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Baianos lutam pelo que ainda resta de igreja na Chapada Diamantina

Mesmo com risco de desabar, São Miguel das Figuras recebe grupos fascinados pelas ruínas

  • Foto do(a) author(a) Tharsila Prates
  • Tharsila Prates

Publicado em 6 de setembro de 2025 às 09:30

Ruínas da Igreja de São Miguel das Figuras, na Chapada Diamantina
Ruínas da Igreja de São Miguel das Figuras, na Chapada Diamantina Crédito: Divulgação

A menos de um mês da grande festa para São Miguel Arcanjo, no próximo dia 29 de setembro, a preocupação da comunidade de Jacobina e região com as ruínas da igreja só aumenta.

Chegarão no alto da Serra das Figuras, entre os municípios de Caém, Jacobina, Mirangaba e Saúde, devotos, romeiros, esotéricos, curiosos e também arruaceiros, vândalos que há décadas ajudam a destruir o lugar aos pouquinhos. O estrago, porém, é grande. Hoje, o templo não tem teto, paredes, segurança nem mesmo cercamento, e os fiéis lutam para que o local seja minimamente preservado.

Ruínas da Igreja de São Miguel das Figuras, na Chapada Diamantina por Divulgação

Relatórios de órgãos como o Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac), há mais de dez anos, já atestavam a necessidade de proteção urgente da igreja, construída no início do século 18 após uma promessa do bandeirante Romão Gramacho, que circulava por Minas Gerais e Bahia atrás de riqueza.

A última missa foi celebrada em 1975 pelo padre Alfredo Haasler, um austríaco que chegou em Jacobina em 1938 e nunca mais saiu. O pároco subia a serra a pé ou montado, celebrava as missas e dormia dentro do templo, onde ficava por cerca de três dias. Reformou a igreja por duas vezes também.

Nas proximidades havia uma vila muito próspera, à beira do rio Itapicuru. Haasler levou para lá uma Escola Paroquial. Preocupado com o seu rebanho, era generoso e ao mesmo tempo rígido. Com o garimpo, começaram as brigas entre pessoas da comunidade, muitas delas bebiam além da conta, começou a prostituição, e o religioso deixou o local. Morreu em Jacobina em 1996, não sem antes retirar da igreja e guardar com ele as imagens de São Miguel das Figuras e do Senhor Morto.

A igreja sem padre passou a sofrer com o abandono e foi se deteriorando. Enfrentou ainda a queda de um raio e dois incêndios. Quem passava pelo alto da serra achou de pegar também pedaços do telhado, paredes, bancos e o que mais achasse pela frente. Reza a lenda que muitos corriam para lá atrás do ouro que teria sido escondido por Romão Gramacho para não pagar impostos.

Riscos

Em 2017, o Ministério Público da Bahia (MP) ingressou na Justiça com uma ação civil pública, requerendo segurança imediata e tombamento da igreja e do seu entorno. Passados oito anos, a medida ainda está pendente de julgamento.

Em julho último, uma equipe técnica do Núcleo de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural do MP (Nudephac) voltou ao lugar para uma inspeção. A titular da Promotoria Regional Ambiental de Jacobina, Gabriela Ferreira, adiantou ao CORREIO que há infiltrações, falta de muros, de segurança e até risco de desabamento.

Exatamente por conta disso é que, atualmente, as missas e festas realizadas para o santo ocorrem nas proximidades das ruínas, e não mais no local, embora ele continue sendo invadido.

“Queremos que a igreja, ruínas e entorno sejam tombados pelo valor histórico, cultural e paisagístico que possui. Acompanhamos para dar andamento prioritário à questão”, afirma a promotora.

Gado, paredão e videoclipes

À frente da Associação Estrelas da Vida de São Miguel das Figuras, criada em 2022, Evanice Lopes cobra do poder público o tombamento que engloba três questões: a preservação da serra como patrimônio arqueológico e natural – vem daí o nome ‘Figuras’, porque as formações rochosas se parecem com animais e objetos; a preservação das ruínas da igreja, pelo valor histórico e religioso; e também da Festa dos Arcanjos como patrimônio imaterial.

Eva relata que, se houver um acidente no local, será do tipo tragédia anunciada, pois não há controle de acesso e o vandalismo ocorre à solta. “Riscam paredes, sobem nas janelas, fazem paredão... O mato cresce, o gado invade. Os arcos estão danificados, e a igreja virou até cenário para videoclipes, sem nenhuma conexão com a fé ou com o sagrado”, reclama.

Um avanço, cita a presidente da Associação, foi ter mobilizado as quatro prefeituras do entorno e estabelecido um cronograma de limpeza do local, com atividades até dezembro. Mas o que falta mesmo é uma ação efetiva que impeça a total destruição de um bem histórico e a preservação do que resta.

Em nota, o Ipac informou que a Igreja de São Miguel das Figuras, e todo conjunto que compõe a estrutura do imóvel, foi tombada provisoriamente em setembro de 2024. “O plano de ação para o tombamento definitivo inclui a análise das documentações apresentadas, elaboração de estudo técnico e visita técnica para produção de parecer final”, diz a nota.

A promotora Gabriela Ferreira ressalta que o tombamento provisório não é suficiente, pois o local segue com os mesmos problemas relatados e sem proteção adequada. “Necessitamos do tombamento definitivo e da adoção de medidas de cuidado e preservação”, encerra.

Das quatro prefeituras procuradas por e-mail ou WhatsApp, duas enviaram respostas ao jornal. A Prefeitura de Jacobina disse que segue comprometida, em parceria com os outros três municípios e os órgãos competentes, para garantir a preservação e valorização do importante patrimônio histórico.

Ficou a cargo de Jacobina a limpeza neste mês de setembro. A nota da gestão também informa que já foram levantadas, junto ao Ministério Público, diversas demandas urgentes, como o escoramento das ruínas, a proibição de sons automotivos (paredões) e a restrição à presença de animais no local, entre outras providências.

A Prefeitura de Saúde afirmou que apoia todas as iniciativas voltadas à preservação e conservação dessa área, “reconhecendo o imenso valor cultural, histórico e espiritual que a Igreja de São Miguel das Figuras representa para toda a região”.

Entre as ações já realizadas a gestão destaca a limpeza do entorno da igreja, a instalação de recipientes para descarte de resíduos, o apoio logístico durante a tradicional festa religiosa e a participação no seminário realizado no município de Caém, em 24 de julho deste ano, cujo objetivo foi preservar a serra e as ruínas e resgatar o caráter religioso e espiritual da festa.