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Bruno Wendel
Publicado em 16 de fevereiro de 2022 às 05:00
- Atualizado há 2 anos
São 22 quilômetros de asfalto cercados de vegetação. Mesmo durante o dia, a circulação de pessoas a pé quase não existe – só há veículos de um lado a outro. À noite, uma escuridão. Tais condições renderam à BA-530, popularmente conhecida como a Estrada da Cetrel, uma segunda referência: local de "desova" - devido à quantidade de corpos encontrados no local de pessoas assassinadas em outras regiões.>
A grande maioria das vítimas foi deixada no local com marcas de tiros e, em alguns casos, com mãos amarradas para trás – indícios de execução. Os casos mais recentes na Estrada da Cetrel – é uma rodovia estadual, que atravessa Camaçari, ligando a orla à sede do município – aconteceram entre o final de tarde desta segunda (14) e a manhã desta terça (15). No período, cinco corpos foram localizados no entorno da via. >
Por volta das 17h30 de segunda, quatro homens foram encontrados na entrada da Cetrel. Entre as vítimas, apenas um foi identificado – os demais estavam em estado avançado de decomposição. Já na manhã desta terça, um outro cadáver foi encontrado. Desta vez foi em frente à Flopan do Brasil, uma indústria química. Estrada da Cetrel é conhecida também como local de "desova" (Foto: Bruno Wendel/CORREIO) Os poucos moradores residem em sítios, a cerca de 5 km da via principal. O acesso a esses locais é por estrada de barro. “A gente cansou de ver corpos por aqui. Isso aqui já é deserto durante o dia, imagina à noite? Quando isso acontece, não é com ninguém daqui. Sempre é alguém de outro lugar, como Salvador, Lauro de Freitas, Dias D’Ávila”, disse um senhor. >
Ele disse ainda que há pouco mais de um ano, corpos eram "desovados" no local quase uma, duas vezes no mês. “Principalmente nos finais de semana. A gente só ouvia a notícia e ia lá constatar, pra ver se era alguém conhecido, mas sempre era gente de fora. Em alguns casos a polícia só encontrava os restos mortais enterrados e ossos na carcaça de carro queimado”, relatou. >
Perguntado se já viu alguma situação suspeita, que desse a entender que alguém estivesse deixando um corpo na região, o homem disse que sim. “Já ouvi o barulho de carro se aproximando da mata, de gente falando e arrastado alguma coisa, mas quem é maluco de sair para ver? Cansei de ir no dia seguinte no local do barulho e encontrar o cadáver no chão”, contou. >
Uma mulher, que aceitou falar depois de muita insistência, disse que as pessoas têm medo de visitá-la, mesmo durante o dia. “Parentes já disseram que não vêm aqui. Eles têm medo. Quando preço alguma coisa para trazer, a depender do horário, a entrega não vem. Às 17h o povo já fica com medo. E eu entendo, porque nós também que moramos aqui temos medo. A gente pode passar bem na hora que eles estão fazendo as coisas erradas e sobrar. A situação é muito difícil. Escureceu, todo mundo fica em suas casas”, declarou ela.>
Corpos Na tarde desta segunda, quatro pessoas foram encontradas mortas na Estrada da Cetrel. Até a tarde desta terça, apenas uma das vítimas tinha sido identificada. Trata-se de Joel Silva dos Santos, 19 anos. Ele foi morto a tiros. >
Já os corpos de três homens foram encontrados em estado avançado de decomposição. Os laudos do Departamento de Polícia Técnica ajudarão nas investigações e a identificar as vítimas. A reportagem entrou em contato com a Polícia Civil para saber se há novas informações sobre o caso, mas não houve retorno.>
A reportagem esteve pela manhã na 26ª Delegacia (Abrantes), que apura autoria, motivação e circunstâncias das mortes, mas a delegada Daniele Monteiro, responsável pela unidade, não estava. Ainda na manhã de terça, um outro corpo foi encontrado no local. Ele estava coberto por um plástico preto e policiais militares faziam a preservação do local para a perícia. De acordo com alguns curiosos, o rapaz teria 21 anos e era de Salvador, mas recentemente passou a morar em Monte Gordo, onde foi sequestrado no domingo. Corpo encontrado na manhã desta terça. A vítima seria um jovem de Salvador (Foto: Bruno Wendel/CORREIO) “A família esteve aqui mais cedo e disse que ele jogava bola, quando um grupo pegou ele e o colocou num carro. Somente hoje os parentes foram informados que o corpo estava aqui”, contou um homem. Ainda de acordo com ele, uma foto da vítima circula nas redes sociais fazendo com dois dedos a saudação de uma facção. “Ele fazia ‘Tudo 2’. A família acredita que foi por isso que pegaram ele”, contou. >
A reportagem procurou a Polícia Civil para saber sobre a investigação, mas não houve posicionamento.>
Outros casos No dia 6 de junho do ano passado, três corpos, todos do sexo masculino, foram encontrados também na Estrada da Cetrel. As vítimas, que usavam apenas bermudas, foram deixadas em um terreno baldio e estavam com as mãos amarradas e apresentavam marcas de tiros. No dia 23 de outubro do mesmo ano, outros três corpos foram encontrados na mesma região. >