Fiol: Dez minutos de leilão resolvem nove anos de obras paradas

Mineradora Bamin oferece o único lance pelo trecho inicial da ferrovia, que deve entrar em operação em 2025

Publicado em 9 de abril de 2021 às 05:00

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Divulgação
Produção de minério de ferro na mina da Bamin em Caetité por Divulgação

Em tempos de pandemia, a tradicional batida do martelo no leilão é individual. Antes e depois de cada um fazer o tradicional gesto, a ferramenta de madeira que representa a definição de um vencedor é higienizada com álcool em gel. O natural sorriso de satisfação pelo resultado positivo é ocultado pelas máscaras de proteção. Mas sem dúvidas, Eduardo Ledsham, presidente da Bamin estava feliz quando bateu o martelo e concretizou a aquisição da Fiol 1, que vai de Caetité até Ilhéus.  

Num único lance, Bamin arrematou o trecho de 537 quilômetros da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol) pela outorga mínima de R$ 32,73 milhões e deu um passo decisivo para a implantação de um dos maiores complexos de infraestrutura da história da Bahia. Além de ter conquistado o direito de concluir e administrar a primeira parte da ferrovia, a mineradora está construindo, junto com o governo da Bahia, o Porto Sul – que vai escoar a produção movimentada pela Fiol e receber produtos do mercado externo. 

Com a vitória a Bamin será responsável pela conclusão das obras – hoje 80% prontas – e operação do trecho. A concessão é de 35 anos, totalizando R$ 3,3 bilhões de investimentos. Desse total, R$ 1,6 bilhão será utilizado para a finalização do trecho. A expectativa é que o trecho leiloado e o Porto Sul entrem em operação juntos, em 2025. Além disso, a concessão vai permitir a criação de 55 mil empregos diretos, indiretos e efeito-renda ao longo da concessão.  Inicialmente, este complexo logístico vai movimentar 18 milhões de toneladas de carga, mas em 10 anos, deve mais que dobrar, superando os 50 milhões de toneladas.

O contrato prevê que a mineradora deverá pagar trimestralmente o equivalente a 3,43% da movimentação de carga, além do valor fixo de outorga. 

Foram necessários apenas 10 minutos para encerrar uma novela que se arrasta a quase duas décadas, relacionada a um sonho de integração entre o litoral e o Centro-Oeste brasileiro que remonta ao período da criação de Brasília. O leilão foi iniciado na B3, em São Paulo às 14:36 e pouco depois estava lá Eduardo Ledham, o ministro da Infraestrutura Tarcísio Freitas e outras autoridades já batendo o martelo. 

ASSISTA O LEILÃO DE CONCESSÃO DA FIOL

O presidente da Bamin destacou a importância da obra para a Bahia. “Sem dúvidas estamos fazendo história. Estamos encurtando a distância entre presente e futuro no desenvolvimento da Bahia e o desenvolvimento do país”, destacou. Segundo Ledsham, a mineradora deve bancar o investimento necessário para a obra com recursos próprios. Quanto à operação da ferrovia, ele lembrou que a ERC, acionista da Bamin, possui expertise no modal de transporte. Para ele, o trecho consolida três fatores fundamentais para o desenvolvimento do Brasil: mineração, agropecuária e logística. “Este trecho é extremamente importante para diversas pessoas que acreditam neste desenvolvimento sustentável dos diversos setores da economia”, disse. “Os 20 municípios entre Caetité e Ilhéus podem ter a certeza de que vamos trabalhar duro para garantir a prosperidade e o sucesso”, garantiu. 

Quando tiver os seus três trechos concluídos, a ferrovia fará valer o “I” de integração em sua sigla e vai conectar o litoral baiano não apenas à região mineradora do Sudoeste estadual, mas também à produção de grãos no Oeste da Bahia e dos estados do Centro-Oeste, a partir de uma conexão com a Ferrovia de Integração Norte-Sul e com a Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico). Mas a  concessão do primeiro trecho já vai transformar a logística da Bahia e ampliar a participação ferroviária na matriz de transportes do Brasil. 

