Após pausa por causa da pandemia, ACM Neto fala sobre sucessão presidencial e estadual

Ex-prefeito e presidente do DEM fala sobre estratégia para romper polarização entre PT e Bolsonaro

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  • Jairo Costa Jr.

Publicado em 10 de abril de 2021 às 07:10

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Divulgação

Quando a segunda onda da pandemia avançou com ferocidade na capital, em meados de fevereiro, o ex-prefeito ACM Neto decidiu suspender a agenda política. Por respeito ao momento e às vítimas, disse, não cabia falar sobre o tema. Agora, com  sinais de estabilização das taxas de contágio e de recuo no quadro que apontava para o colapso na rede de saúde, o presidente nacional do DEM recolocou o assunto na ordem do dia. Especialmente, os preparativos para a sucessão no estado e a corrida presidencial de 2022, cujo processo de definição já tem calendário para começar: o segundo semestre deste ano, afirmou Neto na sexta-feira, em coletiva virtual com a imprensa baiana.

Nos minutos iniciais da entrevista, Neto se dedicou a avaliar a tendência do DEM na disputa pela Presidência. "Esse tema só será tratado no partido, de maneira mais aberta, a partir do segundo semestre. No entanto, há um sentimento em setores importantes do Democratas sobre a necessidade de construir um projeto que tire o país da polarização que estamos vivendo hoje", disse o ex-prefeito, ao criticar a redução do jogo eleitoral ao duelo entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e o ex-presidente Lula (PT). Para ele, é preciso mostrar que existem mais de dois caminhos possíveis.

Entre as possibilidades, está a candidatura própria. No caso, a do ex-ministro da Saúde e deputado Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS). "Ele se tornou uma referência no enfrentamento da pandemia. Foi um ministro absolutamente correto em sua atuação. Conseguia falar com as famílias e passar segurança às pessoas, porque sabia o que estava fazendo. Com certeza, se Mandetta tivesse continuado, o país não estaria vivendo uma situação tão caótica como a que vive hoje", elogiou, antes de deixar claro que se trata de hipótese ainda longe de virar realidade. Sobretudo, pela existência de articulações para unificar o campo que vai da centro-esquerda à centro-direita em torno de um nome. 

E nesse amplo espectro, ressaltou, há outros postulantes com musculatura. Com a cautela típica de quem teme atiçar um vespeiro ao se mover perto dele, Neto evita apontar nomes com mais ou menos chance. Perguntado se o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) teria vantagem na fila, adota a retórica da diplomacia: "É um pré-candidato que tem de ser respeitado. Tenho uma admiração muito grande pela vida pública de Ciro Gomes, pelo conhecimento que tem do Brasil, pela capacidade de gestão que já demonstrou como prefeito, governador, ministro e deputado. Considero ele um dos nomes importantes, mas dentro do DEM combinamos que não é hora de antecipar esse debate".

Ao acionar o modo de espera na definição da candidatura presidencial, o dedo do ex-prefeito é movido também pelo pragmatismo estratégico. Traduzindo, acha que o relógio eleitoral está em desacordo com o atual fuso-horário do país. "O brasileiro que está passando fome, sem comida na mesa, que perdeu seu emprego ou que não perdeu ainda, mas está como medo de perder, que está internado em um leito hospitalar ou que tem um familiar internado, que perdeu alguém muito próximo, não tá nem aí para política no momento.  Essa agenda não é vivida nas ruas por quem vai decidir o jogo. Lamento que o debate eleitoral tenha sido antecipado", explicou.

Disputa ao governo A cautela é novamente utilizada pelo democrata ao falar sobre sua presença na sucessão estadual. Em momento algum, afirma, se apresentou como pré-candidato. "Mas não escondo de ninguém o enorme desejo em ser candidato a governador. No momento certo, o partido vai decidir e apontar o caminho. Aos poucos vai se tornando cada vez mais natural a apresentação de uma candidatura minha", ponderou. Sobre a possível quebra de polarização com o senador Jaques Wagner pela entrada de um nome ligado ao bolsonarismo, Neto saca a expressão com a qual costuma responder a perguntas do tipo: adversário nunca se escolhe. "Tenho que cuidar do meu quintal", disparou.

