'Escolho os mais bonitos', diz servidor que leva 30 mil galhos para Domingo de Ramos

Cerca de 20 mil pessoas participaram da procissão e da missa que dá início à Semana Santa

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  • Thais Borges

Publicado em 14 de abril de 2019 às 11:50

- Atualizado há um ano

. Crédito: Há 22 anos, o servidor público Nelson Barbosa colhe milhares de ramos para distribuir na procissão (Foto: Thais Borges/CORREIO)

Foram dois dias de preparação. Desde a última sexta-feira (12), o servidor público Nelson Barbosa, 70 anos, começou a escolher os melhores ramos de palmeiras, oliveiras e coqueiros de um sítio que tem em Imbassaí, localidade em Camaçari, na Região Metropolitana de Salvador (RMS). 

Neste domingo (14), chegou ao Campo Grande às 6h da manhã, a bordo de uma caminhonete com mais de 30 mil ramos. Tantas folhas tinham um destino certo: seriam doadas para os fiéis que foram à procissão e à missa pelo Domingo de Ramos, que dá início á Semana Santa - considerada Semana Maior pelos católicos. Desde 7h30 da manhã, cerca de 20 mil pessoas, segundo estimativas dos organizadores, seguiram em procissão do Campo Grande à Praça Municipal, acompanhadas por três trios elétricos que tocavam músicas religiosas.

Seu Nelson era uma dessas pessoas. Mas, há 22 anos, ele sentiu o desejo de  compartilhar a própria experiência com os outros fiéis. Começou com aproximadamente cinco mil ramos e, desde então, tenta aumentar a quantidade todos os anos. Para isso, conta com sete ou oito pessoas que o ajudam na missão de cortá-los. 

E até para escolha dos ramos há critérios. “Eu escolho os mais bonitos, os mais verdes, mas o segredo está no amor de quem tira”, contou, mostrando folhas de diferentes tamanhos.“O pessoal chega e a doação, para mim, é um prazer, uma alegria. O próprio ramo é alegria, então nada melhor do que distribuir”, completou Nelson. A aposentada Iara Bispo, 67, foi uma das que escolheu um dos ramos trazidos por Seu Nelson. Ela escolheu um que tinha o caule mais curto. “Peguei esse pensando na minha filha e nas minhas sobrinhas. Com esse tamanho, dá para colocar no jarro da sala. Hoje vamos benzer esse e ele vai ficar o ano todo, até trocar pelo do ano que vem”, explicou ela, que começou a ir à procissão há cinco anos. 

Mesmo com a idade, os 2,3 quilômetros do percurso não a assustavam. “Eu faço caminhada todo dia, então estou preparada. Sem contar que a gente nem sente quando está andando. Saio daqui sempre cheia de paz”. 

Para vender O pedreiro Gilson Santana, 61, também acaba sendo responsável por muitos dos ramos que são carregados na procissão. Na manhã de sábado (13), cortou mais de 100 ramos de palmeiras que ficam perto de sua casa, em Sussuarana. No domingo, o esforço continuou: trouxe o saco cheio de folhas dentro do ônibus. 

“Não tem nada fácil para a gente não, né? Mas, quando tem saúde, a gente dá um jeito”, comentou ele, que estava vendendo cada ramo por R$ 0,50. Católico, ele começou a vender os ramos há três anos, porque já fazia o percurso. Gilson trouxe ramos para vender, além de acompanhar a procissão (Foto: Thais Borges/CORREIO) “Pelo menos a gente já consegue o dinheiro do peixe, né? E eu vou até o final, só saio quando acabar”, garantiu Gilson. A dona de casa Maria Rosa de Jesus, 52, e o filho, o auxiliar de serviços gerais Aguinaldo de Jesus, 32, também levaram um saco de ramos para vender - todos colhidos pelos dois, perto de casa, no sábado. “O que não vender a gente vai benzer e levar para casa abençoado”, contou Maria Rosa, que começou com a tradição há mais de 30 anos. 

Desde então, ela faz do Domingo de Ramos um programa de família - além de Aguinaldo, estava acompanhada de outra filha. “A gente escolhe os mais bonitos e o pessoal está querendo comprar desde quando fomos pegar o ônibus, na Estação Mussurunga, para vir”, disse Aguinaldo, que vendia os ramos a R$ 1 cada. Quem quisesse levar três podia comprar por R$ 2.

Compartilhar Mas também há quem traga o próprio ramo de casa, como a auxiliar de farmácia Eliana Barbosa, 58. “Peguei perto de casa mesmo e trouxe. Nem sempre consigo vir, porque às vezes cai em um domingo que eu trabalho, mas minha mãe que é católica e vinha muito. Hoje ela está com 80 anos e não vem mais, mas eu continuo”. 