No primeiro momento, o projeto auxiliará o escoamento do minério de ferro produzido na região de Caetité e da produção de grãos e minério do Oeste da Bahia pelo Porto Sul. O ministro da Infraestrutura Tarcísio Freitas informou ontem mesmo que o governo vai requalificar a rodovia que liga Cocos a Carinhanha, facilitando o acesso rodoviário das cargas do Oeste ao porto seco que será instalado em Caetité. 

O ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, destacou os investimentos que estão sendo feitos no setor ferroviário no Brasil e garantiu que o governo federal já articula alternativas para viabilizar as licitações dos trechos II (entre Caetité e Barreiras) e III (entre Barreiras e Figueirópolis, em Tocantins). “A gente está diante do projeto mais transformador do estado da Bahia. Estamos celebrando mais de R$ 3 bilhões de investimento. Vai permitir a conclusão de uma obra inacabada há mais de 10 anos. E essa concessão equaciona também a construção do Porto Sul. A gente vai ter um sistema integrado”, destacou. “Falar em Fiol significa diminuir em três vezes a emissão de CO2 do transporte rodoviário, redução de acidentes”, acrescentou o ministro. No primeiro trecho, a ferrovia vai passar por 20 municípios baianos, transportando cargas como minério de ferro, alimentos processados, cimento, combustíveis, soja em grão, farelo de soja, manufaturados, petroquímicos e outros minerais. Quando estiver completa, a Fiol passará por 43 municípios e será um corredor de escoamento com 1.527 quilômetros de trilhos.

No início das operações, 16 locomotivas e 1,4 mil vagões estarão em operação, dos quais, pelo menos, 1,1 mil serão destinados ao escoamento de minério de ferro. Em 10 anos, a expectativa é chegar a 34 locomotivas e 2.600 vagões.

[[galeria]]

Quando estiver em operação, o trecho arrematado ontem vai adicionar à economia baiana entre R$ 500 e R$ 600 milhões em novos recursos, pela produção mineral. 

O vice-governador e secretário de Desenvolvimento Econômico da Bahia (SDE), João Leão, destacou a união de esforços a favor do projeto. “Mais um dia de vitória. A Fiol será uma locomotiva de desenvolvimento da Bahia e agora vai rodar, carregando minério, soja, melhorando as condições de Ilhéus à Caetité - que vai se transformar em uma grande cidade em função da mineração -, além de Barreiras, um dos principais polos do agronegócio no estado”, destaca.O presidente da Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM), Antonio Carlos Tramm, considera a realização do leilão da Fiol como uma vitória para a Bahia. “A Bahia venceu e muita gente não tem ideia do que representa a Fiol para o desenvolvimento do nosso estado. Nós iremos nos tornar o terceiro estado do país em produção mineral”, acredita. Segundo o presidente da CBPM, isso vai representar entre R$ 500 a R$ 600 milhões por ano em dinheiro novo para a Bahia. "A Fiol é o desenvolvimento cruzando o estado saindo do extremo oeste até o litoral de Ilhéus”.Tramm acredita que no futuro próximo haverá necessidade de pensar na ampliação da ferrovia. “Se considerarmos as jazidas minerais já localizadas e identificadas na região de Caetité, além de todo o trabalho de prospecção que a companhia está fazendo nos 100 km no entorno dos trilhos, mais o transporte da produção do agronegócio que virá de Barreiras, vamos ver que rapidamente haverá necessidade de ampliar a sua capacidade de transporte”, avalia. 

Ricardo Kawabe, gerente de estudos técnicos da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), acredita que o projeto integral da Fiol terá um grande impacto na economia brasileira. “Para a Bahia, este primeiro trecho já terá um impacto significativo. A ligação entre Caetité e Ilhéus já possui uma viabilidade econômica muito grande, com cargas disponíveis”, destaca. “A gente aposta que isso vai dar um impulso grande para aquela região da Bahia”, projeta. 