Caso seja confirmado no páreo, Neto diz que quer estar preparado para fazer um debate aberto com os baianos e se concentrar em discutir o futuro. "Nossos principais adversários hoje representam o passado", declarou. Após a definição da candidatura, que deve ocorrer ainda no segundo semestre, o passo seguinte será reunir os partidos que hoje gravitam na oposição ao PT para construir um arco de alianças. Quem vai estar nele, ponderou, é difícil precisar. Quem transitou entre vitórias e derrotas, como ele, sabe bem que política navega ao sabor dos ventos e em correntes movidas por incertezas. O que o impede de estabelecer cronograma para a conclusão de todo o processo. 

Montagem do tabuleiro As conversas para montar o bloco partidário devem transcorrer, segundo ele entre o fim do ano e o início de 2022. Já a montagem da chapa majoritária, que inclui a vaga de vice e do Senado, vai demorar. Possivelmente, estima, a conclusão só ocorrerá a poucos meses da corrida eleitoral oficial. Entre as certezas de Neto, está a de que a disputa pelo governo será decidida na Bahia, sem influência da sucessão presidencial. Apesar de considerar Lula um player importante, o democrata acha que o poder do petista para definir as eleições baianas é página virada. "Em 2012, quebrei essa lógica ao vencer em Salvador, enfrentando Lula e a ex-presidente Dilma Rousseff. Não existe hoje nenhum nome com força política para decidir o resultado aqui", emendou.

A partir de agora, Neto disse que está pronto para retomar as viagens ao interior, parte da estratégia de ampliar a visibilidade em regiões distantes da zona de influência da capital. No mesmo compasso, demonstra disposição para falar dos mais variados assuntos, como se pode ver no box ao lado, com trechos de destaque na coletiva, na qual ele deixa claro que está de volta ao jogo da política e cheio de vontade de mover suas peças no campo.  

Desabafos e polêmicas

Relação com João Roma "Tudo que tinha de falar sobre esse assunto, foi dito na nota encaminhada à imprensa quando ele foi indicado para ministro. Infelizmente, o ex-presidente da Câmara (Rodrigo Maia) aproveitou para fazer declarações falsas (de que a ida de Roma seria contrapartida pela liberação da bancada do DEM na eleição para o comando da Casa). Mas o tempo acabou mostrando a verdade. Não tenho mais nada a falar a respeito disso. Não vou tratar publicamente de questões pessoais caras para mim".

Frustração com o voto em Bolsonaro “Sabe aquela história de  engenheiro de obra pronta? É fácil ser. Analisar as coisas no contexto de hoje é diferente de analisar em 2018. Naquele momento, tinha duas opções: Bolsonaro, que representava expectativa de mudança, ou o PT. Preferi apostar na mudança, em algo diferente. Era a alternativa que tinha. Todos sabem que, em 2018, fiquei quase sozinho na Bahia votando em Geraldo Alckmin (PSDB). Mas segundo turno é exclusão. O que você rejeita mais, você vota no outro.  PT representava o que se vive hoje. A parte econômica é efeito da política de irresponsabilidade da ex-presidente Dilma. Hoje, me sinto frustrado na expectativa”.

CPI da Covid-19 no Senado   "Desejo que a CPI apure e investigue as coisas que precisam ser respondidas. É importante que ela contribua para ampliar a rede de assistência às pessoas que mais necessitam e ajude o país a se preparar melhor para crises como a que estamos vivendo atualmente. Será muito ruim para o Brasil se essa CPI se transformar em um circo, em um debate antecipado sobre 2022”.  Prefeitura e governo na pandemia

Prefeitura e governo do estado continuam acertando nesse processo, como acho que acertamos quando fui prefeito. Eles se anteciparam às medidas mais duras em relação a outras capitais para evitar o colapso. O mais dramático não aconteceu por aqui, a exemplo de pessoas morrendo sem atendimento ou por falta de oxigênio, por conta dessas decisões. Salvador foi uma das primeiras que conseguiu retomar parte das atividades, mais um resultado importante da ação conjunta e da antecipação de medidas, muitas delas criticadas, mas necessárias e acertadas”. Perdas na educação na crise sanitária

“Muita gente nem sabe quem é o ministro da Educação, porque a pasta, que deveria estar articulando ações nacionais para minimizar os impactos da pandemia em um setor tão prioritário, demonstra não ter compromisso com toda uma geração. Esse cenário vai fazer uma diferença gigantesca na vida de nossas crianças e jovens. Agravando, inclusive, a desigualdade social no país”.