Dois anos após sumiço de irmãs em Pedrão, polícia e MP-BA pedem para arquivar processo

Meninas seguem desaparecidas e crime até hoje não foi esclarecido

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  • Bruno Wendel

Publicado em 7 de junho de 2019 às 14:44

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

Falta de provas. Este é o motivo pelo qual a Polícia Civil e o Ministério Público Estadual (MP-BA) pediram o arquivamento do processo que apura o desaparecimento das crianças Sofia, que à época do desaparecimento tinha 1 ano e quatro meses, e Luna Morena, 5. As duas desapareceram na cidade de Pedrão, no Centro-Norte da Bahia, no dia 28 de abril de 2017.

As crianças são filhas de Robson Luiz Gomes Lima, 32, o Robin, apontado pela polícia como um dos gerentes da Katiara no bairro de Valéria. O corpo dele foi encontrado num matagal com marcas de tiros. Já os corpos da mãe das meninas, Juliana Conceição do Nascimento, 23, e do motorista Danilo Luiz Araújo Souza, 24, estavam dentro do veículo atingido pelos disparos. 

A maior angústia da família é saber se as crianças estavam ou não no carro, que seguia para Salvador. “Já são mais de dois anos nesse sofrimento”, lamentou o avô das meninas, Roberto Luiz do Rosário Lima, 62.   Avô tem esperança de encontrar as netas (Foto: Evandro Veiga/Arquivo CORREIO) O inquérito policial das investigações foi encaminhado ao MP-BA em outubro de 2017. “São vários laudos e tem algumas perícias inconclusivas. Em relação ao sangue, não deu para concluir se as crianças estavam dentro do carro, só aponta o sangue de três pessoas”, disse o delegado ao CORREIO, em matéria publicada no dia 28 de outubro do ano passado. 

De acordo com uma fonte da Vara da Criminal de Irará, no centro-norte baiano, onde o processo tramita, o delegado Henrique Morais encaminhou o inquérito ao MP-BA pedindo o arquivamento do caso, mesmo sem a definição da autoria e motivação do crime, e o paradeiro das crianças.

No início das investigações, a polícia suspeitou que o crime podia ter relacão com uma guerra entre duas das quatro facções criminosas que atuam na Bahia: Katiara e Bonde do Maluco (BDM). À frente das investigações, o delegado titular de Pedrão na época, Henrique Moraes, disse que no carro onde estavam Juliana e Danilo havia inscrições do BDM.

No dia 26 de abril de 2018, o MP-BA se manifestou a favor do arquivamento, “sendo assim, incerta a autoria definitiva”, encaminhado o processo para a Justiça – o parecer foi do promotor Anselmo Lima Pereira. 

Apesar disso, segundo o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ-BA), o processo não está arquivado. Em 18 de dezembro de 2018 foi dado vista ao MP-BA para se manifestar. O CORREIO perguntou o porquê da devolução do processo e, por meio de nota, o TJ-BA infirmou que “por se tratar de processo físico, a Vara Criminal da Comarca de Irará está impossibilitada de prestar as informações solicitadas na presente demanda”.

Desde a última terça-feira (4), o CORREIO vem buscando um posicionamento do MP-BA, sem sucesso. Ainda de acordo com uma fonte na Vara Criminal de Irará, a promotoria criminal tem apenas André Garcia como único representante do MP-BA no local – ele está de férias e, em seu lugar, está a promotora Dila Mara Neves, de Feira de Santana.  

Em nota, a Polícia Civil informou que “o procedimento foi encaminhado para a Justiça em 2018. Até a presente data, o Ministério Público não solicitou novas diligências. Após a realização de todos os procedimentos e perícias, ficou concluído que não existem elementos que comprovem que as crianças estiveram no veículo EcoSport. As buscas pelas crianças foram realizadas durante toda a investigação e todas as testemunhas possíveis ouvidas. A conclusão da investigação sobre a morte do casal não identificou autoria e motivação”.

