Calor do bem: Verão pode ser um alívio para pacientes com asma

Segundo especialista, exposição ao ar livre dá uma trégua nos sintomas; tratamento contínuo é essencial para evitar complicações da doença 

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  • Da Redação

Publicado em 25 de janeiro de 2020 às 06:15

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Shutterstock

Imagine ter uma sensação de chiado e aperto no peito, tosse recorrente e falta de ar. Quem tem asma pode experienciar esses sintomas da doença crônica várias vezes ao longo da vida. Mas, nesse calorão todo característico no Verão, os asmáticos têm pelo menos uma boa notícia: na estação, os incômodos causados pela enfermidade podem dar uma trégua, indicam pneumologistas.

A explicação está no fato de que as crises estão ligadas tanto à predisposição à doença quanto aos fatores externos. São muitos os agentes capazes de inflamar os brônquios - os tubos que levam o ar até o pulmão - e desencadear uma crise de asma.

O professor Álvaro Cruz, que é pneumologista e alergologista, explica que a redução das crises e das internações pela doença no Verão tem relação com o fato de os pacientes ficarem mais ao ar livre.“As pessoas ficam mais ao ar livre e, dessa forma, longe de poeira e mofo (dois fatores externos que desencadeiam crises). Praticar atividades em ambientes abertos e sem aglomeração de pessoas também reduz o contato com um possível transmissor de vírus, o que desencadearia uma crise no paciente”, explica.Cruz aponta que a causa mais frequente das crises é infecção respiratória viral, como resfriado. “Vários estudos mostram que a frequência de atendimentos hospitalares por asma aumenta no inverno. Os casos começam a aumentar a partir de maio, o que também tem relação com o período escolar, pois as crianças já voltaram para a escola e têm contado com vírus”, afirma.

Calor do bem O calor também ajuda a controlar a doença, indica a pneumologista Tatiana Galvão,  diretora da Sociedade Baiana de Pneumologia. Isso acontece porque o frio, assim como outros fatores, pode inflamar os brônquios. 

A advogada Beatriz de Sousa, 25 anos, que tem asma leve, já percebeu os benefícios da estação mais quente do ano.“No inverno, eu tenho mais crises, que começam com uma alergia que tem relação com o frio. Nesses casos, a asma vem mais fácil porque a gente está mais debilitado”, comenta.Quem convive com a asma sabe que as doenças associadas, ou seja, as comorbidades, são capazes de descontrolar o quadro da enfermidade. Por conta disso, também é preciso tratá-las.

“Se tem excesso de peso, tem que reduzir o peso. Se tem rinite, tem que tratar a rinite. A apneia do sono, o refluxo, a sinusite e o tabagismo tendem a piorar o quadro do paciente asmático”, explica Tatiana Galvão.

Além disso, o paciente deve ter um compromisso com o tratamento da própria doença respiratória. Presidente do Grupo Brasileiro de Asma Grave (BraSa) e coordenador institucional de pesquisa do Hospital Moinhos do Vento, o pneumologista pediátrico Paulo Pitrez afirma que muitos asmáticos acabam se acostumando com os sintomas e deixam a intervenção terapêutica de lado.

“Um número muito grande de pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) não tem prescrições de tratamento para asma. Cerca de  60% a 70% dos pacientes não têm nenhuma prescrição. Já aqueles que têm prescrição, entre 50% e 80%, em média, não estão bem da doença. Mesmo com a prescrição, na maioria das vezes, o tratamento não é feito regularmente e o medicamento não é usado todos os dias”, explicou, em entrevista concedida no CBN Talk Show.

A Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia estima que 20 milhões de pessoas no Brasil tenham asma. Em 2019, foram registradas 9.525 internações pela doença na Bahia, segundo a Sesab.

Uma asma sem tratamento ou até mal tratada pode levar à morte do paciente - inclusive em casos não graves. A longo prazo, o paciente pode perder a capacidade pulmonar.

