A Perini da Barra vai deixar saudades: clientes são surpreendidos com fechamento

Rede Cencosud, proprietária desde 2010, confirmou o fechamento da unidade nesta segunda (7) por tempo indeterminado

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  • Carolina Cerqueira

Publicado em 9 de junho de 2021 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Arisson Marinho/CORREIO

Fim de tarde é hora de comprar pão e aproveitar para levar também algum lanche gostoso para casa. Para os moradores da Barra e dos arredores, a primeira unidade da rede Perini era referência e passar por lá já fazia parte da rotina. Mas na terça-feira (8), quem foi até a Rua Miguel Burnier com a intenção de fazer compras na Perini deu de cara com tapumes cobrindo as portas do estabelecimento e avisos indicando que o local está fechado por tempo indeterminado. De acordo com um funcionário, os tapumes foram colocados no final do expediente do último domingo (6) e, já na segunda (7), a loja não abriu. 

Durante o fim da tarde da terça, muitos clientes procuraram a loja de carro e a pé e ficaram surpresos ao descobrir que fechou. “Eu fui pega de surpresa, achei bem estranho. Eu passei aqui hoje, como já de costume, para comprar umas cervejas e uns pães e me deparei com os tapumes, foi um susto”, conta Cristine Leboucher, de 61 anos. 

Ela era cliente da Perini da Barra desde 1997, quando se mudou para o bairro e diz que a loja vai fazer muita falta. “A gente que é cliente há tantos anos cria uma relação de amizade e vizinhança com os funcionários, com a loja; não tive oportunidade de dizer um ‘tchau’. Tem o Erivaldo dos frios, o meu amigo da parte dos pães. Não vou poder nem me despedir deles”, diz Cristine.  

Segundo o funcionário da loja, até mesmo a categoria levou o susto. Entre 30 e 40 funcionários trabalhavam na unidade e 15 já foram demitidos. Proprietário da empresa desde 2010, o grupo Cencosud informou o fechamento e disse que parte dos funcionários foi transferida para as outras unidades da rede. A empresa não explicou o motivo do encerramento das atividades. 

A advogada Maria Célia Ferreira, de 64 anos, também era frequentadora assídua e diz que a rotina não vai ser mais a mesma. Ela foi uma das pessoas que foram até a Perini e tiveram que voltar para casa sem os produtos que queriam. “Eu vim comprar um vinho e uma linguiça toscana com queijo coalho que só tem aqui. Vou ter que voltar para casa passando vontade. Agora vou ter que buscar o mercado mais perto, mas não vai ser a mesma coisa, não vai ter a qualidade Perini”, pontua.  “Todo mundo que vem para o Shopping Barra acaba querendo passar aqui. Essa região é muito movimentada e, no fim do serviço, todo mundo quer passar para levar alguma coisa gostosa para casa. E é aquele lugar que você vem para comprar uma coisa e acaba levando outra, é uma tentação mesmo”, ressalta a advogada. E não só os produtos que vão fazer falta. Uma unanimidade entre os entrevistados é o bom atendimento. “Os funcionários são ótimos, muito atenciosos. Você pede uma coisa e eles vão fazer de tudo para conseguir, para te atender bem, te ajudam a carregar as coisas. É um lugar que eu venho sempre e acabei conhecendo todo mundo. Vai fazer muita falta”, finaliza Maria Célia.

A aposentada Lúcia Cohin, de 70 anos, era frequentadora da Perini da Barra desde o final dos anos 1970. “Na época, ela era única na região, não tinha outro estabelecimento do tipo. Era lá que a gente encontrava bebidas boas, vinhos de qualidade. Frios, por exemplo, eu só comprava na Perini, a minha vida inteira foi assim. Os legumes, os pães, os enlatados e as massas também eu comprava lá”, relembra.  

