Estrela precoce: 20 anos da morte de Luis Eduardo Magalhães

Baiano foi presidente da Câmara dos Deputados e marcou gerações da política nacional

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  • Luan Santos

Publicado em 21 de abril de 2018 às 07:57

- Atualizado há um ano

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Luis Eduardo Magalhães precisou de pouco tempo para deixar a sua marca na história do Brasil. Com apenas 18 anos ingressa na vida pública. Aos 40, atinge o ápice na carreira parlamentar, ao se tornar presidente da Câmara dos Deputados. Em dois anos, a Casa vota 656 projetos, entre os quais 14 emendas à Constituição.

Boa parte da abertura da economia brasileira – com aprovação de reformas, como o novo conceito de empresa nacional, fim do monopólio estatal do petróleo, nas telecomunicações e da distribuição de gás – dependeu da habilidade de articulação do político baiano. Em 1998, o deputado baiano Luis Eduardo Magalhães era considerado uma das estrelas da política brasileira (Ed Ferreira/ESTADÃO CONTEÚDO) Após um biênio como presidente da Câmara, Luis Eduardo liderava a bancada governista na Casa e se preparava para a disputa pelo governo da Bahia naquele 1998, com favoritismo. Além de contar com a força política do pai, o falecido senador e líder Antonio Carlos Magalhães, era um exímio articulador político e tinha o respeito até mesmo de  seus adversários.

O baiano foi um dos grandes responsáveis pela estabilização da moeda durante o plano real e pela abertura do mercado brasileiro, o que proporcionou a chegada de investimentos internacionais. Na liderança do governo, ele detinha quatro qualidades consideradas fundamentais para o posto: suficiência intelectual, tino político agudo, paciência e um sorriso cirúrgico.Para mim, ele será uma saudade e, sobretudo, um exemplo de homem, pai e cidadão (Luis Eduardo Magalhães Filho, filho de Luis Eduardo)“Ele comandou com muita firmeza e competência a aprovação das medidas que reformaram o país. Muito se deve a ele por desamarrar uma série de amarras constitucionais. A rearrumação do papel do Estado, principal marca dele como presidente e líder do governo, foi exatamente essa”, lembra o irmão, Antonio Carlos Júnior, presidente da Rede Bahia.

Personalidade Liberal convicto e declarado, o político baiano tinha personalidade forte e, apesar da admiração que nutria pelo pai,   era conhecido pela independência no campo das ideias. “Ele tem as minhas virtudes e nenhum dos meus defeitos”, disse, certa vez, ACM, ao falar sobre o filho.

Desde sempre defendia conceitos liberais e pregava que o liberalismo é, sobretudo, uma atitude de vida, a capacidade de ter convicções, mas, acima de tudo, de conviver com as convicções alheias. Era admirador das ideias do economista Roberto Campos. 

Num artigo sobre o baiano, Campos escreveu: “Em conversas informais com o jovem deputado, tive uma agradável surpresa. Não se tinha contaminado com os mitos que incendiavam a juventude da época”.  Eles foram colegas na Câmara dos Deputados e participaram da Constituinte de 1988.

Brilho próprio Luis Eduardo chegou no Congresso em 1987 como filho de ACM, mas não demoraria muito para mostrar luz própria ao defender, de maneira firme, suas convicções e demonstrar sua capacidade de diálogo com as mais diversas linhas ideológicas.Apesar de terem se passado 20 anos, seus exemplos ficam e, sobretudo, inspiram as novas gerações (ACM Neto, prefeito de Salvador e sobrinho de Luis Eduardo)Ele entrou para a vida pública em 1973 e, dois anos depois, foi nomeado chefe de gabinete da Primeira Secretaria da Assembleia Legislativa. Em 1975, iniciou a graduação em Direito na Universidade Federal da Bahia (Ufba) e, após concluir o curso, foi eleito deputado estadual pela primeira vez, em 1979, aos 23 anos. Conseguiu uma votação recorde para um deputado estadual: 125.333 votos. Foi reeleito em 1982 e, três anos depois, chegou à presidência da Casa.

