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Larissa Almeida
Publicado em 18 de abril de 2025 às 06:30
Há mais de um ano vivendo de doações após perder apoio do governo estadual, o Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB) conseguiu aprovação na Política Nacional Aldir Blanc (PNAB) e vai receber, até o final de maio, R$ 241 mil para preservação de bens e apoio a inciativas culturais. O valor é 65% inferior a quantia de R$ 700 mil, que era recebida mensalmente pelo equipamento cultural, através do Edital de Apoio a Ações Continuadas de Instituições Culturais, antes do corte feito pela Secretaria de Cultura do Estado da Bahia (Secult-BA), em março do ano passado. >
A aprovação do IGHB na PNAB foi divulgada nesta quinta-feira (17) pelo secretário de Cultura Bruno Monteiro, que rebateu as acusações de retaliação política feita pelo presidente do instituto, Joaci Fonseca de Góes, em setembro de 2024. “O Instituto Geográfico e Histórico da Bahia participou do Programa de Ações Continuadas do Funceb por 15 anos, resultado de edital público feito que seleciona essas instituições. No ano de 2023, foi feito um novo edital, atualizado, adequado à legislação atual e o instituto ficou na condição de suplente, a partir de uma análise da comissão técnica”, apontou. >
“Esses instrumentos não são de escolha política, não são de decisão do secretário ou de quem quer que seja. A decisão é fruto de um edital público, com a seleção de uma comissão de especialistas. Não há nenhum tipo de resposta a ser dada a não ser essa: o instrumento, que apoiou de forma democrática o IGHB ao longo de todos esses anos, agora selecionou outras entidades, o que é do processo democrático”, ressaltou Bruno Monteiro. >
Em nota enviada no ano passado, a assessoria da Secult-BA havia informado que o secretário tinha “se empenhado em buscar alternativas em conjunto com representantes do IGHB”. Ao ser questionado se ambos haviam chegado a um acordo, Bruno afirmou que isso nunca foi discutido. >
“Falamos que estávamos apoiando o IGHB a buscar outras alternativas. Sempre nos colocamos à disposição e tivemos uma série de diálogos com quem nos procurou, porque não há uma perseguição. Nós reconhecemos a importância do IGHB, mas isso não significa que terá algum tipo de privilégio ou algum tipo de tratamento diferenciado no processo público”, pontuou. >
Joaci Fonseca de Góes, por sua vez, disse que o IGHB recebeu com gratidão a contemplação do Projeto "Ações de manutenção e conservação do IGHB", na Categoria Diógenes Rebouças, mas tem dúvidas sobre o que chama de ‘conveniência’ da decisão da Secult-BA, uma vez que não entende como compatível a utilização da aprovação na PNAB como argumento para rebater a acusação de retaliação política em outro edital. >
“Atualmente, existe a pendência de julgamento de um Mandado de Segurança, impetrado pelo IGHB, e um Processo Administrativo no Ministério Público, que avalia a improbidade administrativa da gestão [de Bruno Monteiro] na pasta. Se, por um lado, em condições normais de legalidade e de respeito ao princípio da impessoalidade, os dois certames são completamente distintos, por outro lado, a menção da classificação do IGHB como matéria de defesa da SECULT nos deixa a dúvida sobre a conveniência da decisão de agora”, disse Joaci. >
Para Joaci, a dúvida só será sanada com a harmonização das relações em prol da cultura da Bahia e com a retomada do repasse integral à entidade. Segundo ele, sua demanda junto à Secult-BA é respaldada pela lei estadual nº. 6.575, de 30/3/1994, que obriga o Estado da Bahia a financiar as atividades dessa instituição histórica. >
Ainda de acordo com o presidente do IGHB, o valor a ser recebido através da PNAB deve ser utilizado especificamente para restaurações de algumas telas e mobiliário do acervo, além da digitalização de documentos e fotografias do Arquivo Theodoro Sampaio e Revistas da Biblioteca Ruy Barbosa, que serão disponibilizadas eletronicamente ao público. Outras ações previstas são a catalogação do acervo e a instalação de películas nas janelas da instituição para a proteção do equipamento cultural. >
