Desconectar do trabalho: direito e necessidade, especialmente nas férias e folgas

E-mail, whatsapp, redes sociais criaram uma portabilidade digital do trabalho. Aprenda a se organizar e a não sofrer no momento de se afastar

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  • Carmen Vasconcelos

Publicado em 14 de janeiro de 2019 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Arquivo Pessoal

Pequeno empresário na área da construção civil, Hilton Souza é  daquelas pessoas que já acordam abrindo os olhos junto com o celular para conferir a movimentação financeira da loja em Camaçari. “Nunca tiro férias, mas me permito alguns dias de descanso no mês de novembro, quando também consigo comemorar o aniversário em família”, diz. Ano passado, inclusive, as férias foram escolhidas com base onde não havia sinal de celular.  Na verdade, o avanço da tecnologia tem criado uma dificuldade para gestores e empregados: a desconexão.  “As preocupações com os destinos da empresa, da equipe  roubam muito a possibilidade de relaxar”, confessa Souza. A situação é tão importante que, embora não haja uma legislação específica sobre o tema, os especialistas em Direito Trabalhista afirmam que as situações são discutidas como direito à desconexão e que o único país no mundo que já tem normatização sobre a questão é a França.  Apesar do tema ser novo, vale salientar que mais que um direito, as férias, descanso e folgas são fundamentais para a saúde mental e física do indivíduo. O psicoterapeuta e coach de carreiras Victoriano Garrido lembra que, há pouco mais de duas décadas, o trabalho era exercido apenas no ambiente laboral, no entanto, a tecnologia trouxe a portabilidade digital do trabalho. “Essa conexão seria impossível no passado, no entanto, o que deveria trazer uma nova dinâmica e se revelar uma força tornou-se uma fraqueza com danos psicológicos e emocionais”, diz. O psicólogo e diretor técnico da Clínica Holiste Uellington Pereira compara essas pausas com o sono após um dia de atividades. “O descanso é fundamental para fazer uma refrigeração das emoções, oxigenar o cérebro para estabelecer novas metas e direcionamentos”, esclarece. Para o psicólogo, os que não conseguem parar precisam cuidar para que o comportamento não estabeleça um adoecimento e devem buscar ajuda. “Um líder que não consegue tirar férias precisa rever sua postura, trabalhar as inseguranças e aprender a delegar tarefas. O trabalho não pode ser visto como uma prisão”, explica.  Planejamento O presidente da secção baiana da Associação Brasileira de Recursos Humanos, Wladimir Martins, diz que as folgas da equipe e do líder são algo absolutamente necessário e como todas as atividades de uma organização precisam ser planejadas de modo que a saída de um colaborador não inviabilize o trabalho. “Essa é sim uma responsabilidade do gestor que precisa entender que, com organização, o trabalho flui e ele não precisará importunar ninguém e, consequentemente, não será responsabilizado por danos ao colaborador ou a equipe”, completa.  Advogada e coordenadora do Núcleo de Direito Trabalhista da Torres&Pires, Patrícia Carvalho reforça que as férias, descanso e folgas são medidas protetivas previstas na Constituição brasileira e dizem respeito à saúde e à higiene do trabalho. “O direito à desconexão é bastante discutido e, no Brasil, os casos costumam ser avaliados individualmente, sobretudo nos casos de funções de confiança ou gestão”, afirma. Patrícia Carvalho, no entanto, reconhece que nem toda interrupção das férias é considerada ilícita, sobretudo, quando o colaborador cria uma situação que força seu retorno. Para Martins, quando a relação de trabalho é boa, ajudar não se transforma num incômodo para ninguém. A auxiliar administrativa Eliana Correia diz que pede para ser acionada em caso de necessidade."Somos poucos e assim não pesa para ninguém", garante.