Apelo e indagação de um fã: colé da BaianaSystem nesse Carnaval?

Senta que lá vem...

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  • Alexandre Lyrio

Publicado em 31 de janeiro de 2020 às 16:18

- Atualizado há um ano

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Foto: Evandro Veiga/Arquivo CORREIO Um toró da desgraça lavava a alma dos bêbados e dos loucos (ou as duas coisas juntas) que acompanhavam aquela babilônia de chuva, suor, cerveja e multibeats. Bateu a lembrança aqui de um dos primeiros Carnavais da BaianaSystem. Perto do fim do circuito Barra/Ondina, o vocalista Russo Passapusso adaptou a própria composição (Jah Jah Revolta) substituindo justamente o termo “babilônia” para criticar as estruturas que todo ano avançam dos hotéis sobre as nossas calçadas. 

“Se o camarote não cair, se o vento não soprar, se a terra não ruir...”, cantava Russo, encarando os olhares dos camaroteiros de abadá, perplexos ante aquela orgia de ijexá groovado e guitarra baiana. Meu coração carnavalesco tem bola de cristal, sim! No dia seguinte, comentei com dois amigos: “O Carnaval de Salvador agora vai se dividir entre duas eras: A.B.S e D.B.S. Antes e depois da BaianaSystem. Escrevam o que tô dizendo”.  

Um deles riu. O outro, chicleteiro e tricolor (o que dá quase no mesmo), disse que eu estava ficando louco. Bom, não sei se o Carnaval se dividiu entre os homens de neandertal da indústria da Axé Music e os futuristas da Baiana. Só sei que Robertinho, Russo e Cia tornaram-se símbolos da atual transformação da folia, que ano a ano retorna para as mãos do povo. Aliás, os camarotes (ainda) não caíram. As cordas, sim!  

Mas esse não é um texto para dizer que eu estava certo nessa história. Esse é um texto para saber o seguinte: colé da Baiana nesse Carnaval? Eu não quero saber se vocês ganharam o Grammy ou tocaram com alguma personalidade pop internacional. Se liguem, porra! Vocês conquistaram visibilidade no Carnaval - eu estava lá. Vocês são uma banda de Carnaval e isso não diminui vocês em nada! 

Ano passado fizeram só dois shows, um deles no Pelô. Fiquei de calundu, na moral. Qual é o problema? Dinheiro? Alô Neto! Alô Rui! O que tá faltando para viabilizar o Navio Pirata? Os caras fortalecem nossa maior festa. Cocem os bolsos! Passa no Visa! Não aceito dar mais grana para Anitta do que para eles que, junto com os afros e afoxés resistentes de sempre, fazem nosso Carnaval respirar. Já soube que estão fora do Furdunço. É isso mesmo produção? Compartilhem esse apelo até chegar ao prefeito e ao governador! 

E vocês da Baiana? Tão pedindo quanto? 

Façam valer a guitarra baiana que herdaram. Ou vocês acham que esse soudsystemzinho segura essa bagaça?  Encarnem a alma carnavalesca! Chamem uns Gandhys para tocar “Água”. Que ijexá incrível! Chamem Elza Soares para cantar “eu não vou sucumbir” em cima do trio. Sei lá, bota o Saci Pererê pra pular nos braços da galera! Mistura o doce com o sal! Faz dueto com Gil no Expresso 2222! Toca com a Rumplezz! Convoca a Nação Zumbi!

Se nada disso for possível, sobe em uma fobica. Claro que vocês merecem um som incrível. Claro que vocês têm que pagar contas. Mas é Carnaval e tem que se reinventar. O Carnaval quem é que faz? O trio não precisa nem de motor! A gente empurra! Assim nasceu o trio elétrico. Se não  fosse o trio elétrico, vocês seriam o que? Não vou nem questionar os preços de ingressos dos  shows como muita gente tá fazendo. Botando essa pipoca no Carnaval já tô satisfeito! 

Desculpem o romantismo, mas o país tá derretendo! A gente não tem nem Ministério da Cultura. Tem que fazer de algum jeito! 

A profecia de Tiago Banha até viralizou nas redes sociais esse dias. O cara já tá visualizando o PAMBAMBAM da percussão, a PM invadindo enquanto a galera aplaude e os sapatos voando sob o mantra passapusseano de “é só amor!”.  Em vez de tocar na dura poesia concreta das esquinas de Sampa, venham pra avenida que revelou vocês! 

Venham pra avenida que revelou o Ilê Aiyê! 

Se inspirem na primeira saída do Ilê! Saíram com a cara, a coragem e o mundo negro inteiro. Black afro na veia! Azeite de dendê no black soul! Façam política negra de verdade como fez o Ilê em plena ditadura. Xinguem o presidente da república na frente da elite da Barra, mas acima de tudo pensem no folião de vocês. Um folião cada vez mais amplo, mais negro e periférico. O Carnaval quem é que faz? Façam Carnaval! 

Mas, na real, nem precisa acreditar na crítica.