Foi nesse início de carreira que o ex-deputado Leur Lomanto conheceu Luis Eduardo. Logo se tornaram amigos. “Ele era candidato a estadual e eu a federal. Logo percebi uma vocação extraordinária que herdou do pai para a política”, lembra.

“A habilidade de Luis Eduardo de conviver com os contrários, de dialogar e encontrar caminhos era um grande diferencial”, acredita o ex-deputado. Em 1982, Luis Eduardo Magalhães, presidente da Assembleia Legislativa, ao lado do pai e então governador da Bahia, Antonio Carlos Magalhães (Foto: Arquivo Correio) Ápice Os posicionamentos firmes e a imensa capacidade de diálogo fizeram o parlamentar ser convidado por Fernando Henrique Cardoso a ser candidato a vice-presidente na chapa dele. Recusou. Luis Eduardo, diga-se de passagem, foi um dos principais líderes das articulações que levaram FHC a disputar a eleição pelo PSDB. Foi, ainda, o principal elo  entre os tucanos e o PFL, partido do qual era líder no Congresso.

A atuação destacada fez de Luis Eduardo o favorito para a disputa pela Presidência da República em 2002, na sucessão de FHC. Antes, contudo, decidiu disputar o governo da Bahia em 1998. Teve pela frente uma decisão difícil: continuar em Brasília, como senador, ou concorrer ao governo do estado e ganhar experiência no Executivo.

Optou pela segunda alternativa, que era também o desejo do pai. Anunciou a candidatura em março de 1998 e já se preparava para a disputa. A primeira mudança foi a preocupação com a saúde. Alterou hábitos, melhorou a alimentação e passou a fazer mais atividades físicas.

Mas, no dia 21 de abril, quis o destino que o sonho tivesse fim precoce. Deixou admiradores nas mais diversas correntes políticas. Os liberais mais fervorosos o consideram o melhor presidente que o Brasil jamais teve.

E aquele mesmo Roberto Campos, ao escrever uma despedida para o baiano, resumiu o sentimento de perplexidade e tristeza: “Para Luis Eduardo, aos 43 anos, cada nova manhã era um direito e uma promessa. Entretanto, as manhãs lhe foram roubadas. E a promessa não se cumprirá. A vida é injusta”. Eleito presidente da Câmara, em 1995, Luis Eduardo articulou reformas nos governos Fernando Henrique (Foto: Wilson Pedrosa/Agencia Brasil) Uma vida que ia muito além da política

Nem só de política vivia Luis Eduardo Magalhães. Longe do Parlamento e dos encontros partidários, havia um homem apaixonado por música e cinema. Adorava Frank Sinatra, Tom Jobim e boas rodadas de conversa.

A intensidade, característica marcante na vida pública, também estava presente dentro de casa, na convivência com amigos e familiares.   Se em Brasília a rotina era totalmente dedicada ao trabalho pelo futuro do país, o período em Salvador era de total dedicação à família. “Era quando ele se dedicava à família, ia ao cinema, pedia que os filhos lessem livros, falava de futebol. Era um pai amoroso, muito alegre”, lembra a esposa, Michelle Marie. A diretora-presidente da ONG Parque Social, Rosário Magalhães, o presidente da Rede Bahia, Antonio Carlos Magalhães Júnior e o prefeito de Salvador, ACM Neto na missa de sexta-feira (Foto: Evandro Veiga) Luis Eduardo deixou três filhos: Carolina, Paula e Luis Eduardo. “Tem um lado pessoal e político que marcou muito. Ele deixou uma marca forte de amizade, lealdade, de companheirismo. Tinha ligação profunda de irmão com irmão”, lembra Antonio Carlos Júnior.

Para Luis Eduardo Magalhães Filho, o pai será lembrado pelo Brasil por suas muitas virtudes, mas para ele: “Meu pai não será esquecido, por ter constituído uma família sólida e harmoniosa. Para mim, ele será uma saudade e, sobretudo, um exemplo de homem, pai e  cidadão”.