Diante das destinações previamente estabelecidas, Joaci frisa que o valor é insuficiente para o desenvolvimento de todas as ações culturais executadas pelo IGHB. “O valor do projeto atual não contempla a manutenção da entidade, nem o desenvolvimento de muitas das atividades culturais, realizadas pelo IGHB, como era possível antes, com o projeto de Fortalecimento das ações culturais do IGHB. Ela apenas garante uma diminuta conservação do acervo de valor histórico e cultural”, reiterou. >
As despesas básicas do IGHB são avaliadas em R$ 60 mil mensais, sem incluir intervenções emergenciais que, segundo o presidente, são necessárias para a manutenção predial E para a digitalização da memória registrada na hemeroteca, composta pela maior coleção de jornais da Bahia. >
Desde março de 2024, o IGBH tem mantido o funcionamento através do apoio recebido pela sociedade civil, através de campanhas de doação divulgadas na imprensa e nas redes sociais, além da colaboração dos associados. Com a contemplação pela Aldir Blanc, Joaci declarou que espera que haja um ‘restabelecimento da normalidade’. >
“Felizmente, agora, com esse novo resultado, do Projeto da Aldir Blanc, o Instituto Geográfico e Histórico da Bahia recebeu a nota final de 92,67 pontos, o que nos inspira ao restabelecimento da normalidade do relacionamento institucional, ao qual a instituição sempre esteve e sempre estará aberta, desde que preservando a sua independência e autonomia, como previsto no Estatuto da Casa da Bahia”, finalizou. >
Relembre o início do desentendimento >
Em setembro do ano passado, Joaci Fonseca de Góes, presidente do IGHB, denunciou o corte de R$ 700 mil feito pela Secult-BA em entrevista exclusiva ao CORREIO. Ele alegou ter sido vítima de retaliação política de Bruno Monteiro após dois episódios em que foi visto com representantes políticos rivais do PT. >
Joaci chegou a denunciar Bruno Monteiro por improbidade administrativa, citando um caso ocorrido em novembro de 2023, quando um evento sobre o Dia da Proclamação da República, promovido pelo IGHB, teve como um dos convidados Ernesto Araújo. O ex-ministro das Relações Exteriores do governo Jair Bolsonaro esteve envolvido em polêmicas e atua, hoje, como assessor da Fundação Dissenso, ligada ao partido espanhol de extrema-direita Vox. >
Na época, a Secult retirou o apoio do evento após a divulgação da participação de Ernesto Araújo. A pasta afirmou, na ocasião, que o "a Secult e o Governo do Estado da Bahia não pactuam com práticas de fake news e, portanto, não apoia eventos que promovem pessoas envolvidas com tais práticas". >
O corte de R$ 700 mil ocorreu em março de 2024. A pasta apontou como pior critério da instituição a “harmonia com a política estadual”. No dia 9 de setembro, o IGHB entrou com um mandado de segurança contra a medida. Já no documento enviado ao Ministério Público, o presidente do instituto solicitou a instauração de um inquérito civil público, intimação dos membros da Comissão de Seleção da Secult-BA, responsabilização de agentes públicos supostamente envolvidos, além da suspensão do corte de verba e a tutela de urgência. >
À época, a Secult-BA negou as acusações e se defendeu. “[Quando] o IGHB anunciou o ciclo de palestras comemorativas da Proclamação da República, no qual a abertura contou com a participação do ex-ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o Instituto possuía Termo de Fomento firmado com a SecultBa através do Edital do Programa de Apoio a Ações Continuadas de Instituições Culturais do ano 2016”, disse, em trecho da nota enviada ao CORREIO. >
“Na ocasião, a Secretaria informou ao Instituto que a referida ação não poderia ser considerada como parte do plano de trabalho em vigor e que não seria aceita no relatório de execução das atividades, devido ao teor que descumpriu o Termo vigente. Importante ressaltar, inclusive, que o Instituto em nenhum momento durante o apoio recebido via Fundo de Cultura foi penalizado, tampouco houve destrato por parte da SecultBa”, acrescentou. >
No final do documento, a Secul-BA disse que entendia a importância do IGHB para a sociedade baiana, porém também “se baseia no respeito à diversidade e pluralidade para a democratização do apoio à cultura baiana, prezando pela oportunidade de diversas organizações serem fortalecidas e potencializarem suas ações culturais. O secretário de Cultura Bruno Monteiro tem se empenhado em buscar alternativas em conjunto com representantes do IGHB", concluiu a pasta.>