Delegada diz que 'excesso de legítima defesa' levou à morte de homem no Corredor da Vitória

Os quatro indiciados, incluindo dois músicos afastados da Osba, vão responder por lesão corporal seguida de morte por espancar até a morte homem que tentou roubá-los

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Publicado em 5 de abril de 2024 às 12:45

Lincoln Sena, Laércio Souza Santos, Marcelo da Cunha Rodrigues Machado e Sérgio Ricardo Souza Menezes
Lincoln Sena, Laércio Souza Santos, Marcelo da Cunha Rodrigues Machado e Sérgio Ricardo Souza Menezes Crédito: Reprodução e Arisson marinho/CORREIO

Os quatro presos pelo linchamento de um homem no Corredor da Vitória, no último dia, foram indiciados por lesão corporal seguida de morte, informou nesta sexta-feira (5) a delegada Zaira Pimental, da 1ª Delegacia de Homicídios (DH). Willy Santos da Conceição foi espancado até a morte pelo flautista Lincoln Sena Pinheiro, o violista Laércio Souza dos Santos, ambos músicos agora afastados da Orquestra Sinfônica da Bahia (Osba), o designer Marcelo da Cunha Rodrigues Machado, namorado de Lincoln, além de Sérgio Ricardo Souza Menezes, morador da região.

As imagens comprovaram que Willy tentou assaltar Lincoln, Laércio e Marcelo, que saíam de uma lanchonete na região na madrugada do sábado, 23 de março. Sérgio Ricardo se juntou ao grupo depois, quando eles já agrediam Willy - a defesa alegou que ele tentava apartar a confusão, mas para a polícia ele também participou das agressões. Segundo a delegada, o indiciamento acontece porque a polícia entendeu que houve um "exagero" na legítima defesa dos envolvidos. A morte foi considerada culposa, quando não há intenção de matar. Seis sistemas de câmeras de segurança da região foram analisados durante a investigação.

"Trata-se de um crime pretedoloso que o objetivo foi ferir a integridade da vítima, porém num excesso houve o resultado morte de forma culposa. Nós chegamos a essa conclusão depois de analisar diversas horas de imagens, foram feitos vários depoimentos, os interrogatórios e chegamos a essa conclusão", diz a delegada.

A delegada diz que a quantidade de câmeras na região permitiu que a polícia conseguisse analisar todo o episódio, do início ao fim, e individualizar as condutas de cada envolvido. "Nós tivemos acesso a mais de seis circuitos de câmeras de segurança, então nós temos todo o fato, do começo, enquanto eles estavam ali no McDonald's, até o final da execução. Então nós conseguimos individualizar todas as condutas", diz.

"Então o mais importante é que a polícia preza pela técnica. Há uma segurança no inquérito policial em indiciar os quatro por lesão corporal seguida de morte, porque a gente conseguiu detalhar toda a execução. Foi feito um relatório de extração de imagens e esse relatório foi consignado à conduta de cada um deles, e é por isso que a gente indiciou os quatro por lesão corporal seguida de morte", detalha.

Ela afirma que Willy foi vítima, mas de fato tentou roubar os homens. "Dá para ver a conduta inclusive da vítima, entendeu? Neste contexto, o Willy, ele é uma vítima, porém, a gente não pode deixar de considerar que ele teve uma atuação ali. Ele tentou de fato roubar os quatro autores do delito. Ele chegou a puxar a corrente de um deles. Outro ponto que deve ser ressaltado: nesse inquieto, ele é vítima, porém, ele tem apontamentos criminais relevantes, inclusive de homicídio, roubo e outros apontamentos", acrescentou a delegada.

A Polícia Civil ainda aguarda alguns laudos, mas a causa da morte já foi definida como traumatismo craniano. Um dos envolvidos chamou o socorro, além de moradores que presenciaram a cena. "Na verdade, a gente não pode deixar de considerar que os envolvidos, eles ligaram para a polícia e ligaram para o Samu também. Então, é mais uma vez, a Polícia Civil tem a intenção de mostrar a verdade, entendeu? Como as coisas realmente se deram. A vítima, ela tentou roubar? Tentou sim roubar os envolvidos. Houve um excesso na legítima defesa? Houve, tanto que eles estão sendo indiciados por lesão corporal seguida de morte".

Willy foi morto com chutes, pontapés e socos. "Os quatro agiram com violência contra a vítima", afirma a delegada Zaira. O inquérito foi concluído nesta segunda e já foi encaminhado para a Justiça. Agora, cabe ao Ministério Público dar seguimento ao caso. A delegada explica que o MP pode ter um entendimento diferente da polícia e indiciar os envolvidos por outro crime. "Eles podem entender de outra forma, por exemplo, homicídio. Mas do ponto de vista da investigação, o crime foi capturado de maneira correta, foi lesão corporal seguida de morte".