Exemplo O prefeito ACM Neto (DEM), sobrinho de Luis Eduardo, destaca que os exemplos do homem público permanecem até hoje, 20 anos depois de sua partida. E seguem inspirando novas gerações. “Até hoje, ele marca a história do Brasil pelo que fez como parlamentar. Por sua visão de futuro, pelo seu espírito público, Luis Eduardo é lembrado em todo o país pelo grande político que foi. Apessar de terem se passado   20 anos, seus exemplos ficam e, sobretudo, inspiram as novas gerações”, pontua. O empresário Luis Eduardo Magalhães Filho (Foto: Evandro Veiga) Também contemporâneo de Luis Eduardo, o deputado federal Benito Gama (PTB)  conta que iniciou bom relacionamento com ele já na chegada à Câmara. “Era respeitado por todos, porque respeitava a palavra e a posição de todos. Cumpria os acordos, e quando não podia fazer algo, dizia. Por isso, tinha bom trânsito”, relembra o parlamentar.

Adversários lembram relação de respeito e admiração com político

A relação de boa convivência não se restringia aos aliados políticos. Luis Eduardo Magalhães conquistou, também, o respeito e a admiração dos adversários.

A senadora Lídice da Mata (PSB), por exemplo, conta que mantinha diálogo com ele e lembra do tempo em que havia maior tolerância entre os pensamentos divergentes. “Era uma relação de dois adversários em pensamento, mas que se respeitavam muito. Eu conversava muito com ele quando era prefeita. Era um tempo da política em que a conversa com os adversários era compreendida de forma clara como necessidade”, contou.

Ela recorda que, quando o político ainda presidia a Assembleia, houve uma invasão da polícia na sede da Associação de Funcionários Públicos da Bahia. “Nós o procuramos, para que a Assembleia intermediasse a conversa, e ele o fez. Comigo ele sempre foi muito afável”, lembra. As filhas de Luis Eduardo Magalhães: a musa fit Carolina Magalhães e a editora do BAZAR e apresentadora do Expresso da Moda do Mosaico, Paula Magalhães (Foto: Evandro Veiga) O ex-governador Jaques Wagner, ao se referir a Luis Eduardo, falou do respeito que existia entre ambos: “A amizade, o carinho e o respeito da nossa relação se construiu a partir de características que considero fundamentais no político: cumpridor de acordo, mantenedor de palavra e aberto ao entendimento”. Numa entrevista recente, Wagner definiu o falecido amigo como alguém “duro na defesa de suas posições, mas de fino trato com as pessoas”.

O ex-deputado Domingos Leonelli (PSB) revela que teve atritos com Luis Eduardo,  mas o diálogo sempre prevaleceu. “Como presidente da Assembleia, foi democrático e sempre aberto ao diálogo com  todos. Era uma figura liberal e defendia suas ideias com convicção”, relembra.

A vida

1955 -  Nasceu em 16 de março, em Salvador, filho do líder político baiano Antonio Carlos Magalhães e de Arlette Maron de Magalhães

1973 -  Inicia a carreira política ao aceitar um cargo no gabinete do pai, então governador da Bahia

1975 -   Entra para a Faculdade de Direito da Ufba e é nomeado chefe de gabinete da Primeira Secretaria da Assembleia Legislativa

1979 -  É eleito pela primeira vez deputado estadual, com votação recorde até aquele momento: 125.333 votos. Reeleito em 1982, três anos depois, chega à presidência da Assembleia

1987 -   Chega ao Congresso para exercer o primeiro mandato de deputado federal. Integra a Assembleia Constituinte de 1988

1995 -   É eleito presidente da Câmara. Com ele, a Câmara vota 656 projetos, entre os quais 14 foram emendas constitucionais. Conduz reformas vitais para o país, entre elas o novo conceito de empresa nacional e a derrubada do monopólio estatal do petróleo, telecomunicações e distribuição de gás

1997 -   Após dois anos como presidente da Câmara, assumiu a liderança do governo na Câmara e desponta como principal nome da base para a sucessão presidencial de 2002

1998 -  Morre em 21 de abril de 1998 após um infarto. Pré-candidato ao governo baiano, era favorito