Washington Olivetto: ‘A publicidade brasileira se espanholizou’

Em live no Instagram do CORREIO, premiado publicitário afirmou que o setor está em crise no país

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  • Geraldo Bastos

Publicado em 18 de agosto de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Washington Olivetto  - um dos maiores publicitários brasileiros, vencedor de mais de 50 Leões do Festival de Cannes (França) - não anda nada satisfeito com a publicidade brasileira. Ele diz que o setor errou  muito nos últimos anos, perdeu as "rédeas"  do negócio e vive um dos piores momentos de sua história. Ele aponta, dentre outros equívocos,  o que  chama de  concessões negociais e de uma espécie de "deslumbramento"  dos profissionais da área em criar peças apenas com o objetivo de ganhar prêmios.

"O publicitário  brasileiro se espanholizou. Começou a fazer uma publicidade não para ser afetiva,  mas para ser  traduzível e ganhar o prêmios", diz. "A publicidade brasileira, que tinha o prestígio, o carisma e o poder econômico das publicidades americana e londrina, ficou muito menor. Sem críticas aos meus amados e queridos amigos espanhóis e argentinos, os  profissionais brasileiros foram se ‘espanholizando’ ou se ‘argentinizando’.  E assim a gente foi perdendo as rédeas dos negócios". 

Washington Olivetto  foi o convidado de ontem da live no Instagram do CORREIO comandada pelo também publicitário Joca Guanaes como parte do projeto #Segundou. Durante uma hora, Olivetto -  que desde 2017 vive em Londres (Inglaterra) com a mulher, Patrícia, e os filhos, Antônia e Theo - falou sobre a infância, a vida na Europa, comentou sobre a crise pro vocada pela pandemia do novo coronavírus, além de apontar as  lições que o mundo pode tirar para a vida pós-pandemia.

Durante a live, Olivetto lembrou  ainda que a publicidade nacional só chegou ao patamar de prestígio e de  reconhecimento  internacional por causa da mídia nacional e de  empresas de comunicação "excepcionais"  como a  Rede Globo,  a Editora Abril  e  Grupo Folha, dentre outras. "E a publicidade brasileira não tem sido nos últimos anos leal com esses veículos que tanto fizeram por ela", aponta Olivetto, que faz uma outra crítica ao setor: 

"Em busca da internacionalização,  a publicidade brasileira deixou de falar português. E a melhor maneira de você  ser internacional é ser absolutamente local. A publicidade brasileira  perdeu muito, vive um dos seus piores momentos, num dos mais difíceis momentos do país, porque o Brasil  vive hoje uma  espécie de pandemia e pandemônio, simultâneos".

Momentos difíceis  Na live, Olivetto lembrou os momentos difíceis de sua vida. Ainda menino, ficou isolado por mais de um ano, com suspeita de poliomielite. Em 2001,  foi sequestrado. Ficou  53 dias  preso dentro de um armário. "Hoje eu sei racionalizar isso. Aprendi muito na minha vida, superando as dificuldades. Sou um sujeito que cresce nas dificuldades", afirmou.

No período de isolamento, entre os 4 e 5 anos de idade,   Olivetto teve que sair da casa dos pais para morar com os tios,  ficou  longe da escola e sem contato com amigos, apenas os livros. "Aprendi a ler, a escrever. Sair no lucro. A vida tem sido muito generosa comigo", disse. "Em todos esses episódios, eu fui criando uma disciplina, para cada vez mais ser um cara que cresce na dificuldades", assinalou. 

Sobre a publicidade mundial, ele destacou que o momento é de grandes mudanças. Para ele, o setor hoje deve ser visto  como uma indústria da comunicação e quem atua na área  deve buscar ser um profissional de soluções criativas para toda e qualquer área da comunicação e dos negócios. "Estabeleceu-se no Brasil e no mundo uma competição, na minha opinião descabida e ingênua, entre o online e o off-line. Essas duas coisas devem estar somadas e integradas",  afirmou.  

Segundo ele, a tese defendida particularmente por consultorias, de que o mais importante no negócio da comunicação é saber mensurar os resultados, vai perder seu breve reinado. Já se voltou a perceber que, seja qual for a mídia, analógica ou digital, tradicional ou recente, o mais importante na comunicação é saber encantar e seduzir. "É bom calcular, é. Mas só dá para calcular, metrificar, se antes você tiver a capacidade de seduzir. Sem seduzir, não acontece coisa alguma. Foi assim, é assim, e será assim sempre". 

Olivetto disse que a pandemia vai deixar lições para o Brasil e para o mundo, mas as mudança tão sonhadas não vão  acontecer rapidamente. E qual seria a campanha para a Bahia pós-pandemia? "Unir as imagens das pessoas físicas. A nossa Bahia  tem uma quantidade de pessoas físicas   espetacular. A  somatória dessa imagem de pessoas físicas  pode fazer a imagem da pessoas jurídica Bahia, eu acho que este é o caminho". 

Ele  descartou qualquer possibilidade de participar de campanhas políticas. "Nunca fiz nenhuma campanha, nem trabalhei para empresas do governo. Costumo dizer que este foi um dinheiro muito bom de não ganhar", afirmou o publicitário. "Amo o Brasil, desesperadamente, mas não tenho a mínima vocação, nem a mínima vontade de trabalhar com qualquer que seja projeto político".

Washington Olivetto é vencedor de mais de 50 Leões do Festival de Publicidade de Cannes, dentre outras centenas de  premiações. Traz  em seu portfólio cases de sucesso como "o primeiro sutiã", da marca Valisère; a popularização nacional da empresa Bombril, com Carlos Moreno como garoto-propaganda, e a série de comerciais do Unibanco feitas com artistas da época como Luiz Fernando Guimarães e Débora Bloch.