Bateu na trave: por duas vezes o Vitória esteve perto da glória

Terceiro capítulo da série dos 120 anos do clube conta sobre quando o time ficou perto de ser campeão do Brasil

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  • Vinicius Nascimento

Publicado em 15 de maio de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arisson Marinho/Arquivo CORREIO
Barradão em chamas: show pirotécnico da torcida rubro-negro amedrontou adversários em 2010 por Márcio Costa e Silva/Arquivo CORREIO*

Enquanto o resto do Brasil roía as unhas para saber se o Supremo Tribunal Federal (STF) iria confirmar a decisão tomada pelo Senado de cassar os direitos políticos do ex-presidente Fernando Collor por oito anos, a torcida do Vitória tinha outra preocupação: uma final de Campeonato Brasileiro pela primeira vez em seus 94 anos de história.

Contudo, quando chegou à decisão contra um Palmeiras que era a sensação do país naquele momento, o Vitória não resistiu. Perdeu na Fonte Nova e, dias à frente, também no Morumbi, no jogo que consagrou o Palmeiras da Parmalat e de Edmundo, Evair e Roberto Carlos como campeão brasileiro de 1993.

Aquela não foi a primeira vez que o Vitória chegou perto de um título nacional. Quis o destino que uma nova equipe do rubro-negro chegasse a uma final, na Copa do Brasil de 2010, e novamente contra um time que encantava o território brasileiro: o Santos de Neymar, Robinho e Ganso. Dessa vez o Vitória foi mais duro na queda e venceu no Barradão por 2x1, de virada. Mas a derrota por 2x0 no primeiro jogo, na Vila Belmiro, obrigou o Leão a se contentar com outra bola na trave.

É sobre esse tema que a segunda matéria deste especial sobre o aniversário de 120 anos do Vitória vai tratar.  Brinquedo Assassino  Quem diria que um time composto por garotos recém-promovidos ao futebol profissional chegaria à final do Brasileirão? E mais, deixando pelo caminho Corinthians, Santos e Flamengo?

Pois o time formado por Dida, Rodrigo, Vampeta, Paulo Isidoro e Alex Alves conseguiu. A molecada deixou gente grande pelo caminho jogando com ousadia tamanha que rendeu o apelido de Brinquedo Assassino: uma traquinagem tão vistosa quanto fatal.

O Vitória de 1993 tinha subido para a divisão principal naquela temporada, após o vice-campeonato na Série B de 1992. Só isso já seria suficiente para enaltecer o feito de chegar à final, mas não é tudo. Adversário da final, o Palmeiras, que tinha a Parmalat como parceira em um modelo de negócio pioneiro no país, pagava ao atacante Edmundo o salário de US$ 30 mil - valor correspondente à toda a folha de pagamento daquele Vitória.

A trajetória do Leão começou em uma primeira fase na qual enfrentou apenas rivais  do Norte e Nordeste. Por ser oriundo da Série B, o primeiro lugar no grupo se credenciava a disputar a repescagem contra o Paraná, campeão da segundona contra o próprio rubro-negro no ano anterior.

A repescagem teve um gosto de revanche, conforme garante o próprio Paulo Isidoro, um dos destaques do elenco. Por ter campanha melhor, o Vitória jogava por dois empates para alcançar o quadrangular semifinal. E foi o que aconteceu: 1x1 no Paraná e 0x0 na Fonte Nova. Destaque do Vitória aos 19 anos, Paulo Isidoro autografa caderno de um fã no aeroporto (Foto: Marcelo Tinoco/Arquivo CORREIO) Nas semifinais, a chave do Leão no quadrangular tinha Corinthians, Santos e Flamengo em jogos de ida e volta. Quem ganhasse o grupo se classificava para a final.

A grande pedra no sapato do Vitória foi o Corinthians, que acabou eliminado com uma única derrota em todo o campeonato - justamente contra o Vitória, por 2x1. O primeiro gol foi marcado por Claudinho aos 44 da primeira etapa. Já no segundo tempo, Alex Alves marcou um dos gols mais bonitos da velha Fonte quando arrancou do campo de defesa e driblou seis corintianos antes de chutar na saída de Ronaldo. O Corinthians ainda descontou no final.

