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Da Redação
Publicado em 31 de julho de 2019 às 11:32
- Atualizado há 2 anos
A atriz Ruth de Souza morreu no último domingo (28), aos 98 anos (foto/Tv Globo) No ultimo domingo a grande diva do teatro, cinema e teledramaturgia brasileira nos deixou. Estou falando de Ruth de Souza uma mulher negra que revolucionou a arte em nosso país desde que decidiu fazer parte do cenário artístico brasileiro no século passado, ainda menina, sem saber no que ia dar. Em 1940 integrou o grupo revolucionário TEN - Teatro Experimental do Negro, liderado pelo também revolucionário Abdias do Nascimento.>
Em 1945, foi a primeira atriz negra a se apresentar no palco do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, em 1947, premiada como melhor atriz revelação, pesquisou artes cênicas nos Estados Unidos nos anos 50 e foi primeira brasileira a ser indicada ao Leão de Ouro em Veneza no ano de 1953 pelo seu personagem em Sinha Moça.>
Fez 40 novelas, dezenas de peças e 33 filmes. Uma mulher de sorriso leve e simpático que iluminava tudo por onde passava, deixando sempre uma rastro de elegância e nobreza. Ela sempre rompeu as barreiras que o racismo lhe impusera com discurso e talento apresentados na sua presença forte.>
Lembro de Dona Ruth sempre mais velha que eu, portanto, referencia eterna que não se apaga com a morte. Ela é e continuará sendo referência artística para as próximas gerações tão carentes de exemplos louváveis. Numa das vezes que a encontrei, fui mestre de cerimônia na homenagem dedicada a Ruth no Prêmio do Cinema Brasileiro, em 2013, e pude sentir de perto a sua energia forte ao abraçá-la. Era gostoso ouvi-la falar e agradecer, mas também pedir que nós artistas negros continuássemos com aquele trabalho construído por ela e tantos outros atores negros que vieram antes de nós. Nessa ocasião, eu representava Grande Otelo, outro grande ator e revolucionário que contracenou com Dona Ruth. Ela me contou que perguntou à autora de uma das novelas que participou por que que os personagens brancos que morriam e foram para o céu tinham mortes simples e os personagens negros morriam de forma horrenda, causada pelos problemas sociais como tiros, assaltos e etc… Será que os negros não podiam morrer simplesmente!? Era exemplo de consciência negra.>
Varias vezes encontrei dona Ruth em eventos inusitados como celebrações, reuniões em que eu não imaginaria que ela estivesse ali pela sua idade. Numa dessas vezes, foi a homenagem a ela no Carnaval desse ano, qundo ela foi enredo de uma escola de samba na Sapucaí, numa homenagem em vida que parecia anunciar a sua partida sem que a gente soubesse. Tarefa daquelas que o destino nos aplica sem que a gente saiba do que virá nos próximos dias, a partida. Ela sorria, chorava de emoção e agradecia a todo momento por tudo que estava sendo louvado naquele grande palco, naquela grande festa e assistida pelo mundo. Era aparente a sensação de missão cumprida por Ruth, que era tão viva e feliz.>
São muitas as lições de vida que servem de exemplo para o Brasil quando se trata de liberdade para o povo negro desse pais deixada por dona Ruth de Souza aos homens e mulheres combatentes e resignados. Uma biblioteca de conhecimentos que se fecha mas deixa no imaginário popular as melhores imagens e sons gritando por liberdade proveniente da revolução interior individual e coletiva.>
Como sabemos, a morte da matéria é certa de acontecer mas a memória quem mata somos nós - se quisermos.>
Dona Ruth está viva e muito viva entre nós. >
Evoé, Dona Ruth.>