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Da Redação
Publicado em 6 de dezembro de 2010 às 08:39
- Atualizado há 2 anos
Felipe Campos | Redação CORREIO>
Na região do Lobato, Subúrbio Ferroviário, mesmo local onde foram feitos os primeiros poços de petróleo do país, uma estreita rua que mais parece um corredor recebeu a inusitada alcunha de Rua do Corre ou Morre.>
Oficialmente batizada de Rua do Amparo, esse estreito caminho que leva a uma praça no fim de linha do bairro adquiriu o apelido muito antes da violência do tráfico de drogas assolar a área do subúrbio. Embora não esteja imune a isso, seu inusitado nome de guerra veio em decorrência de um temido grupo de capoeiristas e outros lutadores que faziam a fama da região.>
Alcunha é anterior à atual guerra do tráfico: correr ou morrer ainda é a melhor opção >
“O pessoal que vinha procurar bagunça recebia logo o aviso: ou corre ou morre, miserável!”, conta, soltando uma gargalhada, o mestre de capoeira José da Silva Cunha, o Mestre Gato, 72 anos, famoso morador da rua. O apelido, diz ele, veio quase na mesma época em que foi criada a rua, no início da década de 70.>
Ele conta que os primeiros moradores, que ocuparam o brejo que existia entre as calmas águas da Baía de Todos os Santos e o morro que dava acesso à avenida Suburbana, foram trazidos após uma tragédia que aconteceu na região. Uma série de deslizamentos vitimou centenas de famílias que moravam em morros próximos, como o da Bananeira (Baixa do Fiscal), o do Cacau e de Santa Luzia.>
Com os casebres condenados, os moradores conseguiram uma ajuda do estado que aterrou e construiu as primeiras casas que ocuparam a rua, ainda de barro. Naquele momento, a via recebeu o nome oficial de Rua do Amparo. >
A rua foi sendo ocupada e, com o próprio isolamento – só possui uma única saída para carros –, criou-se uma união entre os moradores. Assim se formou também a união de um grupo de jovens lutadores. Unidos pela localidade, eles eram o terror de forasteiros que viessem fazer baderna na localidade. “Aqui tinha muita festa e também era muita briga.>
Do povo que vinha de fora com o povo daqui. Tinha muita gente que fazia coisa errada que hoje não está mais entre nós”, conta a moradora Elza dos Santos.>
Mestre Gato diz que sempre ensinou seus alunos a não entrarem em confusão. Um de seus discípulos, Javan Silva de Oliveira, 27 anos, que hoje também ensina capoeira, lamenta que o apelido advindo das brigas entre capoeiristas da região hoje faz jus às disputas pelo tráfico. Ele ressalta, porém, que os ensinamentos de Mestre Gato e a morte de um dos traficantes da área apaziguaram a violência nos últimos dois anos no local.>
“Algumas pessoas associam o nome pela fama de muitas brigas, antes pelos lutadores, mas também agora por causa do tráfico. Poucos anos atrás estava muito ruim, mas hoje, graças a Deus, não é mais tão forte”, conta.>
HOMICÍDIOS De acordo com agentes da 5ª Delegacia, em Periperi, responsável pela área, a rua do Corre ou Morre foi palco de assassinato apenas uma vez este ano. No mês passado, um homem, identificado como Anderson Conceição França, 26 anos, com passagem por tráfico, foi assassinado na localidade. Mas, no Lobato, foram seis mortos. A realidade é diferente de outros bairros do Subúrbio que, juntos, somam 200 homicídios este ano. Periperi, por exemplo, teve 42 mortes.>
O próprio Mestre Gato afirma que já brigou muito com pessoas que estariam aliciando seus alunos para o mundo da criminalidade. Ele se diz realizado por ter doutrinado muitos garotos, como Javan. Na rua do Corre ou Morre, ele mostrou uma terceira opção: a da capoeira.>