Beth Ponte: 'A mudança que o mundo precisa é cultural'

Curadora do Fórum Virada Sustentável fala sobre o desafio de olhar para os impactos sociais das mudanças climáticas

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  • Donaldson Gomes

Publicado em 16 de dezembro de 2021 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Florian Boccia

É preciso inspirar as pessoas para que elas promovam a virada que o mundo precisa dar em direção à sustentabilidade. Esta é uma das principais propostas da Virada Sustentável, festival que acontece até o próximo dia 19, com a proposta de levantar discussões sobre temas como justiça climática, racismo ambiental e ativismo juvenil. Para inserir a capital baiana no debate atual, o Fórum Virada Sustentável Salvador terá como convidados quatro participantes que representaram o Brasil na COP26: a indígena baiana Alice Pataxó, a jovem embaixadora da ONU Amanda Costa, a ativista e influencer Ellen Monielle e o professor de história, fundador da Uneafro Brasil e representante da Coalizão Negra por Direitos, Douglas Belchior.

Nascida na aldeia Pataxó Craveiro, em Prado, no Sul da Bahia, Alice Pataxó discursou no COY16, versão jovem do COP26, em defesa dos territórios indígenas, chamando a atenção da paquistanesa Malala, mais jovem vencedora do Prêmio Nobel da Paz, que sugeriu que seus 2 milhões de seguidores no Instagram acompanhassem o trabalho da baiana sobre preservação da cultura do seu povo. Outro baiano também participará do fórum. Embaixador da WWF-Brasil, Kaique Brito, 16 anos, vai se juntar a Amanda Costa e Ellen Monielle no debate sobre juventude e ativismos climático. Os três jovens emprestam suas vozes para mostrar porque a mudança climática é assunto de interesse de todos e como a Geração Z pode contribuir com esse diálogo. Eles falam ainda sobre redes sociais, memes e veganismo acessível.

A relação entre a defesa do meio ambiente e a luta antirracista também será posta em pauta durante a mesa Justiça Climática e Racismo Ambiental, que terá a participação do professor de história Douglas Belchior e do coordenador do Observatório do Racismo Ambiental de Salvador, Raimundo Nascimento. Durante o bate-papo, eles vão mostrar como as desigualdades raciais e sociais fazem com que os impactos das mudanças climáticas sejam sentidos de forma diferente na sociedade, sendo mais uma vertente do racismo sistêmico.

Beth Ponte, curadora do Fórum Virada Sustentável, fala sobre o desafio de olhar para os impactos sociais que as mudanças climáticas já estão trazendo para o planeta. Ela reconhece o tamanho do desafio que está posto, mas lembra que a solução do problema deve partir da humanidade.

Quem é Beth Ponte é gestora cultural, pesquisadora e consultora pela Ponte Cultura & Desenvolvimento. É vice-presidente do Conselho de Administração da Associação Brasileira de Organizações Sociais da Cultura (ABRAOSC) e pesquisadora associada do Observatório de Economia Criativa da Bahia (OBEC-BA). De 2010 a 2018, foi Diretora Institucional do Programa Neojiba. Foi German Chancellor Fellow 2018/19 da Fundação Alexander von Humboldt, na Alemanha.  Beth Ponte é gestora cultural e curadora da Virada Sustentável (Foto: Florian Boccia/Divulgação) Como nasceu a ideia da Virada Sustentável? A Virada Sustentável é um festival que já tem 15 anos. É um evento que nasceu em São Paulo, mas que ao longo dos anos  vem sendo realizado em outras cidades e se consolidando como o maior festival ligado à sustentabilidade da América Latina. Aqui em Salvador ele já aconteceu em outras seis edições. O evento foi interrompido em 2020 por conta da pandemia e retorna agora em 2021.  Esta é a última edição do ano, mas depois de São Paulo (SP), Manaus (AM) e Porto Alegre (RS), que foram outras capitais que também recepcionaram a Virada.

Qual é o mote do Fórum? Nossa ideia é dialogar com o movimento que aconteceu em anos anteriores, com uma visão ampliada de sustentabilidade. Essa é uma marca registrada da Virada Sustentável, sempre pensando no assunto de uma maneira muito abrangente, passando por diferentes eixos. Mas um mote muito forte deste ano é fazer um debate mais focado na pauta mais premente, estratégica e da qual não se pode escapar, quando se trata de sustentabilidade, que é a questão das mudanças climáticas. Como curadora, essa foi a linha que eu busquei seguir. A ideia é conectar a cidade com essa pauta, que é urgente, emergente e está na esteira da COP26 (26ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, que foi realizada em outubro e dezembro deste ano). Entre os palestrantes do seminário, teremos quatro convidados que representaram o Brasil neste encontro, em Glasgow (Escócia). Teremos novas vozes falando sobre as mudanças climáticas. Vozes jovens, vozes periféricas. Afinal, essa não é uma questão para os cientistas, é algo que interessa a toda a sociedade.

Como Salvador está inserida nessas discussões sobre sustentabilidade? Salvador sediou a Semana do Clima em 2019. Desde este evento, houve a criação do plano de ação climática e também uma grande mobilização da sociedade civil, através do Fórum Clima Salvador, que inclusive é um dos parceiros da Virada e que estará participando de uma mesa sobre a elevação do nível do mar. É apenas uma das discussões que são tão importantes para uma cidade como Salvador.

Qual é o papel da cultura numa virada de chave em relação à sustentabilidade? A cultura é uma grande aliada, por isso uma ideia central no festival é a de que a mudança que o mundo precisa é uma mudança cultural. Precisamos de uma mudança na nossa forma de enxergar o mundo e de nos relacionarmos com ele. E a cultura, no seu sentido stricto, as artes e a economia criativa, precisam se entender como aliadas dessas mudanças. Pelo seu grande poder de comunicação, potencial de desrupção também. Eu trabalho como curadora do fórum, gestora cultural, mas antes disso tudo, sou uma cidadã, então foi este o enfoque que tentei trazer para as discussões. A ideia é mostrar porque as mudanças climáticas são um assunto que diz respeito a todos e qual é o papel da cultura, da gestão cultura e das artes neste debate.

Quando falamos das mudanças climáticas tratamos de algo que já afeta o presente, mas pode impactar o futuro de maneira dramática. Pensando nisso, como a Virada pretende tocar as novas gerações? Acho que justamente mostrando que essa não é mais uma questão para o futuro. A gente não está mais discutindo o que vai acontecer, as mudanças climáticas já estão acontecendo. Olha o que está acontecendo no Sul da Bahia. Essa alta incidência, cada vez maior, de desastres ambientais, queimadas, com todas as consequências que trazem, mostram que esse é um tema do presente. A Virada é uma oportunidade de discutir como isso vai refletir na sociedade, nas cidades, nas comunidades.  A pauta social precisa estar no centro das discussões sobre as mudanças climáticas e é um pouco isso que estamos tentando trazer para o debate. Quando você fala sobre o futuro e a juventude, temos uma mesa específica para este público, com três jovens ativistas da Geração Z. Teremos o Caique Brito, de 17 anos, a Amanda Costa e a Ellen Monielle, que são jovens ativistas de 20 poucos anos, relevantes nessa questão das mudanças climáticas. As meninas estiveram em Glasgow. Vamos falar também de mudanças climáticas e racismo ambiental, que é uma outra pauta incontornável. Enfim, não se pode falar na questão climática sem levar em conta o impacto social do problema, que já é uma realidade.

O festival conta com o apoio da iniciativa privada, que até por questão de sobrevivência do negócio volta cada vez mais os olhares para esta agenda. Este já é um tema maduro no meio empresarial? Sempre estaremos caminhando para onde temos que chegar, mas sem dúvidas que nos últimos anos a pauta da sustentabilidade vem se tornando cada vez mais central. É até uma consequência dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). As empresas abraçaram essa pauta sim. Esse movimento é crescente e muito benéfico. Um dos ODS é a formação de alianças, porque essa é uma tarefa muito grande para ser tocada apenas por governos ou pela sociedade civil, do mesmo modo que não pode ser tocada pela iniciativa privada. A Virada Sustentável é proposta pela sociedade e conta com o apoio de governos e empresas. Na minha visão, como cidadã, o desafio é tão urgente, global e estratégico quanto o desafio da pandemia, que estamos enfrentando. Esse cenário nos mostrou que desafios coletivos deste porte tem eu ser enfrentado por todos para ser superado. A médio e longo prazo, a pandemia não é o nosso principal desafio coletivo, são as mudanças climáticas, que afeta a todos. 

O mundo deve enfrentar as mudanças climáticas como está enfrentando a pandemia? Melhor, eu acho. A gente falhou demais enquanto coletividade, se tomarmos a pandemia como um ensaio. Temos muito o que crescer como coletividade para enfrentar desafios deste porte. Precisamos aprender a caminhar juntos na busca por soluções para os desafios das mudanças climáticas. A gente não pode se furtar de reconhecer a gravidade das questões. Chico Mendes, ambientalista assassinado em 1988, dizia que a ecologia sem luta de classes é jardinagem. Eu acho que mais de 30 anos depois este pensamento faz muito sentido. Falar de sustentabilidade sem falar de mudança climática, sem falar das questões sociais hoje em dia, é insuficiente para a gravidade do problema que estamos enfrentando. Temos que falar a verdade, mas temos que entender que a solução para o problema somos nós.  Por isso é preciso ter esperança, a solução não virá de outro lugar, depende de nós. A Virada Sustentável tem o aspecto positivo de tentar inspirar essa mudança, mas nunca negligenciando a situação. Quem acompanha as discussões sabe disso. É um assunto do presente, já está acontecendo, mas reverter isso depende da gente. Quem acompanha as discussões sabe disso. É um assunto do presente, já está acontecendo, mas reverter isso depende da gente.

Virada Sustentável

Sala do coro – Teatro Castro Alves Entrada gratuita Ingresso: retirar 1h antes do evento na bilheteria do TCA, mediante lotação do espaço Obrigatória apresentação de comprovante de vacinação contra coronavírus

Confira a programação:

16/12 (quinta-feira)

17h - Mesa Salvador das Águas: Fórum Clima Salvador na Virada Sustentável

Como Salvador pode ser impactada pela elevação do nível dos oceanos em consequência das mudanças climáticas?

José Landim (presencial)

Geólogo, Mestre em Geologia pela Universidade Federal da Bahia e Doutor em Geologia e Geofísica Marinha pela Universidade de Miami - RMAS - EUA.

Virgílio Machado (remota)

Coordenador do Fórum Clima Salvador e do Instituto Taoca. Ambientalista, colabora com a gestão de uma série de projetos socioambientais na Bahia.

Leticia Moura (remota)

Ambientalista e coordenadora do Fórum Clima Salvador. É mestre em engenharia industrial com foco em tecnologias limpas e processos ambientalmente amigáveis pela UFBA, tendo, atuado como pesquisadora no tema de conservação no uso da água na Rede de Tecnologias Limpas (Teclim) no Departamento de Engenharia Ambiental da UFBA (2008 a 2012).

18 h - Mesa Juventudes e ativismo climático

Amanda Costa e Ellen Monielle, que representaram o Brasil na COP26, em Glasgow, e o jovem influencer Kaique Brito falam como as redes sociais são importantes ferramentas para aproximar os jovens do debate sobre mudanças climáticas.

Amanda Costa (remota)

Ativista climática, jovem embaixadora da ONU, delegada do Brasil no G20 Youth Summit e em 2021 entrou para a lista #Under30 da revista Forbes. Entusiasta pela Agenda 2030, tem o objetivo de mobilizar jovens para construírem um mundo inclusivo, colaborativo e sustentável.

Ellen Monielle (remota)

Graduada em Relações internacionais pela Universidade Potiguar, graduanda em Gestão Ambiental pelo Instituto Federal da Paraíba e mestranda em Gestão Pública e Cooperação Internacional pela Universidade Federal da Paraíba. Desde cedo, focou seus estudos em pautas ecológicas, alimentares e amazônicas. É criadora de conteúdo digital no Instagram @eco.fada.

Kaique Brito (presencial)

Jovem influencer e embaixador da WWF-Brasil. Viralizou nas redes sociais com conteúdos humorados sobre racismo e questões ambientais.

19h20 - Show Zé Manoel

17/12 (sexta-feira)

17h - Mesa Justiça Climática e Racismo ambiental

Qual a relação entre a defesa do meio ambiente, o combate às mudanças climáticas e a luta antirracista?

Douglas Belchior (remota)

Professor de história, fundador da Uneafro Brasil, rede de cursos para jovens e adultos da periferia. Membro da Coalizão Negra por Direitos e coordenador de articulação de projetos do Fundo Brasil de direitos humanos.

Raimundo Nascimento (presencial)

Coordenador do Observatório do Racismo Ambiental de Salvador.

18h - Mesa de Encerramento - Direto à terra: Onde as lutas se encontram

Alice Pataxó

Ativista e comunicadora, baiana é fundadora do canal Nuhé no YouTube, jornalista do Projeto Colabora, colunista no Yahoo Brasil e bolsista do Malala Fund.

19h20 – Performance de Taina Cerqueira  e show de Nara Couto

18/12 (sábado)

18h – Shows de Hiran  e Rachel Reis

19/12 (domingo)

18h - Show Rumpilezinho - Homenagem a Letieres Leite

Palacete das Artes – programação infantil Entrada gratuita e livre mediante lotação do espaço Obrigatória apresentação de comprovante de vacinação contra coronavírus

18/12 (sábado)

14h30 - Contação de histórias Teatro Grio

15h10 - A sanfonástica Mulher Lona

16h30 - Balé do TCA

19/12 (domingo)

14h30 - Nariz de Cogumelo Clássicos

15h30 - Orquestra Sinfônica da Bahia (Camerata) -  Cine Concerto

16h30 - Balé do TCA

Ruas do Comércio

De 15 a 19 de dezembro (quarta a domingo)

Braskem recicla

Estação para disseminação de informações sobre Economia Circular e arrecadação de resíduos recicláveis. O visitante poderá participar de uma experiência sustentável com suporte de jogos interativos e exposição sobre o ciclo do plástico verde.

Intervenções urbanas

Eggcident – obra do artista holandês Henk Hofstra

Onde: praça do Mercado Modelo

Projeto Murais - Movimento Urbano de Arte Livre - os murais vão continuar nas fachadas dos prédios como legado da Virada

Trabalho da artista Sirc

Onde: Rua Miguel Calmon, 16, Comércio

Trabalho do artista TarcioV

Onde: fachada do Edifício Carlos Kiappe, na rua Miguel Calmon, Comércio

Trabalho da artista Isabela Seifarth

Onde: achada do Edifício Cidade Baixa, na rua Miguel Calmon, Comércio

Trabalho da artista Zana Nacola

Onde: Estacionamento Estapar, na Avenida da França, 414, Comércio