Dali em diante o Vitória empatou dois jogos contra o Santos antes de fazer a partida definitiva, mais uma vez contra o Corinthians. O empate era bom negócio para o Leão, que abriu 2x0 no Morumbi, mas sofreu o empate e não levou a virada graças à partidaça feita por Dida. Bastava mais um empate contra o Flamengo e o Vitória chegaria a uma final inédita.“A partida mais difícil pra mim, sem dúvida, foi aquela com o Corinthians. Quando terminou, a gente pensou: ‘Dá para ser campeão brasileiro’. Se a gente aguentou aquela pressão, diante de um Morumbi lotado, contra aquele time, dava para ser campeão”, afirma Isidoro.O empate contra o Flamengo (1x1) no Maracanã veio e o Vitória chegou à decisão contra o Palmeiras. Alex Alves tinha 18 anos quando encantou o Brasil jogando pelo Vitória. Na foto, atacante comemora gol contra o Paysandu pela primeira fase do Brasileirão de 1993 (Foto: Antenor Pereira/Arquivo CORREIO) Era 12 de dezembro, e a Fonte Nova ficou abarrotada com 77.772 torcedores. Aquele era o maior público do Brasileiro até o momento, uma atmosfera pronta para testemunhar o milagre.

Só que dentro de campo aconteceu o que era previsto. O Vitória ainda teve um pênalti negado e Pichetti, um dos astros do time, levou cartão amarelo por simulação, o que tirou o atacante do jogo definitivo. Para piorar, um baiano foi decisivo: Edílson, o Capetinha, que precisou finalizar duas vezes para vencer Dida e o jogo.

Na volta, o Palmeiras foi ainda mais imponente e superou o Vitória em tudo que podia, inclusive no público de 88.644 pagantes nas arquibancadas do Morumbi. Em campo, o time paulista resolveu a parada em menos de 25 minutos graças aos gols de Evair, logo aos 4, e Edmundo aos 24 do primeiro tempo.

Vários garotos daquela campanha foram negociados depois. Entre eles, o goleiro Dida, que saiu para o Cruzeiro. Além da quantia em dinheiro, a Raposa mandou um jogador que se tornaria ídolo do clube e retornaria em 2010 para o outro capítulo desta história: Ramon Menezes.

Barradão em chamas Tricampeão baiano, vindo de duas boas campanhas na Série A e capitaneado por Ramon, já consagrado por títulos brasileiros, idolatria no Vasco e passagens pela Seleção. Foram 10 jogos até a final daquela Copa do Brasil e, dos cinco que o Vitória disputou fora de casa, ganhou apenas um, contra o Náutico, 1x0 nos Aflitos, pela segunda fase.

Dentro de casa a história era outra. Foram cinco jogos e cinco triunfos, quatro deles por goleada (ver tabela ao lado), e o Vitória chegou à segunda final nacional em sua história. Mais uma vez contra um paulista, mais uma vez contra a equipe sensação do país: o Santos de Neymar, Robinho e Ganso.

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Um grande intervalo separou as semifinais e a final daquela Copa do Brasil: a decisão aconteceu após a pausa para a Copa do Mundo e, nesse intervalo, o Leão foi tetracampeão do Nordeste.

Para Ramon, a pausa foi prejudicial para o Vitória, que não conseguiu se planejar melhor para a decisão. “Perdemos alguns fundamentos físicos com os dias de folga. Teve uma relaxada. Poderia ter um planejamento melhor para aquela final”, avalia o atual auxiliar técnico do Vasco. Robinho e Zé Love carregam a taça da Copa do Brasil em pleno Barradão (Foto: Andrea Farias/Arquivo CORREIO) Presidente do clube na época, Alexi Portela Júnior confessa que não esperava tanto sucesso na competição, mas que o time tinha um conjunto afinado e jogadores que queriam se projetar no cenário nacional. E isso foi de suma importância para o êxito."Gostava de jogar primeiro em casa porque era certeza o Vitória ganhar. O Barradão se transformou em um inferno para os adversários", declarou o ex-presidente.Mesmo derrotado contra o Santos, o Vitória caiu de pé. Na primeira partida, o 2x0 na Vila Belmiro forçava o time baiano a reverter no Barradão, onde o Vitória sequer tinha levado gol e tinha feito 19 na campanha até então, uma média de 3,8 gols por jogo.

O Santos abriu o placar com Edu Dracena, e os gols de Wallace e Júnior no segundo tempo acenderam a chama de esperança, que para a tristeza dos mais de 32 mil rubro-negros não se transformou em catarse.