Desembargador pede nova vista e julgamento sobre anulação de júri de Kátia Vargas é remarcado

Sete desembargadores já votaram, sendo 4 contra e 3 a favor da anulação; nova sessão acontece em 2 de outubro

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  • Tailane Muniz

Publicado em 4 de setembro de 2019 às 13:05

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO

Sob o argumento de que as mortes dos irmãos Emanuel e Emanuelle Gomes Dias, após acidente de carro em 2013, figura "um processo muito complexo, com mais de 4 mil páginas”, o desembargador Nilson Castelo Branco pediu nesta quarta-feira (4) renovação de vistas do julgamento que vai decidir se anula ou não o júri da médica oftalmologista Kátia Vargas.

Realizada no Tribunal Pleno do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ-BA), no Centro Administrativo (CAB), a sessão julgaria a anulação do júri popular que, em 2017, absolveu a médica - acusada de perseguir e arremessar o próprio carro contra a motocicleta dos irmãos.

Nilson já havia solicitado o adiamento da análise do processo em 7 de agosto, ao justificar que, para ele, havia necessidade de um tempo maior, dada a “complexidade do conteúdo”. 

Nesta quarta, reforçou a manutenção do pedido. "Mantenho meu pedido de vistas e, impreterivelmente, garanto o meu voto na próxima oportunidade", afirmou o desembargador, que terá que decidir, pelo sim ou pelo não, no dia 2 de outubro, quando acontece nova sessão de análise do processo. A decisão pela remarcação do julgamento foi acompanhada pela mãe das vítimas, a enfermeira Marinúbia Gomes, que preferiu não falar com a imprensa. Kátia Vargas não participou da sessão. Marinúbia acompanhou a sessão (Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO) O primeiro julgamento havia terminado com um empate, sendo dois votos pela anulação do júri e dois favoráveis. Nesta segunda sessão, como outros dois desembargadores votaram pela manutenção da absolvição, e outro, pela anulação, o placar foi atualizado: quatro deles defendem a liberdade para Kátia, e três esperam que ela seja julgada novamente. 

Assistente de acusação, o advogado Daniel Keller explicou que, até aqui, os passos do processo, incluindo pedidos de vistas, "são normais" e que ainda tem "muita coisa para ser construída"."Para nós, para a família, não preocupa o fato desse pedido de mais tempo, é natural. Prefiro que ele peça vistas e julgue com mais cautela, do que se antecipe com o voto", pontua Keller.A sessão Embora seja formada por 20 desembargadores, a Seção Criminal do TJ-BA, contará, na prática, com 18 votos. Conforme a Corte baiana, dois desembargadores não participam do julgamento. Um, por se considerar "suspeito" - ou seja, não se considera totalmente imparcial, e o segundo, foi impedido porque já participou de um ato processual referente ao caso.

Relator do processo, o desembargador Lourival Almeida Trindade, decidiu pela manutenção do resultado do júri na sessão de agosto. Ele foi acompanhado pelo desembargador Mário Alberto Hirs, que já havia pronunciado seu posicionamento no julgamento da Segunda Turma da Câmara Criminal do TJ-BA, em agosto de 2018. Na mesma oportunidade, votaram pela anulação o revisor, desembargador Carlos Roberto Araújo, além da desembargadora Ivete Caldas. 

Nesta segunda sessão de análise do júri, votaram contra a anulação os desembargadores Abelardo Paulo da Mata Neto e Soraya Moradillo Pinto. Na contramão, o desembargador José Alfredo Cerqueira da Silva se manifestou a favor de que haja um novo júri. Os magistrados, no entanto, podem mudar o posicionamento os votos.

Confiante da anulação, Daniel Keller explicou, no entanto, que mesmo que o júri seja suspenso, cabe recursos das duas partes. "Confio na tese da acusação. Para mim, o júri é nulo porque a decisão é manifestamente contrária à prova dos autos. Ficou claro no voto de um dos desembargadores [José Alfredo] que nem a defesa sustenta a absolvição, então os jurados foram além do que a defesa pediu", destaca.

