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Thais Borges
Publicado em 20 de setembro de 2025 às 05:00
Se a paisagem de Salvador faz parecer que farmácias são o estabelecimento mais comum por aí, esse reinado pode ter chegado ao fim. Outro tipo de estabelecimento ligado à saúde passou a dominar as ruas, nos últimos anos: as academias e centros esportivos de qualquer tipo. >
Enquanto as farmácias tradicionais, sem manipulação de fórmulas, eram 1.597 este mês, estabelecimentos dedicados a "atividades de condicionamento físico" chegaram a 1.671, segundo a Secretaria Municipal da Fazenda (Sefaz). O setor está em expansão e, na avaliação de especialistas da área, ainda tem espaço para crescer e empreender. >
No fim de agosto, a última edição da Fitness Brasil, principal feira do setor no país, foi 40% maior do que em anos anteriores, tanto quanto ao número de negócios quanto ao total de área ocupada. Além disso, a busca pelos termos "academia em Salvador" cresceu 190% nos últimos cinco anos, segundo o Google Trends. >
"O que a gente vê é que houve uma conscientização pós-covid. As pessoas estão indo mais para a academia. Depois, vejo uma questão de informação. Se você está bem informada, a decisão de ir à academia é vinculada", analisa o diretor regional da Associação Brasileira de Academias (Acad) na Bahia, Rafael Coelho, proprietário da rede Go Cross. "Tem também uma influência das redes sociais que é positiva. As pessoas vão percebendo que por mais que você viva mais, todo mundo quer viver melhor. Considero um ciclo virtuoso: as pessoas se conscientizam que têm que ir para a academia e as academias dão opções para o mercado crescer". >
Em expansão em Salvador, academias ultrapassam farmácias
Essa tendência é vista de forma semelhante pela analista técnica do Sebrae Adriana Pereira. A ênfase em buscar bem-estar físico e mental tem estimulado que mais pessoas procurem estilos de vida mais ativos, na avaliação dela. "Médicos de todas as áreas recomendam que a atividade física é primordial", diz. >
Há, ainda, aspectos específicos de Salvador. "Por ser uma cidade com uma grande área a céu aberto e muitas praias, as pessoas têm uma preocupação para se sentir bem ao frequentar esses ambientes", afirma. "Outro aspecto é que muitos profissionais de educação física não querem ou acreditam que não adianta ser funcionário de outras academias, seja por salário ou por outras questões, e preferem abrir seu próprio negócio", acrescenta Adriana. >
‘Família’>
A oportunidade para fundar a Start Fitness, no Pau Miúdo, veio justamente enquanto a proprietária da academia, Viviane Dantas, trabalhava em outra academia. Ela tinha começado como professora em uma rede e, com o tempo, se tornou coordenadora de oito unidades. Quando o antigo proprietário quis encerrar o negócio, ela negociou sua rescisão trabalhista com a compra de uma das unidades. >
Sete anos depois, ela se prepara para abrir uma nova unidade, agora no Subúrbio. A previsão é de abrir até dezembro. "Vejo um mercado em ascensão, com um crescimento que a gente consegue visualizar tanto com academias de rede quanto com academias de bairro", diz. >
A Start Fitness funciona de segunda a sábado. A mensalidade é R$ 100, mas, se a pessoa pagar no pix ou em espécie, pode cair para R$ 79,90. Ainda assim, ela acredita que, em algum ponto, as unidades de franquia podem acabar quebrando academias de bairro. "Na minha primeira unidade, tenho oito esteiras. Agora, abriu uma Sky na Avenida Barros Reis, que fica a 15 minutos do Pau Miúdo. Uma academia de rede já abre com 20 esteiras", pondera. >
Para a nova filial, ela encontrou uma área que não tem outras academias por perto. Além da musculação, a empresa oferece modalidades como pilates e boxe. Para não perder alunos, ela aposta no diferencial do acolhimento. Entre eles, costumam se chamar de ‘família Start’. "A gente só falta ir na casa do aluno para estimular que ele venha treinar". >
Uma das alunas é a técnica em nutrição Alana Silva, 35, que se matriculou há três meses, após pouco mais de um ano sem praticar atividade física. "Voltei por questões de saúde, tanto física quanto mental. Estava me sentindo muito ansiosa e a atividade física ajuda demais. Estou me sentindo revigorada", diz ela, que tem frequentado de segunda a sábado. >
