QUE SUSTO!

O dia que a Estação da Lapa parecia que ia desabar

Cabo de sustentação se rompeu, em 1999, e notícias de que a estação iria ruir causaram pânico

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  • João Gabriel Galdea

Publicado em 15 de outubro de 2023 às 05:10

Cabo de aço que sustenta a parte de cima da Estação da Lapa se rompeu em 12 de abril de 1999
Cabo de aço que sustenta a parte de cima da Estação da Lapa se rompeu em 12 de abril de 1999 Crédito: Márcio Costa e Silva/Arquivo CORREIO

Quase todo soteropolitano com mais de 30 anos de idade ou, como o nome da coluna, da turma do 40+, lembra de uma antiga ‘previsão’ atribuída à vidente Mãe Dinah, aquela que disse ter antecipado a tragédia dos Mamonas Assassinas: a Estação da Lapa vai ruir.

A tal antevisão nunca foi confirmada porque, ao que tudo indica, a vidente nunca bateu um McLapa Feliz no antigo terminal (ou seja, antes da última grande reforma), e já não está entre nós para confirmar ou negar nada.

No entanto, o tal boato ganhou fôlego (ou teria nascido ali?) após um incidente em abril de 1999, quando um dos tirantes com cabos de aço que sustentam o platô (parte de cima da estação) romperam, no final de uma segunda-feira movimentada, motivando a interdição do terminal, hoje com quase 41 anos de operação - começou a embarcar e desembarcar passageiros em novembro de 1982.

Na edição de de 13 de abril de 1999, um dia após a segundona do susto, a capa do Correio da Bahia trazia a imagem dos cabos de aço partidos e a manchete “Lapa interditada por risco de desabamento”.

Logo abaixo, a foto dos materiais retorcidos e a explicação na legenda: “Com o rompimento de um dos tirantes (viga formada pelo conjunto de 16 cabos de aço) que sustentam a estrutura do terminal, a Estação da Lapa vai ficar interditada”. A previsão era de 10 dias sem buzu por lá.

Pânico

Na tarde pré-interdição total, uma parte do terminal ainda continuou funcionando. “Houve interdição parcial da Lapa, no platô superior, e, para evitar maiores prejuízos à população, foi mantido o acesso dos usuários ao subsolo”.

Mas, claro, teve gente que ficou com medo de arriscar o cocuruto. “A interdição parcial de ontem, em horário considerado de rush, já que estudantes e trabalhadores voltavam das escolas e do comércio, provocou um burburinho na Lapa. Notícias de que a estação estava para desabar começaram a circular, provocando pânico em algumas pessoas, que se recusaram a descer ao platô inferior”, cita a reportagem.

Uma dessas precavidas foi uma funcionária pública de 40 anos. “A Lapa estava em péssimas condições, a estrutura balançava quando os ônibus passavam, sem falar da umidade e da poluição que não circula. Quanto não faltou para uma tragédia?”, questionou.

Cabo de aço que sustenta a parte de cima da Estação da Lapa se rompeu em 12 de abril de 1999
Acidente fechou a estação de transbordo por mais de uma semana Crédito: Márcio Costa e Silva/Arquivo CORREIO

Pedalada e pé d'água

O dia seguinte foi de perícia para esclarecer as causas do incidente, mudança em 87 linhas que faziam base operacional na estação - todas transferidas para o Estacionamento São Raimundo (Barris) e para os terminais da França (Comércio) e da Barroquinha -, e muita chuva pra tornar as coisas ainda mais complicadas.

Choveu do alvorecer ao anoitecer, isso num contexto em que muitos tiveram que caminhar quilômetros para chegar aos compromissos. “Desorientadas, as pessoas que costumam usar a Estação da Lapa tiveram que fazer longas e desconfortáveis caminhadas debaixo de muita chuva”, destaca outra reportagem, relatando ainda que em toda a cidade sofreu com alagamentos e congestionamentos.

Por conta das longas distâncias que seriam percorridas por muitos passageiros (cerca de 450 mil pessoas, em média, passavam pela Lapa num dia útil), a compensação da prefeitura foi tornar gratuitos o acesso ao Elevador Lacerda (na época, com acesso a R$ 0,05) e o Plano Inclinado Gonçalves, por exemplo.

Antes da liberação do terminal, e o retorno à normalidade quase duas semanas depois, a empresa carioca Promon, que era a responsável pelos cálculos do projeto desde a fundação, em 82, informou que a causa mais provável do rompimento dos cabos fora a corrosão, mas não detalhou como aconteceu. Também garantiu que não havia sobrecarga dos cabos. “Existem até mais cabos que o necessário”, disse um representante da empresa.

Um pouco de história

Na época da inauguração, a Estação Clériston Andrade, nome oficial da Estação da Lapa, era considerada o maior terminal de transportes da América do Sul. Além disso, uma das escadas rolantes, a que liga a estação ao Colégio Central, no Nazaré, era tida como a maior do Brasil, com 12 metros de comprimento.

O terreno onde o terminal foi construído pertencia à Ordem das Irmãs da Imaculada Conceição, dona do Convento da Lapa. Em troca de um outro mosteiro, construído pela prefeitura no final de linha de Brotas, as freiras cederam o terreno para a construção da estação de transbordo, projetada com a proposta de equacionar a quantidade de ônibus/hora que operava na Cidade Alta, do Campo Grande à Praça da Sé.

Com 30 mil metros quadrados de área construída, a Lapa tem projeto arquitetônico assinado pelo famoso João Filgueiras, o Lelé, realizado pela empresa Soares Leone.