De acordo com Pitrez, ocorrem cinco de a sete óbitos devido à doença por dia no Brasil. Na Bahia, foram registradas 163 mortes em decorrência de complicações da enfermidade em 2019, segundo dados da Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab). Só em Salvador, foram 26 óbitos em 2019 e 586 internações de janeiro a novembro, segundo a Secretaria Municipal de Saúde (SMS).

A Bahia tem uma das maiores frequências de asma no Brasil, aponta Álvaro Cruz. De acordo com o professor, isso ocorre devido ao clima quente e úmido, favorável à proliferação de ácaros e mofo.

Tratamento A intervenção padrão para a doença envolve o uso de corticóide inalatório de utilização recorrente e um broncodilatador para relaxar o músculo dos brônquios e controlar as crises. Quem tem o caso grave precisa de ainda mais cuidados.

A presidente da Associação Brasileira de Asma Grave (Asbag), Raissa Cipriano, é mãe de Giovanna, que tem apenas seis anos e possui a forma mais complicada da doença. Para cuidar da filha, Raíssa tem que ter grande dedicação à menina, seja para explicar a importância do tratamento, seja na hora de correr para a escola da criança para dar o medicamento durante uma crise.

A presidente da Asbag conta que o maior desafio dos pais é aceitar que o filho possui o diagnóstico da doença crônica e vai precisar de muito tratamento. A partir dessa compreensão, é necessário ensinar as crianças sobre a enfermidade.“A criança precisa entender que tem que usar a medicação todos os dias e vai ter certas limitações. Como mãe, eu diria para ter bastante paciência, explicar aos poucos que o tratamento é importante para a melhora do filho.Também é preciso aderir ao tratamento sem medo”, indica.De olho nos gatilhos Em seu site, a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia indica fatores que podem desencadear uma crise asmática. Confira abaixo o que evitar para não piorar a inflamação dos brônquios e piorar os sintomas da doença.

ÁCAROS – organismos encontrados em locais com acúmulo de poeira como colchões, travesseiros, carpetes, bichos de pelúcia.

FUNGOS – aparecem com predominância no final do verão e no outono em casas escuras, úmidas e mal ventiladas. Os fungos têm com ambiente mais propício locais com temperatura acima de 37°C e umidade acima de 50%. Estes microrganismos misturam-se com a poeira dos carpetes, colchas, livros e refrigeradores e podem crescer no sistema de ar condicionado, paredes de banheiros e fendas de superfícies.

PÓLENS – existem com predominância fora de casa e são carregados pelo vento. A polinização é comum na primavera.

ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO –  a relação com a piora dos sintomas da asma depende do grau e da frequência da exposição. A descamação da pele do animal, a saliva, a urina e outros tipos de excretas também podem ser gatilhos da doença.

FEZES DE BARATA – a excreção do animal pode provocar o aumento inflamação dos brônquios e gerar  os sintomas da asma.

INFECÇÕES VIRAIS – a infecção por vírus pode piorar ou causar os sintomas da asma, a exemplo da gripe e do resfriado comum. Alguns asmáticos têm mais sensibilidade que outros.

FUMAÇA DE CIGARRO – mesmo se o doente não fumar, a fumaça do cigarro é prejudicial aos asmáticos. A fumaça do cigarro, além de aumentar os sintomas também pode aumentar a inflamação dos brônquios e piorar a gravidade da doença.

POLUIÇÃO AMBIENTAL – a exposição à poluição do ambiente também pode piorar a asma.

EXPOSIÇÃO AO AR FRIO – ar muito frio e seco pode desencadear sintomas de asma por irritar os brônquios do asmático.

Dicas dos especialistas Além dos medicamentos para tratar a doença, outras práticas podem beneficiar o asmático e ajudá-lo a ter mais qualidade de vida. Confira abaixo: Evitar situações de estresse Evitar exposição à fumaça Fazer exercícios regularmente e evitar sobrepeso Se vacinar contra gripe e pneumonia Ter uma alimentação saudável e o mais natural possível Evitar o consumo de bebidas alcoólicas Usar capa antiácaro no colchão e no travesseiro Passar um pano úmido no chão antes de varrer para não ter muito contato com a poeira Guardar as roupas em um local protegido de poeira *Com orientação do chefe de reportagem Jorge Gauthier