Diante de tanta oferta, ela observou critérios como a localização e a forma como foi recebida pelos profissionais da casa na hora de escolher a empresa. "Já fui para academia de rede também, mas acho que eles não dão uma atenção grande ao aluno. Na academia de bairro, o atendimento fez com que eu me sentisse mais à vontade". >
Ela também acredita que não é preciso investir grandes valores de dinheiro para conseguir treinar. Alana não usa, por exemplo, aparelhos como smart watches ou outros aparelhos tecnológicos. "Preciso de roupa adequada e tênis adequado, além de suplementação e alimentação. Mas não é nada que tenha muito peso nas minhas contas". >
Protagonismo>
Salvador se tornou uma praça relevante mesmo para os gigantes do setor. Para a maior rede de academias da América Latina, a Smart Fit, a Bahia é um mercado importante e Salvador é considerada uma das cidades mais engajadas, segundo o COO (Chief Operating Officer, diretor de operações) da marca, Diogo Corona. >
"(A Bahia) É um dos estados com mais academias abertas no país, com um protagonismo evidente no Nordeste. Seguimos atentos às oportunidades de expansão na capital e em outras regiões do estado, sempre avaliando pontos estratégicos para oferecer mais conveniência e acesso aos nossos clientes", diz. >
Para ele, o protagonismo do segmento fitness em Salvador é emblemático e mostra como a percepção de saúde vem se transformando. "Por muito tempo, a saúde esteve ligada principalmente ao tratamento de doenças — daí a relevância histórica de farmácias. Hoje, a sociedade olha cada vez mais para a prevenção e para a qualidade de vida e a prática regular de atividade física ocupa um papel central nesse movimento. O crescimento das academias acompanha essa mudança de mentalidade", acrescenta. >
Com um perfil de clientes que inclui desde jovens começando a treinar até pessoas mais velhas que buscam qualidade de vida, a Smart Fit costuma atrair quem quer unir conveniência, tecnologia e uma boa relação custo-benefício. "A musculação é, sem dúvida, o principal motivo que leva as pessoas a buscarem a Smart Fit. Por isso, temos investido continuamente em ampliar as áreas de peso livre e em oferecer equipamentos modernos", diz Corona. >
Mesmo quem está há mais tempo no mercado percebe que há ares mais propícios à atividade física em Salvador. Localizada em um casarão construído na década de 1950, a Villa Forma funciona há 24 anos no Rio Vermelho. >
"A quantidade de academias aumentou muito e a preocupação com a saúde também", diz a diretora da Villa Forma, Carol Sousa. "Acho que finalmente todo mundo caiu na real de que é realmente necessário ficar com o corpo e a mente em forma. Não são só academias, mas basta ver a quantidade de pessoas correndo na rua. Tem academias de todos os preços e, se não tem dinheiro, a gente ainda pode fazer caminhada de frente para o mar". >
Ela reconhece que existem tendências e atividades da moda. Atualmente, as aulas que estão em alta são de modalidades como yoga e mobilidade, além da clássica musculação. Segundo Carol, uma preocupação da empresa é sempre observar as demandas da sociedade. Por isso, a Villa Forma também oferece aulas de defesa pessoal. Uma vez por mês, elas ainda são gratuitas e abertas à comunidade de fora do estabelecimento, com foco em mulheres. "A gente sabe que muitas vezes (o autor da violência) é o parceiro ou ex-companheiro, então é uma forma de se liberar daquela situação de risco". >
Para se manter numa concorrência que oferece preços agressivos nas redes low cost, ela aposta nos serviços diferenciados. De acordo com Carol, até os custos de manutenção, pela estrutura de casarão restaurado, são maiores. >
"Uma academia low cost trabalha no valor mínimo. São academias boas, que têm seu espaço otimizado, mas não vão ter uma piscina ou uma quadra de squash, como a gente tem. Vão colocar uma sala bem cheia de maquinário, porque é aquela coisa de produção. Na Villa Forma, não. Tem alunos que passam a manhã inteira na academia, tem loja Track&Field, tem espaços para que a pessoa passe um tempo lá. A gente não quer que a pessoa chegue e saia". >
