevado a dez, sem chances de ser superado.

Quem votou contra a anulação Lourival Almeida Trindade Mário Alberto Simões Hirs Abelardo Paulo da Matta Neto Soraya Moradillo Pinto Jefferson Alves de Assis Luiz Fernando Lima Nilson Soares Castelo Branco Nágila Maria Sales Brito Sandra Inês Moraes Rusciolelli Azevedo Pedro Guerra Augusto Costa Guerra   Quem votou a favor da anulação Carlos Roberto Santos Araújo José Alfredo Cerqueira da Silva Ivete Caldas Silva Freitas Muniz Aracy Borges Lima Acidente aconteceu em outubro de 2013 (Foto: Evandro Veiga/Arquivo CORREIO) Relembre o caso Os irmãos Emanuel, 21 anos, e Emanuelle, 23, morreram na manhã de 11 de outubro de 2013, depois que a moto em que eles estavam bateu em um poste em frente ao Ondina Apart Hotel. Na época, testemunhas disseram que Kátia Vargas saiu com o carro da Rua Morro do Escravo Miguel, no mesmo bairro, e fechou a passagem da moto pilotada por Emanuel, que levava a irmã na garupa, no sentido Rio Vermelho.

Após uma parada no sinal, Emanuel teria protestado contra a atitude da médica, batendo com o capacete contra o capô do carro. Foi quando o sinal abriu para a moto, mas não para o carro da médica, que faria um retorno no sentido Jardim Apipema.

Kátia, então, segundo as investigações, furou o sinal vermelho e acelerou o veículo em direção à motocicleta. Foi quando Emanuel perdeu o controle da direção e se chocou contra o poste, em alta velocidade. Ele e a irmã morreram na hora. Após o impacto, a médica chegou a entrar na contramão e bateu, alguns metros à frente, no portão do Ondina Apart Hotel.

Ela ficou internada no Hospital Aliança e saiu de lá direto para o Presídio Feminino de Salvador, na Mata Escura, onde ficou presa por 58 dias, até ter o alvará de soltura assinado pelo juiz Moacyr Pitta Lima, no dia 16 de dezembro de 2013.

Em dezembro de 2017, sete pessoas consideraram que a médica é inocente e, portanto, não provocou a colisão que acabou com a morte dos irmãos, no bairro de Ondina, em Salvador. A decisão, no entanto, foi reformada por desembargadores da Segunda Turma da Câmara Criminal do TJ-BA. Agora, os 20 desembargadores da Seção Criminal decidirão se anulam, ou não, o júri popular que absolveu Kátia. Até agora, o placar está em dois para anular e dois para não anular. Acidente aconteceu em outubro de 2013 (Foto: Fernanda Varela/Arquivo CORREIO) Cronologia do caso - 11 de outubro de 2013: Emanuel, 21 anos, e Emanuelle, 23 anos, morrem depois que a moto em que eles estavam bateu em um poste em frente ao Ondina Apart Hotel. Testemunhas disseram que Kátia Vargas fechou a passagem da moto.

- 11 de outubro de 2013: Após o acidente, Kátia Vargas foi internada no Hospital Aliança.

- 17 de outubro de 2013: A médica deixou o Hospital Aliança em uma viatura da 7ª Delegacia Territorial (DT/Rio Vermelho) e foi encaminhada para o Presídio Feminino, no Complexo Penitenciário da Mata Escura.

- 16 de dezembro de 2013: A médica foi solta do Presídio Feminino após ficar presa por 58 dias até ter alvará de soltura assinado pelo juiz Moacyr Pitta Lima.

- 06 de dezembro de 2017: O júri popular é realizado no Fórum Ruy Barbosa. Sete pessoas entenderam que Kátia não causou a colisão que terminou com a morte dos jovens e, portanto, era inocente.

- 16 de agosto de 2018: A Segunda Turma da Câmara Criminal do TJ-BA, por maioria, decidiu anular o júri popular. A defesa de Kátia Vargas entrou com um recurso da decisão na mesma semana.

- 07 de agosto de 2019: Desembargadores da Seção Criminal começaram a julgar se o júri popular deve ser mesmo anulado ou não. Um desembargador pediu mais tempo para analisar o processo. Dois desembargadores votaram para anular e dois para manter a decisão.

- 4 de setembro de 2019: Data que os desembargadores da Seção Criminal voltaram a julgar o caso.

- 2 de outubro de 2019: Jjulgamento decide por manter absolvição de Kátia Vargas.