Receba por email.
Cadastre-se e receba grátis as principais notícias do Correio.
Linha Fina Lorem ipsum dolor sit amet consectetur adipisicing elit. Dolorum ipsa voluptatum enim voluptatem dignissimos.
Paulo Leandro
Publicado em 18 de março de 2020 às 05:00
- Atualizado há um ano
Qual o valor maior para quem busca uma vida feliz e um convívio pacífico entre seus concidadãos? Deve a epimeleia, ou disciplina, o cuidado de si e do outro, arriscar-se em um duelo com a tyché: a sorte, o acaso, a fortuna?
Suspender as aulas, como fez a Universidade Federal da Bahia, graças à sensibilidade do Magnífico, ao escutar o clamor da comunidade, foi o belo exemplo imitado pelos reitores das nossas competições do nosso amado e fútil ball.
Expor ao risco a vida de todos não seria mesmo mais importante em relação aos contratos assinados, conteúdos programáticos, breves conhecimentos, riquezas não-compartilhadas pelas raposas, estas falsas amigas dos galinheiros.
Da mesma forma, usando a moderação e a prudência, não vale a pena superfaturar obras ou criar taxas extras e nomenclaturas ambíguas para serviços precariamente realizados em prédios de condomínios habitados por crédulos trabalhadores.
Para quem ainda teima, a realização de jogos, mesmo com portões fechados, reflete a necessidade de troca da pastilha de freio, em momento de pandemia, cuja ameaça inclui a toda a população: deixa de ser interesse particular e vira crime contra a humanidade.
A indigência mental de uma triste malta, incapaz de raciocinar com necessária sistemática e devido rigor, pode produzir tipos capazes de argumentar pela manutenção dos jogos em momento no qual toda a espécie está ameaçada.
A proliferação do Covid-19 tem potência para derrubar o homem do topo da cadeia alimentar, ao dizimar todo e qualquer bípede, cuja arrogância da racionalidade como talento superpredador, é benfazeja neste clássico tenso entre Eros e Tanathos.
Peitho, deusa da persuasão, usou seu feitiço para convencer os concentradores de poder, donos de clubes, supostos proprietários por efeito de patrimonialização; é preciso conter, ó Jah, o pecado de hybris ou desmesura: excesso de cobiça, fama e dinheiro.
O domínio de prazeres e desejos, o incentivo ao deleite da expressão artística e a função catártica do futebol são oportunidades de educação, mas por ora, não há evidências confiáveis para permitir à bola rolar.
A homossensibilidade nas celebrações de gol, entre os jogadores, em demonstrações de afeto banais, algumas mais intensas, além do contato físico das divididas, poderia levar ao terrível contágio.
A coragem de manter competições levaria jogadores e cronistas infectados a passar adiante o coronavírus, além de tornarem-se mártires de suas categorias, controladas por mercadores nem sempre apreciadores de valores morais.
Estamos todos dentro do livro A peste, do ex-goleiro argelino Albert Camus, craque em pensar e escrever. Mas não sabemos ainda a página certa para escapar de um inimigo invisível e de alta letalidade, antes do final infeliz.
A confiabilidade nas autoridades sanitárias e da medicina nos leva aos vestiários da maior decisão da história. Podemos sair dela campeões ou rebaixados para sempre, num só jogo sem volta.
Cancelar os jogos, e até deixar sem campeões este ano de 2020, pode ter sido nossa melhor escolha. Portões fechados não bastavam. A bola precisa entrar em quarentena até a vitória sobre o coronavírus. Depois, seguem o baba, as aulas e a alegria de viver!
Paulo Leandro é jornalista e professor Doutor em Cultura e Sociedade.