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Felipe Sena
Publicado em 8 de agosto de 2025 às 18:42
Entre palavras, poesias e lembranças, muitos são os significados que podem construir uma relação sólida e forte de amizade. Como diz os versos de “A Amizade”, do Grupo Fundo de Quintal, que Zeca Pagodinho e Arlindo Cruz, falecido nesta sexta-feira (8), fizeram parte, esse elo sinérgico é sobre “chorar o choro e sorrir o sorriso” do outro. >
Arlindo Cruz
Assim fez Zeca através de um vídeo publicado no Instagram na tarde desta sexta, dando um “valeu” pela existência, vida e força de quem brilhou, sofreu, mas agora descansa, segundo o cantor de samba.>
“Então, morre hoje meu compadre, meu parceiro e meu amigo Arlindo Cruz. Que Deus te receba de braços abertos, sofreu muito, agora precisa descansar um pouco, Vai com Deus compadre”, disse Zeca Pagodinho no vídeo.>
Na publicação do sambista, outros seguidores emitiram comentários de solidariedade a Zeca e se manifestaram sobre a morte de Arlindo. “Só quem atinge o entendimento de que aqui é uma passagem consegue se despedir serenamente de um amigo da vida”.>
“Maestro do bem”, ressaltou ainda o cantor Tiago Iorc. “Te amamos Zeca. Arlindo viverá para sempre no coração de cada amante do samba”, disse uma seguidora.>
Os sambistas que se conheceram no final da década de 1970, no berço do samba carioca, o Cacique de Ramos, fizeram parte do Fundo de Quintal ao lado outros grandes nomes do samba - Bira Presidente, Ubirany, Sereno, Sombrinha, Almir Guineto, Jorge Aragão e Neoci.>
Na época, Arlindo trabalhava na Caixa Econômica Federal, no Centro do Rio, e Zeca ia buscá-lo para seguirem juntos para os ensaios e festas do Cacique, como relatado pelo biógrafo de Arlindo, Marcos Salles. A relação dos dois ia além da música, Arlindo e Zeca se uniram em momentos de alegrias e dificuldade, o que reforçou o elo entre os dois ao longo dos anos.>
Natural do Rio de Janeiro, Arlindo começou a tocar cavaquinho ainda criança, influenciado pelo pai, Arlindão, que também era músico. Ganhou projeção nacional ao integrar o grupo Fundo de Quintal, ícone da renovação do samba nos anos 1980. Mais tarde, seguiu carreira solo e tornou-se autor de alguns dos sambas mais conhecidos do país, como ‘O Show Tem Que Continuar’, ‘Meu Lugar’, ‘O Que É o Amor’, ‘Candura’ e ‘Ainda É Tempo Pra Ser Feliz’.>
O cantor morreu nesta sexta oito anos depois de sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) hemorrágico que o afastou dos palcos. Arlindo Cruz sofreu o AVC que o deixou debilitado no dia 17 de março de 2017, quando se preparava para uma turnê. Passou um ano e três meses internado e, desde junho de 2018, vivia em casa, sob cuidados médicos e da família. Foi submetido a cinco cirurgias na cabeça e, nos primeiros anos, ainda apresentou alguns sinais de interação. Mas, segundo relato da esposa, Babi Cruz, sua condição neurológica se agravou nos últimos tempos.>
“Hoje ele está bem dentro do mundinho dele, do universo dele. Bem distante”, disse Babi, em depoimento publicado na biografia O Sambista Perfeito, lançada em julho de 2025 pela Editora Malê. No mesmo livro, ela contou que Arlindo deixou de responder a estímulos, já não interagia e se comunicava com dificuldade. “A pele dele está toda preservada, sem nenhuma escara, mas a parte neurológica está muito profunda. Dói demais vê-lo assim”, disse na época.>
A obra, escrita pelo produtor cultural Marcos Salles, reúne mais de 120 depoimentos de familiares e artistas como Maria Bethânia, Regina Casé, Zeca Pagodinho, Maria Rita e Marcelo D2. Ela também resgata episódios da infância do sambista, a passagem pela Escola Preparatória de Cadetes do Ar (Epcar), sua relação com o pai, que foi preso na ditadura, e a formação musical.>