Ele afirmou, ainda, que "a tese da defesa é pelo homicídio culposo", ou seja, segundo Keller, os advogados de Kátia reconhecem a responsabilidade sobre as mortes, porém, se apegam ao álibi de que não houve a intenção. À defesa, em caso de decisão pela manutenção da sentença do júri, reforça Keller, cabe recurso junto ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

"Eu respeito a decisão do tribunal, respeito a decisão dos desembargadores. Nós da acusação, precisamos da maioria dos votos [10] para que o processo seja anulado. A defesa tem o privilégio do empate, então, se prevalecer um empate, a defesa ganha", esclarece, ao citar o princípio penal de que "na dúvida fica-se com a defesa".  Daniel Keller (Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO) Argumentos Ao justificar o voto contrário à anulação, o desembargador Abelardo fez um resumo do processo, desde a morte dos irmãos, incluindo a análise das perícias. “O laudo pericial elaborado pelo Coordenação de Computação Forense, do Departamento de Polícia Técnica (DPT), resultados obtidos não foram satisfatórios para concluir que o resíduo encontrado no veículo foi causado pelo capacete”, cita.

Em seguida, lê perícia particular assinada pelo perito Ricardo Molina, contratado pela defesa de Kátia Vargas: “O perito diz: 'A testemunha estava a cem metros do acidente, o relato de que viu o carro atingir a moto é impossível. Não há qualquer prova material que garanta que a moto teve qualquer contato com o carro"."Segundo o perito, a última imagem registrada com a câmera mostra a moto se afastando, mas a cerca de dez metros do carro, ainda longe. A teoria de que houve uma perseguição não se sustenta. A última imagem mostra a moto sendo ultrapassada, o que aconteceu adiante não foi filmado”, conclui, sobre as perícias.Aberlado também releu parte do depoimento de Katia Vargas: “Ela disse: 'Eu não saí de casa para causar acidente, bater, triscar ou arremessar o carro contra a moto'. A juíza pergunta: 'O condutor da moto arremessou a moto sobre o carro?', e a ré responde: Não. A juíza pergunta: 'A senhora acredita que foi a ultrapassagem que causou o desequilíbrio da moto?', e ela responde: 'Pode ter sido'".

Conforme o desembargador, o processo registra a afirmação de Kátia sobre a autoria de uma “imprudência”, mas que a acusada defende, contudo, que isso não quer dizer que teve “a intenção de matar”, o que pode explicar a tese da defesa, citada por Daniel Keller. Já Soraya Modadillo, que acompanhou Aberlado, não comentou o voto favorável à manutenção da absolvição.

Em defesa de novo júri, o desembargador José Alfredo Cerqueira se explicou. “A tese apelatória diz que a ré saiu em perseguição contra a motocicleta, o que fez com que os corpos das vítimas fossem arremessados contra um poste de iluminação pública”, pontua, ao citar apelo do Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA).

'Defesa frágil' Com poucos minutos do início da sessão, enquanto o desembargador Nilson Castelo Branco justificava a renovação de vistas, a mãe dos irmãos alternava entre o choro e gestos - de aparente desespero - direcionados ao advogado Daniel Keller. Ele, por sua vez, ouvia aos argumentos com atenção, com o olhar fixo para a bancada dos magistrados.

Mais uma vez, Marinúbia era amparada pelo marido Otto Malta, e pela irmã, Mércia Gomes. Pouco antes de ser formalmente encerrada a sessão, a enfermeira saiu da sala, em silêncio. Disse à reportagem que agradecia a presença da imprensa, mas que preferia se manter em silêncio.

Otto, no entato, se limitou a dizer que a "anulação é o justo". "A defesa da acusada é muito frágil. Todas as testemunhas atestam que ela atirou o carro nos dois. E a defesa se apega a detalhes pequenos, como distâncias específicas das testemunhas. Além do mais, o que ela estava fazendo a 100 km/h, em uma via em que o máximo permitido é 70 km/h", indaga.