Se condenados por lesão corporal seguida de morte, os quatro indiciados podem ficar presos de 4 a 12 anos, uma pena mais branda do que homicídio por dolo eventual, por exemplo, que poderia levá-los à prisão por 6 a 20 anos. 

Ao CORREIO, Florisvaldo Santos, irmão da vítima lamentou o caso e disse que espera pela justiça de Deus. "Sigo trabalhando, tenho dado meu melhor, mas minha mãe está muito abalada. Ele [Willys]  foi embora pelo fato que fizeram, mas é Deus que está no controle de tudo", afirmou. 

A reportagem solicitou posicionamento para o advogado da família e entrou em contato com os advogados de defesa dos investigados para saber se houve pedido de Habeas Corpus, mas nenhum se manifestou até a última atualização desta matéria. 

Relembre o caso

Willys Santos morreu após agressão no Corredor da Vitória
Willys Santos morreu após agressão no Corredor da Vitória Crédito: Reprodução

Quatro homens foram presos - entre eles, dois músicos da Orquestra Sinfônica da Bahia (Osba) - acusados de agredir um homem até a morte na madrugada deste sábado (23), no Corredor da Vitória, em Salvador. O caso é investigado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).

Estão presos: o flautista Lincoln Sena Pinheiro e o violista Laércio Souza dos Santos, ambos da Orquestra Sinfônica da Bahia; o designer Marcelo da Cunha Rodrigues Machado, namorado de Lincoln, além de Sérgio Ricardo Souza Menezes, que mora no bairro e passava pelo local no momento da agressão que resultou na morte de Willy.

O advogado Vinicius Dantas, que faz a defesa dos músicos e do designer, conta que Lincoln, Marcelo e Laércio foram abordados pelo homem, por volta das 4h, quando deixavam a McDonald's para ir até a casa de Lincoln. O homem simulava estar armado e teria arrancado o cordão de ouro de um deles e o agredido com um soco no rosto. Sérgio, que passava pelo local, teria se juntado ao trio para conter o assaltante. Segundo o advogado, Sérgio não conhecia os músicos.

De acordo com a Polícia Militar, o assalto deu início a uma briga na Avenida Sete de Setembro. Os policiais militares do 18º BPM foram acionados por testemunhas. Ao chegarem ao local, foram informados que quatro pessoas haviam espancado o homem.

Nas redes sociais, testemunhas do crime, que moram no Corredor da Vitória, relataram que pediram para que os homens parassem de agredir a vítima.

Vídeo

A reportagem teve acesso a imagens gravadas durante confusão.No vídeo, é possível ver o violista Laércio Souza dos Santos segurando as pernas do homem e Marcelo da Cunha Rodrigues, namorado do flautista Lincoln Sena Pinheiro, prendendo os braços.

Tanto Lincoln como Sérgio Ricardo Souza Menezes, morador da região que também foi preso por participar da briga, aparecem em pé ao redor dos três. A defesa dos músicos e de Marcelo alega que os três foram vítimas de uma tentativa de assalto, foram agredidos pelo homem e revidaram em legítima defesa. Já a defesa de Sérgio, alega que ele apenas tentou apartar a briga, sem participar de nenhuma agressão.

Apesar disso, os quatro suspeitos, presos em flagrante ainda no sábado, tiveram a prisão preventiva decretada, nesta segunda-feira (25). Vinícius Dantas, que representa os músicos e Marcelo, afirmou que vai recorrer. "A defesa entende que essa decisão não foi justa e por isso vai recorrer dessa decisão", disse.

Ainda de acordo com o advogado, seus clientes foram vítimas de um assalto e reagiram imobilizando o assaltante. "Eles ligaram para a polícia e esperaram a polícia chegar. Quando a polícia chegou que mandou eles soltarem, o rapaz ainda estava com vida e faleceu logo após. E aí eles foram conduzidos sobre a prática do crime de homicídio", completou.

Músicos suspensos

A Orquestra Sinfônica da Bahia (Osba) anunciou a suspensão dos dois músicos da orquestra acusados de espancar até a morte um homem no Corredor da Vitória na madrugada do último sábado (23). 

Em nota, a Associação Amigos do Teatro Castro Alves (ATCA), gestora da Osba, lamentou a morte do morador de rua e explicou a situação contratual dos dois músicos envolvidos na morte. “Os músicos em questão são contratados pelo regime celetista, que é regulado pela legislação trabalhista brasileira, sendo assim, enquanto os músicos estiverem presos preventivamente, eles terão seus contratos com a ATCA/Osba suspensos”, diz o pronunciamento.

“Neste momento, entendemos que é necessário aguardar o desdobramento das investigações pelas autoridades competentes, respeitando o direito à ampla defesa e o devido processo legal. Pedimos a compreensão do nosso público e da sociedade baiana para que aguardemos o avanço das investigações”, completou.