Baianos ‘invadem’ praça São Pedro na véspera da canonização

Políticos, incluindo ACM Neto e Hamilton Mourão, foram a ópera dedicada à santa

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  • Alexandre Lyrio

Publicado em 12 de outubro de 2019 às 16:15

- Atualizado há um ano

Teve Ba x Vi (camisas do Bahia e do Vitória por todos os lados) e teve também sotaque baiano: "Irmã Dulce era uma mulher retada, pai!", disse o aposentado Antônio Carlos dos Santos, 67 anos. Na véspera da canonização, a Praça de São Pedro, coração do Vaticano, foi invadida pela Bahia. De moradores do Subúrbio Ferroviário ao Itaigara, de frequentadores do Barradão à Fonte Nova, Irmã Dulce estava bem representada pelos seus conterrâneos que se destacaram entre as cerca de 50 mil pessoas que transitaram ontem pelo local com bandeiras da Bahia, do Brasil e camisas da freira baiana que vai virar santa neste domingo (13). Antônio Carlos dos Santos (Fotos: Alexandre Lyrio) Próximo à saída da praça, o grupo em que seu Antônio estava parecia uma reunião de torcedores antes de entrar no estádio. "Irmã Duuuuuuuulceeeee. Irmã Duuuuuuuulceeeee". Feliz em dobro, Antônio comemorava o fato de estar bem de saúde. Horas antes de nos encontrar, achou que iria morrer antes de ver Dulce oficialmente santa. 

"Rapaz, eu passei mal no ônibus. Deu ambulância. O ônibus parou o trânsito. Achei que ia morrer, mas foi só uma pressão baixa", agradeceu seu Antônio, com uma bandeira do Brasil com o escudo do Vitória. "Juntou o fato de o Vitória ter ganhado com a canonização. Muita emoção", disse o devoto, que conheceu Dulce de perto. 

"Dona Dulce merece! Eu conheci, andava na minha área. Via ela sempre rodando o Largo do Papagaio e a Cidade Baixa pedindo doações para os necessitados". O grupo em que estavam Antônio, as duas filhas, a esposa e uma amiga misturava gente de Periperi e Lauro de Freitas e Cajazeiras. O CORREIO está no Vaticano desde quinta-feira (10) e em nenhum dia ouviu tanto ‘baianês’ como ontem.“Eu até queria comer um feijão, mas aqui é só pizza e macarrão. Por Irmã Dulce, foi ficar sem comer farinha até terça, quando vou voltar para Salvador”, brincou o aposentado baiano Valter Novaes, 76 anos, que viajou pela primeira vez de avião na vida essa semana para vi à Itália. A administradora Maria de Oliveira, 29 anos, saiu do bairro de Brotas, em Salvador, para o Vaticano para ver de perto a canonização,  Evangélica desde pequena, ela destaca que sua participação no evento católico de tomar santa uma pessoa tem como plano de fundo a gratidão.  "Quando minha mãe ficou doente, ela rodou vários hospitais mas só no Hospital Santo Antônio, das Obras de Irmã Dulce que ela recebeu o acolhimento de verdade. Minha mãe já morreu, mas tenho essa gratidão eterna por Irmã Dulce", diz Maria ressaltando ainda que recebeu críticas por ser evangélica e ter vindo para o ato católico. "Irmã Dulce está acima de qualquer religião”. 

Voluntária nas Obras Sociais Irmã Dulce, Sheila Veber era uma das mais animadas. Com um grupo grande desfilou pelas calçadas de pedra com a bandeira com a foto de Dulce. A qualquer momento eles danavam a cantar hinos para a santa. “É impossível achar uma só palavra para definir Irmã Dulce, mas ela é um norte na minha vida”. 

Moradores do bairro do Chame-Chame, em Salvador, a analista de sistemas Nara Martins veio com seus pais para Roma. Os aposentados Antonio Luiz e Virgínia Martins eram só alegria por poder celebrar o aniversário de Antônio junto com a canonização de Dulce.“É uma emoção grande na pele de quem está aqui e dizer que eu conheci uma santa. Com todo respeito aos outros santos, ela se destaca muito”, sentencia o aniversariante do mês.‘Ela era um exemplo de desapego”, completa a filha, Nara. 

A família Martinez - Olga, Ana, Taily e Silvana - é da Bahia mas vive atualmente em Barcelona, na Espanha. Quando souberam da canonização da freira baiana não pensaram duas vezes. “Decidimos participar desse momento histórico e de tanto orgulho para nossa Bahia. Eu e minha irmã (Silvana) conhecemos Irmã Dulce e nossa mãe (Olga) já viu ela e também Madre Tereza, que também é santa”, disse Ana, enrolada na bandeira do Bahia. 

Arte de baiano  Flores do campo amarelas e roxas colocadas sobre a grama verde. Diante da imagem de Jesus Cristo e dos cinco beatos que virarão santos no domingo (13), inclusive Irmã Dulce, artistas ensaiaram na manhã deste sábado (12), no Vaticano, as apresentações artísticas que farão na cerimônia de canonização da freira baiana. 

