'Modus operandi': entenda por que o CV cobra pedágio de comerciantes

Facção já adota a prática no Engenho Velho da Federação, Vasco da Gama e em Cosme de Farias

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  • Wendel de Novais

Publicado em 7 de março de 2024 às 05:00

Posto foi alvo de assaltos ordenados pelo CV Crédito: Ana Lucia Albuquerque/CORREIO

Para os comerciantes de Salvador que estão em bairros onde o Comando Vermelho (CV) atua, além de luz, energia, matéria-prima e funcionários, há mais uma conta na lista de despesas: a da tranquilidade. Paga aos traficantes, a taxa garante que o negócio não será alvo de assaltos constantes, como aconteceu por três dias seguidos com um posto de gasolina na Avenida Cardeal da Silva, na Federação. A ‘política de intimidação’ é uma das diretrizes da organização criminosa, mas não está presente em outras. A reportagem ouviu especialistas que explicam por que a facção originada no Rio de Janeiro atua assim.

Antônio Jorge Melo, coronel reformado da Polícia Militar da Bahia (PM-BA) e especialista em segurança pública, explica que a facção tem por característica não se restringir ao tráfico de drogas. “Dentro do modus operandi do Comando Vermelho está essa condição de não só realizar o narcotráfico, mas também ter outras atividades como forma de garantir recursos financeiros. Uma delas é essa cobrança de proteção”, fala o professor, que também é coordenador do curso de Direito da Estácio.

Ainda de acordo com Melo, a diretriz do CV, que já é de comum conhecimento no Rio, também funciona como uma garantia de que as áreas com atuação da facção estão dominadas pelo temor. “Eles utilizam porque essa cobrança, além do objetivo de oferecer lucros, serve também para impor pelo medo o domínio deles. Outras facções têm outras filosofias, preferem se concentrar apenas no negócio principal. Mas é como já acontece no Rio. Tem milícias cobrando por internet e gás”, completa o especialista.

O medo citado pelo professor se instaura, principalmente, com a forma que o grupo lida com comerciantes que se recusam a pagar a taxa imposta. Além dos roubos em sequência, o grupo chega a matar comerciantes ‘não pagantes’. Caso, por exemplo, de Gerson Leopoldino Andrade, de 69 anos, dono de uma revendedora de gás assassinado no ano passado por não pagar R$ 7 mil à facção.

Uma fonte da polícia explica que o CV, diferente de rivais, vê nos moradores e comerciantes mais uma forma de lucro. “Outras facções atuam com drogas e armas, sem direcionar ações para quem está no bairro. No CV, tudo é renda. O morador que paga pela internet e gás que é única do bairro porque eles cortaram os fios e a distribuição. O comerciante que vai pagar por uma suposta segurança do grupo. Tudo é mais lucro”, destaca.

As cobranças, além dos bairros de Cosme de Farias e Engenho Velho da Federação, estão na região da Vasco da Gama. Por lá, uma mulher foi detida no fim de fevereiro sob suspeita de extorquir comerciantes da região, segundo informação da Polícia Militar. Silvana Monteiro Silva estava com cerca de R$ 800 quando foi detida por equipes da 41ª Companhia Independente de Polícia Militar (CIPM). Ela foi solta posteriormente pela Polícia Civil. De acordo com informações, ela realizava cobranças em nome do CV.