Futebol, superstição e remakes

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  • Gabriel Galo

Publicado em 24 de junho de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Nós nascemos supersticiosos. Pegue o exemplo de crianças que adoram assistir ao mesmo filme centenas de vezes. Cria-se o modelo de segurança. Aprende-se causas e efeitos, ações e reações. A repetição aumenta a compreensão do todo. “Eu vi eu entendi, eu sei. Agora põe de novo que eu vou adivinhar o que vai acontecer.”

Dali para frente, é apenas questão de ligar experiências prévias a uma predição do além-tempo. Afinal, se o bater de asas de uma borboleta na China pode causar um tufão na América Central, que há de dizer que não é a cor da meia que vai indicar que o título do seu time esse ano vem?

A superstição é um fator importante na definição da ordem do cosmo. Os supersticiosos não são agentes do caos, trombando em improbabilidades, assistindo a desenrolares que nada têm a ver com o eu. São, na verdade, os controladores do universo, que se ajoelha à mercê da cor da cueca, da rotina de preparação, de como aquela nuvem carregada ali adiante recorda a chuva que caiu naquela vez que o time goleou.

A grande delícia da superstição é a sensação de onipotência. Assim como somos todos milionários porque apostamos na Mega Sena acumulada, fazendo planos de como gastar a fortuna, a sorte é jogada para escanteio e a prerrogativa passa a ser os sinais, fortes sinais!, de que a nossa vontade será feita.

Por isso somos tão atraídos à previsão do futuro. Saber o que dobra a esquina da vida acalma a desesperança. Pintamos, pois, em cartazes os “eu já sabia” que a profecia se amostrou clara e óbvia e só eu, sozinho, único em minha soberania intocada, fui capaz de perceber. (Sobe sonoplastia para a risada de dominar o mundo.)

Absorve-se, assim, o limite do viés de confirmação, ignorando-se o que derruba a crença e elevando-se ao dom da escrita imutável do porvir o que se encaixa na narrativa.

É assim, então, que se estabeleceu a verdade, ao menos para mim (e aproveito para espalhar o oráculo aos quatro ventos), talhada na pedra do messias: esta Copa América é nossa.

E por quê?

Ora, amigos de letras e de rituais, é por causa da Copa América de 1989.

Lá, como cá, o Brasil começou tropeçando. Foi vaiado na primeira fase em Salvador. Era comandado por um técnico questionado pelos serviços prestados e que iniciou a competição pressionado. Mas no fim, levantou o caneco no Maracanã.

Categoricamente, sacramento: este troféu está no papo. É um remake de uma novela que já acompanhamos. Está aqui, eu vejo e afirmo.

Mas atento para o determinismo da superstição combinada. Não releve ou deixe de lado o seu processo particular. As coisas operam em conjunto, são peças de uma mesma engrenagem. Pode bastar uma falha na simbiose entre o público e o privado para pôr tudo a perder. Ganharemos, o título virá que eu vi, mas não esqueça da figa. Só pra garantir.

Gabriel Galo é escritor