Os baianos Margareth Menezes e José Maurício - o homem que era cego e voltou a ver após rezar para Dulce - receberam as últimas orientações da apresentação que farão na Praça de São Pedro ao lado do cearense Waldonys e do carioca padre Antônio Maria. Waldonys e Margareth Menezes "É um momento especial e sagrado. Estou recebendo um presente de Deus. Fico feliz que o exemplo de Irmã Dulce de fraternidade possa atingir as pessoas para construir um um mundo melhor" , afirma Margareth, que nasceu na Cidade Baixa e admira a história de Dulce.

O cearense Waldonys destaca que Dulce representa o amor na sua vida. "Ela representa o amor na sua essência. Estou honrado de fazer parte desse momento", destaca o cantor. 

Juntos, eles vão cantar por dez minutos na janela da Basílica de São Pedro abaixo da foto de Irmã Dulce. "Vamos cantar por dez minutos começando às 8h no horário de Roma (3h da manhã). Vamos cantar Doce Kuz, Asa Branca e Romaria, se der tempo. O padre Antônio Maria cantará uma música especial que ele fez para Dulce", explica Waldonys.

Miraculado, nome dado a pessoa que foi o objeto do milagre, o maestro baiano José Maurício orgulha-se de fazer parte das atividades musicais que irão compor a cerimônia. "Me sinto honrado de poder cantar para ela em agradecimento ao que ela fez por mim". 

Com os olhos marejados, o padre Antônio Maria chegou na praça de São Pedro, no Vaticano, na manhã deste sábado (12). Devoto de Irmã Dulce, o padre conheceu a freira e está no Vaticano para a celebração da canonização. Ele cantará também na missa que acontecerá na segunda-feira (14) na Basílica de Sant'Andrea Della Valle.

'Ela é uma santa do mundo todo. A canonização tem o efeito de mostrar para o mundo inteiro aquela pessoa que viveu o cristianismo plenamente. O Brasil que é conhecido como terra do futebol e do Carnaval agora é conhecido como a terra de uma santa que deu sua vida pelos pobres e menos favorecidos. Ela dizia que a maior felicidade era fazer o outro feliz", comenta o padre. 

Além de Irmã Dulce, serão canonizados os seguintes beatos: John Henry Newman, cardeal, fundador do Oratório de São Filipe Néri na Inglaterra; Giuseppina Vannini (no século Giuditta Adelaide Agata), fundadora das Filhas de São Camilo; Maria Teresa Chiramel Mankidiyan, fundadora da Congregação das Irmãs da Sagrada Família e Margherita Bays, Virgem, da Ordem Terceira de São Francisco de Assis.

O coral em homenagem a Bays emocionou quem estava na praça de São Pedro neste sábado. "Ela era uma mulher de coração enorme", disse a suíça Austin Lhath, devota de Dulce.

Além dos artistas, nesta manhã, representantes de cada novo santo se reuniram também com oficiais do Vaticano para serem informados dos últimos detalhes da cerimônia. "É um evento grandioso e que ficará na história", sintetiza Dom Murilo Krieger, arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil. Ele participou da reunião ao lado de Maria Rita Lopes Pontes, sobrinha de Dulce, Ana Maria, irmã, Sandro Barral, médico da Osid e  Angelo Calmon de Sá, presidente do conselho de administração das Osid.

"Todo mundo já sabia que Irmã Dulce era santa. Agora é um reconhecimento do Vaticano de algo que nós já sabíamos", destaca o banqueiro que ajudou Dulce desde os anos 1950.

Ópera para convidados  Distante 3km da praça da São Pedro, foi colocado um outro toque de dendê, mas misturado com tempero italiano e espanhol. Foi a ópera Ave Dulce, que foi apresentada na Embaixada do Brasil na Itália A ópera Irmã Dulce levou quase dez anos para ser composta pelo Maestro e Compositor baiano Roberto Laborda .O espetáculo foi restrito para convidados incluindo o vice-presidente do Brasil Hamilton Mourão, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, da Câmara de Deputados, Rodrigo Maia, além do prefeito ACM Neto. 

 A ópera está dividida em dois atos e gira em torno da luta de Irmã Dulce para fundar as famosas Obras Sociais. A obra narra toda a trajetória de Dulce dos Pobres: desde a peregrinação pelos locais da cidade, em busca de abrigo para os doentes pobres à instalação deles em um galinheiro do Convento do Santo Antônio – local que pode ser visitado até hoje, já que foi transformado em um Memorial."Eu conheci a história de Dulce há dez anos e resolvi escrever essa ópera que conta a história dela e também uma história de amor fictícia", disse Laborda que nasceu em Salvador. Na equipe da ópera ele tem músicos da Espanha e da Itália. 

*Jorge Gauthier é chefe de reportagem do CORREIO e Alexandre Lyrio é repórter especial do CORREIO. Eles estão em Roma para fazer a cobertura da canonização de Irmã Dulce

*O projeto Pelos Olhos de Dulce tem o oferecimento do Jornal CORREIO e patrocínio do Hapvida.