A nova Cidade Baixa

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  • Waldeck Ornelas

Publicado em 6 de outubro de 2020 às 05:28

- Atualizado há um ano

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O fato de todos – soteropolitanos e visitantes – nos referirmos ao Pelourinho como genérico do centro tradicional da Cidade faz com que prevaleça a impressão de que o Centro Histórico restringe-se ao Largo do Pelourinho e seus arredores. Ledo engano, o Centro Histórico de Salvador estende-se, grosso modo, do Campo Grande à Lapinha e do Dique do Tororó ao mar, abrangendo vários bairros.

Faço este comentário para registrar o segundo estágio de recuperação do nosso Centro Histórico, implementado pela Prefeitura ao longo dos últimos anos, o que ainda não foi amplamente percebido, até porque grande parte de nossa população não costuma frequentá-lo, com o que só tem a perder.

Realmente, depois do primeiro estágio, realizado pelo governador ACM no início dos anos 1990, com foco no núcleo central da área reconhecida pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade, esta é a primeira vez – um quarto de Século depois! – que o Centro Histórico recebe atenção especial por parte do Poder Público. Refiro-me ao conjunto de ações realizadas no bairro do Comércio.

O marco de referência desse segundo estágio é, sem dúvida alguma, a Praça Cairu. Não somente ela foi redesenhada, transformando-se em uma grande esplanada destinada ao pedestre, como o seu entorno passa por profunda revitalização. Aí estão, ainda em obras, a recuperação da “casa dos azulejos” – futuro Centro Cultural Casa da Música – e a Casa da História de Salvador/Arquivo Público Municipal; o próprio Mercado Modelo será também objeto de reforma; o IPHAN recuperou os imóveis ao lado da Conceição da Praia; e a Cia. Docas, em compensação ambiental, a Igreja do Corpo Santo. Pena que não pôde ainda ser reconstruído o Monumento à Cidade, perdido em um incêndio, um imperativo para fazer jus à memória do seu autor, nosso grande escultor modernista Mário Cravo Junior. Assim como faltam saveiros na Rampa do Mercado...

Também as praças Deodoro e da Inglaterra passaram por requalificação, assim como o eixo da rua Miguel Calmon / Av. Jiquitaia, com o monumento a Riachuelo, agora uma “rua completa”, a primeira na Cidade.

Importante equipamento, o HUB Salvador coloca a cidade na rota da inovação, e será acompanhado pelo DOCA 1, um centro dedicado à economia criativa. A própria prefeitura se transferiu em boa medida para o Comércio, valendo-se do retrofit de edifícios que se encontravam ociosos ou subutilizados, constituindo verdadeiro centro administrativo. O bairro, que já era um polo de ensino superior, deverá também receber um projeto habitacional nos velhos casarões ao sopé da encosta da Cidade Alta, onde já estão sendo recuperados os arcos da Ladeira da Conceição e as muralhas do frontispício. Coroará este processo a reativação do Elevador do Taboão – desativado a mais de meio século! – fazendo o link entre o Comércio e o Pelourinho propriamente dito. 

Embora não seja Centro Histórico stricto sensu, a península de Itapagipe constitui uma extensão natural do Comércio. Nesta área, outro conjunto de ações valorizaram o largo e a baixa do Bonfim, realçando ainda mais a imponência da Colina Sagrada; ali próximo, a Ponta de Humaitá e a Orla da Boa Viagem foram recuperadas. Mas o ponto alto é, sem dúvida, o Caminho da Fé, integrando os Santuários do Bonfim e de Santa Dulce dos Pobres, criando a infraestrutura necessária para o turismo religioso.

Tendo tido participação ativa no primeiro estágio da recuperação, regozijo-me ao testemunhar esse novo momento. Os empresários que se evadiram e os proprietários que abandonaram os seus próprios bens, ao conhecerem a nova Cidade Baixa certamente retornarão. E a população local precisa aprender a fazer turismo em sua própria terra – usufruindo do que os turistas vêm de longe para reverenciar – hoje uma imposição da própria pandemia.

Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional e ex-secretário do Planejamento, Ciência e Tecnologia da Bahia.