A amiga dela, a artesã Anajara Ferreira, 61, costuma fazer a mesma coisa. Esse ano, porém, esqueceu de colher as folhas antes de sair. Ao chegar, porém, uma conhecida da mesma igreja lhe deu um. “Aqui, a gente vai benzer. Depois, eu levo para casa e levamos de volta para a igreja na Quarta-feira de Cinzas, que eles serão queimados representando as cinzas”, afirmou Anajara, que frequenta a Paróquia de São Caetano. 

A vendedora Jaciara da Cruz, 60, foi uma das primeiras a chegar na Praça Municipal. Ela carregava dois ramos: um que trouxe de casa e um que ganhou ao chegar no Campo Grande. “A gente veio conversando e chegamos rápido. Não era nosso propósito ficar perto do palco, mas já que chegamos, né?”, brincou. 

Ela participou da cerimônia pela primeira vez, depois de ser convidada pela vizinha.“Estou frequentando mais a igreja e decidi vir. Vou levar o ramo e colocar na planta que fica dentro de casa. O ramo simboliza a esperança, a prosperidade e a celebração do Senhor. Estou me sentindo mais leve, realizada”, revelou Jaciara. Juventude O Domingo de Ramos relembra a chegada de Jesus a Jerusalém, onde foi recepcionado por seguidores com ramos de oliveira. Como, na época, os jovens eram maioria, a juventude passou a ter um papel importante na cerimônia. Uma carta enviada pelo Papa Francisco, em comemoração pelo Dia Mundial da Juventude, também comemorado neste domingo, foi lida antes do início da procissão. 

A missa campal foi presidida pelo Arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil, Dom Murilo Krieger, na Praça Municipal.A procissão de Ramos, disse Dom Murilo,  é uma manifestação da alegria do povo católico porque Jesus testemunha a misericórdia de Deus. “Significa que nós o escolhemos para nós apontar o caminho da vida, do amor. Significa dizer que acreditamos em sua palavra”.

Durante a celebração, o arcebispo primaz falou justamente sobre o que significa seguir o cristianismo.“A finalidade mais importante da vida deixa de ser o lucro, o carro que tenho, o título que tenho. Eu descubro que, perdendo tudo, tenho possibilidade de ganhar Jesus Cristo”, disse Dom Murilo Krieger. No entanto, não deixou de mencionar as “cruzes” pessoais carregadas por cada um dos fiéis, individualmente. 

“Quantas pessoas renunciam ao próprio conforto para dedicar sua vida pelos menos favorecidos? Quantas dores cada um de nós enfrenta com coragem? Jesus leva tantas pessoas a fazer o bem ao próximo e a maioria do nome dessas pessoas só conheceremos na eternidade, porque elas são discretas”, afirmou. 

Durante a celebração, jovens de 10 paróquias subiram ao altar para receber ícones com a imagem de Nossa Senhora da Conceição da Praia, padroeira da Bahia. Os ícones vão percorrer as 100 paróquias da Arquidiocese de Salvador como parte da comemoração pelos 470 anos da devoção à Nossa Senhora da Conceição.

Confira a programação da Semana Santa em Salvador

17 de abril – Procissão do Encontro/ Quarta-feira Santa Encontro simbólico das imagens de Nossa Senhora das Dores e do Senhor Bom Jesus dos Passos, às 12h30, na Igreja da Ajuda (Centro Histórico). Por volta das 13h30, a imagem do Senhor Bom Jesus dos Passos será conduzida até a Igreja de São Domingos de Gusmão (Terreiro de Jesus).

18 de abril - Missa dos Santos Óleos/Quinta-feira Santa O Arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil, Dom Murilo Krieger, presidirá a Missa do Crisma e da Renovação das Promessas Sacerdotais, na Catedral Basílica, às 8h30. 

Missa da Ceia e do Lava-Pés - À noite, às 18h, Dom Murilo presidirá a Missa da Ceia do Senhor, na Catedral Basílica.

19 de abril – Sexta-feira da Paixão Dom Murilo presidirá a Liturgia da Paixão, a partir das 15h, na Igreja São Domingos de Gusmão (Terreiro de Jesus). A partir das 17h, na Catedral Basílica, acontecerá a veneração da imagem do Senhor Morto.

20 de abril – Sábado Santo / Vigília Pascal A Vigília Pascal terá início às 18h, na Catedral Basílica.

21 de abril – Páscoa Dom Murilo presidirá a Missa no Domingo de Páscoa, às 10h, na Catedral Basílica.