Marcia Seillier, a secretária especial do Programa de Parcerias de Investimentos do Governo Federal (PPI) disse que teve a oportunidade de conhecer o trabalho da Bamin em Caetité e se encantou tanto com o impacto econômico, quanto social e ambiental. Ela ressaltou a qualidade do processo de concessão. "Esses projetos de infra demandam semanas, meses e anos de estruturação. Demora para colocar isso no papel de maneira atrativa para os investidores", explicou. "Nós tinhamos pouquissimos investimentos ferroviários. Hoje temos um compromisso com transformação da matriz logística", disse. 

O diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Alexandre Porto, lembrou que o Brasil voltou a realizar leilões de ferrovias recentemente, após um longo período sem esse tipo de oferta. “A concessão da Fiol vai viabilizar um investimento de R$ 3,3 bilhões e permitir a geração de 55 mil empregos diretos”, destacou. 

Porto Sul A implantação do Porto Sul em Ilhéus ganhou um caráter definitivo ontem com o leilão da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol). Final da linha ou início do caminho para as cargas que forem movimentadas pela ferrovia, o terminal logístico já tem suas obras de implantação 18,45% concluídas, de acordo com o governo da Bahia, sócio da Bamin no empreendimento localizado no distrito de Aritaguá. 

As obras de implantação foram iniciadas em novembro de 2020 e empregam atualmente 280 pessoas diretamente e outras 400 indiretamente. O número deve chegar a 1,2 mil indiretos quando atingir o pico de obras. Essa etapa conta com a construção da ponte rodoviária sobre o Rio Almada, que terá acessos pela BA-001 e BA-262, e inclui a construção de vias, instalação de sinalização, implantação de redes elétrica e de água, entre outras ações.  Em julho está previsto o início da obra de construção da parte marítima. Para o secretário de infraestrutura do Estado, Marcus Cavalcanti, a Fiol e o Porto Sul vão proporcionar uma mudança não só para o desenvolvimento econômico do estado, mas também na infraestrutura rodoviária da Bahia. “A construção dos empreendimentos provocará alterações importantes de rodovias já existentes e a necessidade de implantação de outras. Além disso, vai reduzir o fluxo de cargas pesadas nos corredores rodoviários”, analisa.O coordenador executivo de infraestrutura da Casa Civil do governo do estado, José Carlos Valle, lembra que a Fiol já nasce com uma garantia de demanda de 30% de sua capacidade e projeta um aumento neste número com o passar do tempo. “Claro que com o surgimento da ferrovia e sua operação, outras demandas irão surgir de maneira natural. Com o Porto Sul, do mesmo modo. Tem um cliente cativo, que é a Bamin”, lembra. 

Valle acredita que dentro de três meses, prazo para a assinatura de contrato, entre 1,5 mil e 2 mil pessoas deverão estar trabalhando nas obras de conclusão do trecho 1 da ferro. Além disso, outros 900 empregos diretos devem ser gerados no pico das obras de implantação do Porto Sul, além de 1,5 mil indiretos. Atualmente, 280 empregos diretos são mantidos no local e, pelo menos outros 400 indiretos, estima.

O empresário Matheus Oliva, diretor comercial da Intermarítima, acredita que a região Sul da Bahia será bastante impactada pela operação. “Ilhéus e aquela região merece este investimento e com certeza será bastante impactada por essa operação logo”, avalia. Ele falou sobre o processo de implantação da Fiol no programa Política & Economia. Para Oliva, por enquanto o projeto é muito importante para a Bamin e só no futuro deverá ampliar o seu papel na economia.“Por enquanto vemos um sistema logístico robusto, importantíssimo, porém privado, para uma atividade. Numa segunda fase do Porto Sul e da Fiol, você terá uma atratividade de cargas do Oeste”, ressalta. Para ele, ainda estamos no primeiro passo de um projeto de longo prazo em relação à criação de um novo eixo portuário.