Possibilidades>
Apesar de já ter tanta academia, ainda há espaço no mercado, na avaliação da analista técnica do Sebrae Adriana Pereira. Entre as dicas, ela diz que é importante escolher uma região que não esteja saturada ou identificar possíveis nichos de especialização. >
"A gente tem as grandes academias e suas filiais na cidade com um padrão de volume de clientes e de pacotes flexíveis, o que atrai muitos jovens. Mas existem campos que podem ser explorados, como o da terceira idade, com um atendimento personalizado, ou para pessoas em processo de recuperação física". >
Os custos para montar uma academia de bairro pequena são de pelo menos R$ 50 mil. A pessoa deve se preparar para trocar equipamentos em, no máximo, três anos, tanto porque podem ficar desatualizados quanto pela maresia em Salvador. >
Já a franquia de uma grande academia de rede precisa de um investimento inicial de pelo menos R$ 3,5 milhões, de acordo com Rafael Coelho, diretor regional da Acad na Bahia. Quem opta por esse tipo de negócio vai receber, da marca, estudos de mercado e de localização. Além disso, são projetos que já contam com marketing próprio. >
Uma das dificuldades hoje é o valor de aluguel. A maioria dessas grandes academias precisa de imóveis com mais de mil metros quadrados e o custo pode tornar a operação inviável. >
"É uma reclamação que escuto de CEOs de grandes redes. Algumas abriram no Nordeste inteiro (recentemente), mas nunca mais fizeram inauguração aqui", diz. Outra possibilidade são os estúdios, que ainda estão começando em Salvador, como os de bike ou de hot yoga. "Os estúdios acabam sendo o que a gente chama de academias boutique. São mais nichadas, mas também são estratégicas". >
Nos últimos anos, a entrada de um novo agente tem sido responsável por mudar o mercado: os agregadores, como o Wellhub (GymPass) e TotalPass. Só a Wellhub já aumentou o número de parceiros - ou seja, os empreendimentos que aceitam o passe - em mais de 25% apenas em 2025. No ano passado, a marca cresceu pouco mais de 30% em todo o Brasil. >
Em Salvador, de acordo com a Wellhub, o passe já é aceito por redes como a Alpha Fitness, Hammer, Lion Fitness, Pure Pilates, Rede Fluir, Selfit e Well Up. De acordo com a marca, os parceiros locais usam a plataforma para fortalecer o reconhecimento de marca, otimizar espaços ociosos e atrair novos usuários que não estavam matriculados em academias. >
"Atualmente, registramos em média mais de 540 mil check-ins mensais em Salvador, impulsionando a receita incremental e consolidando o bem-estar corporativo como um pilar essencial para o crescimento dos nossos parceiros na capital baiana", disseram, através da assessoria. >
Com a planos que vão de R$ 35 a R$ 699, os agregadores permitem que a pessoa frequente diferentes estabelecimentos com a assinatura. "Eles fizeram muita diferença na forma como você cobra e na forma como alunos podem usar. Tem academias que comemoram e outras que sofrem com isso, mas é algo que mudou o mercado. Os estúdios e as pequenas academias não têm muito poder de negociação", diz Rafael Coelho, da Acad.>
"Quando você entra, é muito difícil sair. Se você tem 30%, 40% de receita desse público, como sai? Para grandes academias e quem consegue grandes volumes, é bom. Mas a relação não é tão saudável como era antes". >
Proprietária da academia Start Fitness, Viviane Dantas aceita o Wellhub e conta que, no início, a adaptação foi complicada. "A renda dá uma caída considerável e, se você não aceitar, perde o aluno. Como está em expansão, muitas empresas fazem a efetivação. Se eu não aceitar na minha, meu vizinho vai aceitar", diz. >
Hoje, ela diz que conseguiu se organizar e ajustar a conta. "Você perde de um lado e ganha de outro (com mais alunos)", diz ela, que aderiu ao plano básico. Para tornar a mensalidade normal competitiva, Viviane tem mantido o preço há dois anos, sem aumento. "Mas não tem como segurar por muito tempo. Acredito que a gente consegue manter pelo menos até dezembro". >