A lenda (e as lendas) da Noite de São Silvestre

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  • Kátia Borges

Publicado em 27 de dezembro de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Nos minutos que antecedem o fim do ano, inspirados pela perspectiva de recomeço, muitos correm animadamente rumo às festas e aos fogos de artifício. A pirotecnia chinesa para espantar os maus espíritos inclui muito barulho — e o suplício dos cachorros. Foram os portugueses que trouxeram a tradição dos festejos ao Brasil.

Em Portugal, a cada 31 de dezembro, comemora-se a Noite de São Silvestre. Há uma interessante metáfora nessa história. Reza a lenda cristã que Nossa Senhora teria chorado lágrimas que deram origem a Ilha da Madeira, conhecida como a “pérola do Atlântico”, e que, nesse momento, no céu, brilharam luzes de várias cores.

A partir dessa lenda, faz sentido a relação entre a passagem do ano, os fogos de artifício coloridos e a proximidade do mar para as festas. Mas onde entra São Silvestre nessa trama? Senta que tem mais história. Teria sido o santo a consolar a Virgem Maria, que estava triste pelo fim trágico de Atlântida, a ilha perdida.

Santa simbologia, Batman! Afinal, quantas ilhas afundamos em nossos oceanos. Temos que lidar com essas perdas para seguir adiante, dando origem a novas paisagens. A cada mil lágrimas nasce um milagre, escreve a poeta Alice Ruiz. Guardamos conosco as casas e as ruas da infância, os que amamos e submergiram.

São Silvestre batiza ainda a maratona que marca a virada. Mas, por que se corre tantos quilômetros? É que assim também o santo, numa cruzada contra o dragão que representa a maldade, teria descido 365 degraus para expulsá-lo do Fórum Romano. A corrida representa a batalha que se vence ao final dos 365 dias do ano.

É como se a vida zerasse, ainda que este seja apenas um artifício e nada zere. Para os matemáticos, o zero é um número complexo. Seu conceito não envolve exatamente a ausência de algo, mas um parâmetro de posicionamento lógico. O vazio seria, segundo D’Ambrósio, o não-Deus, espécie de koan filosófico.

Pensando bem, nem é de festas que estamos falando. Também não há relação com um antes intocado, zero contido nos números que inventamos para organizar o mundo, os dias já vividos, a recuperação do fôlego. Encontrar sentido no presente é somar o novo ano aos outros. No Atlântico que somos, alguma Atlântida.