Esperança   Pai de Robson e avô das meninas Sofia e Luna Morena, Roberto Luiz ainda tem esperança de reencontrar as netas. Em conversa com o CORREIO, ele criticou a intenção da Polícia Civil e do Ministério Público de arquivar o processo.“É um absurdo um delegado e um promotor fazerem isso. É porque não é nenhum parente deles. Quero elas vivas ou não. Queremos ter o direito de pelo mesmo dar um enterro digno”, desabafou. Ele discorda da justificativa dada pelas autoridades para o encerramento do caso. “Como não há provas? Só não acham quem matou meu filho porque não querem. E as minhas netas estavam no carro. As merendas e as mamadeiras das meninas estavam lá dentro. Os pais não iam sair e deixar as crianças sozinhas, na casa de Pedrão. Todos estavam no carro”, garantiu Roberto Luiz.

Perguntado o que ele acredita que, de fato teria acontecido naquele 28 de abril de 2017, o avô das crianças foi enfático. “Eles assassinaram todos e não viram que havia duas crianças no carro. Tiraram os corpos [delas] do carro para não causar repercussão ainda maior”, acredita. 

Mesmo após mais de dois anos do crime, Roberto Luiz segue angustiado. A incerteza do que aconteceu com as netas, para ele, é o que mais incomoda. "Às vezes passa pela minha cabeça que minhas netas não estão mais vivas. Tiraram minhas netas do carro, não é possível. Meu filho foi morto no mato, minha nora dentro do carro. Enquanto não encontrarem os corpos, vou acreditar que elas estão vivas. Só vou parar de buscar essa resposta quando Deus quiser. Até lá, vou abusar muita gente”, declarou.  Sofia e Luna Morena nunca foram encontradas (Foto: Reprodução) Desaparecimento Robin estava preste a completar 33 anos e, por isso, estava pensando em comemorar a data em Salvador, com o restante da família. Segundo a polícia, todos estavam em um carro EcoSport que foi encontrado a 5km de um sítio que Robin havia comprado no início do ano, em Pedrão. Dentro do veículo estavam os corpos de Danilo e de Juliana. No dia seguinte, os policiais encontraram também o corpo de Robin, com vários tiros, na zona rural da cidade. As meninas não foram encontradas. 

Segundo a polícia, pelo menos dois homens foram vistos dentro do sítio com Robin e a família. Os suspeitos são conhecidos de alguns moradores e costumam andar armados na região, mas até hoje não foram localizados pelos investigadores. O crime aconteceu por volta das 21h de uma sexta-feira, em um local pouco movimentado.

Robson era gerente da Katiara De acordo com informações da polícia baiana, Robson Luiz Gomes Lima, o Robin, era um dos gerentes de distribuição de drogas da facção Katiara no bairro de Valéria, em Salvador. “Dizem por aí que meu filho era traficante. A gente não manda quando o filho está adulto, já independente. Mas as minhas netas eram crianças, não tinham nada a ver com isso”, declarou Roberto Luiz.

Segundo a assessoria da Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA), Robin possuía ligação direta com o irmão do traficante Adilson Souza Lima, conhecido como Roceirinho, apontado como líder da Katiara. Ele foi preso em 2012 e, em outubro do ano passado, transferido para o Conjunto Penal de Serrinha. Posteriormente, foi encaminhado para o Presídio Federal de Segurança Máxima de Campo Grande, em Mato Grosso do Sul, onde está custodiado. 

Em julho de 2016, o criminoso participou de um julgamento por videoconferência no auditório do Fórum Criminal de Salvador, em Sussuarana. Na ocasião, Roceirinho chegou a rir duas vezes durante o depoimento do delegado Omar Leal. O julgamento foi pelos crimes de tráfico e associação ao tráfico de drogas. As investigações que levaram ao julgamento foram coordenadas por Omar Leal, que, na época, era delegado do Departamento de Narcóticos (Denarc), da Polícia Civil da Bahia.

A Katiara é uma quadrilha ligada ao grupo PCC que atua no tráfico de drogas em Salvador, Maragojipe, Salinas da Margarida, Itaparica, Nazaré das Farinhas, Vera Cruz, Santo Antônio de Jesus e Santo Amaro da Purificação.