Laços criados

Lúcia se diz muito triste com a notícia e afirma que o fechamento é uma grande perda para o bairro. “Foi algo que ninguém esperava, ninguém estava comentando. Eu estive lá neste final de semana e, quando voltei na segunda, estava com as portas fechadas. Fiquei bem triste e todo mundo que eu converso está muito sentido porque a Barra tem carência de um estabelecimento que atende assim como delicatessen. Além de tudo, os moradores criaram uma relação muito forte com o lugar, aquilo fazia parte da Barra”, lamenta. 

A conexão com a Perini não fica restrita a quem já passou da meia idade. A unidade fez parte da infância da estudante Dominique Galvão, de 27 anos, e também vai fazer muita falta para ela.“Eu moro na Barra desde criança e sempre frequentei aquela Perini. De fato, fez parte da minha infância. Era um lugar que estava na minha rotina e também nas ocasiões especiais, de comemoração. Não tinha uma semana que eu não passasse lá e, nos aniversários, era lá que a gente ia comprar os lanchinhos”, conta. Para Dominique, as duas coisas que mais vão fazer falta são a coxinha e o morango coberto. “Eu sempre comprava uma torta, alguns queijos. Mas o vício mesmo era a famosa coxinha e o morango coberto. A coxinha, inclusive, marcava presença em todo Carnaval. Era na Perini que eu ia forrar o estômago para encarar o circuito. E o morango coberto é meu ponto fraco. Não importa o que acontecesse, eu sempre estava lá comprando esse doce”, acrescenta. Doce morango coberto da Perini, o preferido de Dominique (Foto: Arquivo Pessoal) Cenário econômico

A notícia do encerramento das atividades da loja por tempo indeterminado foi confirmada na segunda (7). Em nota, a Cencosud afirmou que o fechamento foi uma decisão da companhia, mas não explicou a motivação. O ponto de encontro de carnavais e a referência de produtos importados ficará fechada por tempo indeterminado depois de 57 anos de história. 

Quando a unidade foi fundada, em 1964, pelos sócios Delmiro Carballo Alfaya e José Faro Rua, o Pepe, o nome ainda era outro: Panificadora Elétrica da Barra. A intenção já era criar uma padaria que atendesse seus clientes de forma especial, com produtos diferenciados. Depois de 57 anos, a Perini é uma espécie de grife baiana, onde se podia encontrar tudo no ramo de alimentos. Um verdadeiro “patrimônio” dos baianos. 

Em 1979, 15 anos depois da fundação, a Panificadora Elétrica expandiu os negócios e passou a se chamar Panificadora, Doceria e Sorveteria Perini e, a partir do ano seguinte, expande o negócio e dá início a outras unidades. Em 2010, o grupo chileno Cencosud assume a Perini, em um negócio de 27,7 milhões de dólares. Com donos internacionais, a Perini rompe as barreiras locais da empresa: Em 2012, a Perini inaugurou o 1º supermercado gourmet do Nordeste, com uma unidade no maior shopping de Recife, o Riomar, unidade que fechou no começo de 2021.

Mesmo sem uma explicação oficial, uma das hipóteses para o fechamento é o cenário econômico. De acordo com o economista Rafael Sales, da empresa de consultoria Arazul Research, apesar do crescimento do varejo, o segmento de hipermercados e supermercados apresentou uma queda de 1,6% na variação mensal.“Quando olhamos para a Bahia, a variação mensal apresentou queda maior que a nacional, de 8,4%, sendo o sexto mês consecutivo de variação mensal negativa”, pontua ele. Para o economista, as pessoas podem estar reduzindo a quantidade de produtos comprados, postergando compras e preferindo comprar seus itens básicos no comércio local, muitas vezes informal, evitando supermercados e hipermercados. ”As explicações para a queda no volume de vendas para hipermercados e supermercados perpassam pela preocupante situação dos desempregados, pela queda da massa salarial que não foi plenamente compensada pelo auxílio emergencial e a aceleração da inflação, que diminui silenciosamente o poder de compra das famílias”, explica Rafael.  

*Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro