Boca do Barulho: Boca do Rio lidera ranking de bairros barulhentos de Salvador

Queixas de som em festas particulares respondem por 80% dos registros no bairro, segundo a Semop

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  • Victor Villarpando

Publicado em 31 de janeiro de 2017 às 05:00

- Atualizado há um ano

O paredão é o maior inimigo do silêncio em Salvador. Mas no bairro mais barulhento da cidade em 2016, a Boca do Rio, os carros com caixas de som imensas foram abafados pela velha e boa festa no apê. As queixas sobre som alto em casas e apartamentos no fim do ano foram tantas que ultrapassaram aquelas sobre carros e fizeram o bairro subir da terceira para a primeira colocação no ranking da zoada.“Foi uma surpresa dupla. Primeiro, porque,  em todos os outros bairros, o número de queixas sobre veículos é maior. Mas, desde novembro, as queixas sobre residências batem 80% na Boca do Rio. Segundo, porque Cajazeiras e Itapuã estavam na frente até novembro”, diz a subcoordenadora de fiscalização sonora da Secretaria Municipal de Ordem Pública (Semop), Márcia Cardim. 

De acordo com ela, isso acontece por causa do grande número de pessoas de férias no período e dos parentes do interior que vêm curtir o Verão na capital. A região foi apontada em 1.538 das 54.782 denúncias de poluição sonora recebidas pela Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur).

Em segundo lugar no ranking de 2016 ficou Itapuã, com 1.466 ocorrências, seguido de Cajazeiras (1.412), Pituba (1.197) e Pernambués (1.174). O bairro eternizado por Vinicius de Moraes e Dorival Caymmi é uma estrela do ranking de barulho. Desde 2010 não sai do top 3 e já foi cinco vezes campeão. O ranking foi publicado com exclusividade pela coluna Satélite, do CORREIO.

Numa caminhada pela Boca do Rio, deu para a equipe do CORREIO sentir nos tímpanos. Um anúncio de um buffet de festa infantil sai das caixas de um carro de som: “Temos decoração com preços abaixo do mercado, não perca!”, esbraveja o locutor.

Na Rua Abelardo Andrade de Carvalho, o trânsito congestiona e ouve-se uma buzina atrás da outra. Enquanto isso, a rádio comunitária toca sucessos sertanejos que ecoam em caixas  nos postes. Numa loja próxima, um aparelho de som toca “Fim de semana chegou, vai rolar a farra”. É tudo ao mesmo tempo. 

Entre as localidades menos calmas estão a Rua da Tranquilidade, o Bate-Facho, a Baixa Fria, a Água Suja e o Vale do São Francisco. “Há queixas durante a semana, mas no fim de semana o número dobra. E o horário de maior incidência é a partir das 19h”, conta Márcia.

Dia e noiteQuando a noite chega é a vez dos bares, onde é comum encontrar um veículo com o porta-malas aberto. Está aí a principal queixa dos moradores. Por lá, o carro do ovo é fichinha. “Eles colocam o som no carro super alto e ficam bebendo e dançando em volta, principalmente nas sextas e finais de semana”, conta uma moradora sem se identificar.

Ainda segundo ela, em datas comemorativas é ainda pior, mas também costuma acontecer em dias úteis. “É impossível ter sossego, estudar, ver TV”, conta ela.

Como mora numa rua comercial, a técnica de recursos humanos Débora Alcântara não enfrenta tanto problema com carros. “Mas já tive vontade de ligar para o órgão por causa de vizinho desrespeitoso”, conta ela, que tem um filho de 1  ano. “Infelizmente, não adianta pedir ou reclamar porque ele volta a fazer”.

A nutricionista Rosana Ribeiro Carneiro, 55, reclama que é mesmo muita ‘zuada’. “Geralmente, começa às sextas à noite. As pessoas colocam o som para todo mundo ouvir. Eles escutam axé, funk, essas coisas de ostentação com MCs, músicas com palavrão. Eu sou evangélica e gosto mais de música clássica. Eu fecho a casa toda e tenho que aumentar o volume da TV se eu quiser ouvir alguma coisa”, conta.Para alguns moradores, as tardes dos finais de semana não são sinônimo de descanso. Uma moradora da Rua Tenente Gustavo dos Santos, de 83 anos, relata que o barulho agrava seus problemas de saúde porque lhe causa estresse.

“Quando colocam música, é sempre nas alturas. Incomoda a todo mundo. Sou uma pessoa de idade, sofro de problemas de circulação, pressão e diabetes. Muitas vezes, tento dormir para aliviar e acordo com o barulho”, conta.

SaúdeA exposição a sons intensos, como  numa balada, pode provocar de alteração de humor a perda auditiva. “O primeiro sinal é o zumbido. Por si só, ele já costuma afetar o humor. Barulho tem esse poder e o estresse pode mexer com pressão, taxas de gordura e açúcar”, diz a otorrinolaringologista Clarice Saba, diretora técnica do Centro de Otorrinolaringologia da Bahia.

Agora imagine se a balada for na casa do vizinho? E se ao som alto se somarem barulhos de motor, buzina, discussões e autofalantes? Além do ouvido, o bolso sente. Segundo a médica, as despesas com medicamentos para lesão auditiva podem chegar a R$ 200 e o aparelho para tratar intolerância a sons custa  R$ 5 mil.*Colaborou Thiago Freire