Autoconhecimento e angústia em tempos de crise

Linha Fina Lorem ipsum dolor sit amet consectetur adipisicing elit. Dolorum ipsa voluptatum enim voluptatem dignissimos.

  • D
  • Da Redação

Publicado em 6 de abril de 2020 às 12:22

- Atualizado há um ano

. Crédito: .

Estamos vivenciando tempos difíceis, em nível mundial. A crise do coronavírus tem escancarado uma série de outras crises que estávamos passando, mas que não conseguíamos enxergar ou enfrentar. Não estou falando apenas de crises em  escala macrossocial, como as da política e da economia, mas sobretudo as das relações nos espaços microssociais, aquelas em relação aos nossos familiares e círculo de amigos, relações profissionais e em relação consigo mesmo.

O isolamento social tem produzido uma carga de estresse nas pessoas com intensidade maior do que elas podem suportar. Isso as leva a contrapor-se às medidas de segurança básicas e defendidas por órgãos oficiais como a Organização Mundial da Saúde (OMS)s, simplesmente ignorando o perigo real que estamos passando.

Em suma, é a emoção gerenciando nossas ações. São as nossas angústias ditando as regras de como devemos agir. E assim, procuramos argumentos e discursos que aliviem nossa culpa por não seguirmos certas recomendações: é a razão como serva da emoção! O fato é este: não sabemos viver angustiados! Não nos ensinam a lidar com a angústia na escola ou na nossa própria casa. E uma pandemia desse porte tem manifestado nossa fraqueza maior: não nos conhecemos!

Por isso, é importante buscar cada vez mais praticar os ensinamentos de Sócrates, não o ex-jogador do Corinthians, mas o filósofo grego: conhece-te a ti mesmo! Quanto mais nos empenharmos em conhecer a nós mesmos, mais fácil será lidar com as angústias que vivenciamos em nosso tempo. Começaremos a analisar criticamente os discursos e tentativas de argumentos que nos levam ao caos. Ou seja, conseguiremos mais plenamente suportar a angústia de nossa própria companhia.

Mas, para isso, é preciso estar disposto a se enfrentar. Se conhecer não é fácil, pois é preciso reconhecer as imperfeições, traumas, dores e angústias. Todavia, não se olhar no espelho é uma forma de não enxergar as potencialidades e criatividades que o tornam único, especial. Quem não consegue se aventurar por esse caminho, do autoconhecimento, acaba jogando as coisas ruins junto com as coisas boas, o que torna a angústia insuportável.

Nós tememos aquilo que não conhecemos. Quando nos desconhecemos, passamos a temer esse enfrentamento. Como no filme da Pixar “Monstros S.A”, às vezes os maiores monstros só são terríveis por não o conhecermos de fato, pois quando passamos a conviver com esses monstros e conhecê-los, vamos encontrar apenas uma criança pura e singela que grita, se assusta, ri, abraça, se espanta, fica com raiva e, ao mesmo tempo, demonstra carinho. Às vezes, tudo isso ao mesmo tempo. A “Boo”, apelido da criancinha do filme, assusta os monstros apenas porque eles não a conhecem. Às vezes, só nos angustiamos e não suportamos um período de confinamento e isolamento social porque desconhecemos quem nós somos. Se pararmos para olhar com mais atenção, vamos ver uma criança interior adorável que só quer ser feliz. Essa felicidade reside em uma única coisa: ser quem tu és! Não é possível ser feliz de outro jeito.

O que eu quero dizer é que não há outro caminho para superarmos os momentos de crise. É preciso tirar proveito desse isolamento social para promover um verdadeiro encontro consigo mesmo. Portanto, tire alguns momentos para refletir sobre sua vida pessoal, profissional, social, cultural, ideológica, política, moral. Se meditar o ajuda nisso, faça uso de tal técnica. Assista séries, filmes, ouça músicas, converse nas redes sociais. Mas não deixe de se enfrentar. Não perca essa oportunidade. Curta suas dores, aprenda a conviver consigo mesmo, com os seus medos e alegrias. Aceite-se como é. Torna-te aquilo que és!

E se a crise, que é real, lhe causar angústia, dor e sofrimento, faça como Agostinho de Hipona que, em seus momentos de agonia, encontrou repouso em uma ideia que lhe servia de referência para suas ações: “faça tudo como se tudo dependesse de você, mas depois, confie como se tudo dependesse de Deus”.

Essa ideia agostiniana pode nos ajudar a passar bem esses momentos de pandemia e terror, pois nos leva a fazer tudo o que está em nosso alcance para podermos prevenir males maiores, mas há um ponto na vida em que não conseguimos avançar porque simplesmente não depende de nós. Para não sucumbirmos diante da angústia, do medo e da impotência diante de tais monstros, confiar em algo maior que nós pode ser reconfortante. Tão reconfortante como aprender a conhecer a si mesmo!

Antonio Djalma Braga Junior é filósofo e historiador. Doutor pela UFPR. Professor, palestrante, escritor, consultor e coordenador do curso de licenciatura em História da Universidade Positivo.

Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade dos autores