Guggenheim e Prado têm histórias de derrotas antes de transformação artística

Quando a arte salvou a Espanha

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  • Wladmir Pinheiro

Publicado em 5 de maio de 2019 às 04:50

- Atualizado há um ano

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É proibido tirar fotos na sala onde está o quadro As Meninas, uma das mais antigas ‘selfies’ de que se tem registro no mundo. “No, no”, repete firme o vigilante do Museu Prado, em Madri, ao impedir um turista de se fotografar diante do quadro mais famoso do pintor espanhol Diego Velásquez. Ali, gigante na parede, a pintura de Velásquez coloca o espectador na posição de testemunha. A tela inteira é a representação do momento em que o monarca Filipe IV e Mariana da Espanha são pintados por Velasquez. Porem, rei e rainha não aparecem na imagem, ao contrário do artista, que aparece retratado no próprio quadro, com o pincel e a paleta de cores nas mãos. O casal real se resume a um pequeno borrão refletido no espelho, à direita do exibido e audacioso pintor. A tela é uma das mais impactantes do museu, que completa 200 anos em 2019. Museu Prado comemora 200 anos (Foto: Wladmir Pinheiro/CORREIO) As obras do Prado percorreram um longo caminho até ali. A família real espanhola tinha perdido boa parte de suas pinturas de valor inestimável e outros tantos tesouros para o irmão de Napoleão Bonaparte, Joseph, que comandou saques em palácios e igrejas. Tudo foi decorar as paredes mais luxuosas de Paris. Só em 1814, quando o Rei Ferdinand VII conseguiu recuperar o trono, as obras de arte começaram a voltar para a Espanha. Estimulado por sua segunda esposa, Maria Isabel de Bragança, o rei decidiu construir um lugar para preservar não apenas as principais obras da Era de Ouro das artes espanholas do século XVI e XVII, mas também as telas de outros artistas para as futuras gerações. Estava criado o Prado. Jardim das Delícias é um dos quadros mais disputados do Prado (Foto: Wladmir Pinheiro/CORREIO) O museu tem hoje um dos maiores acervos de arte ocidental do mundo, com obras de Goya, Tintoretto, Caravaggio, El Greco e tantos outros. Está lá o provocador Jardim das Delícias, de Hieronymus Bosch, de 1504, um tempo em que nudez só era permitido aparecer nas artes em contexto religioso. É possível imaginar o escândalo para a época. As cenas sexuais retratadas de maneira pulsante e viva, que inevitavelmente conduzirá (spoiler) ao sofrimento eterno cristão na última peça do tríptico, é uma esbórnia de detalhes. Imperdível até para os mais castos. 

O norte se lembra A 400 quilômetros de Madri, Bilbao vivia o auge da decadência na década de 1980. A indústria de siderurgia estava quebrada, o desemprego chegava a 23%, e o País Basco contabilizava diariamente as mortes provocadas pelo grupo terrorista ETA. Foi quando a cidade decidiu se reinventar pelas artes. As negociações com a Fundação Solomon R. Guggenheim de Nova York levaram para a cinzenta cidade portuária um museu de arte moderna. Museu Guggenheim, em Bilbao (Foto: Wladmir Pinheiro/CORREIO) O prédio criado pelo arquiteto Frank Gehry é, por si só, uma obra à parte. É uma rosa ou um barco? O Guggenheim se esgueira pelas margens do Rio Nervio, coberto por 33 mil placas de titânio. As obras do seu interior, como as da artista Jenny Holzer, são menos conhecidas do que as que adornam a parte externa do museu. Ficam lá fora o famoso Puppie, o cachorro coberto de flores do artista Jeff Koon, que também tem tulipas coloridas de aço, como um buquê deixado de presente na beira do rio, e a aranha de canelas magras Mamá, de Heloise Bourgeois. Mas todas elas não são tão atraentes quanto a arquitetura do Guggenheim. Puppie tem flores irrigadas por sistema interno e são trocadas duas vezes ao ano (Foto: Wladmir Pinheiro/CORREIO) Diariamente, estudantes, velhos, trabalhadores do fim do dia e crianças rumam para o entorno do museu para ver o Guggenheim ganhar um filtro alaranjado, e também para ouvir o vento do mar da Cantábria vibrar nas placas de titânio. É um som para nunca esquecer de quando Bilbao perdeu a cor. Guggenheim é coberto por placas de titânio (Foto: Wladmir Pinheiro/CORREIO) O que saber antes de viajar

Os mais queridos Prado e Guggenheim receberam mais de 4 milhões de visitantes em 2018; visita a Bilbao e Madri pode ser encaixada em uma mesma viagem à Espanha

Tarifas guggenheim Adultos pagam 13 euros, estudantes e idosos pagam  7,50 €, e crianças entram de graça. Abre de terça a domingo, de 10h às 20h, exceto às segundas

Tarifas Museu Prado Entrada custa 15€. Menores de 18 anos não pagam. De segunda a sábado, 10h às 20h. Domingos e feriados, das 10h às 19h. A entrada é gratuita nas últimas duas horas.

Reina Sofia de bônus Uma vez em Madri, vale a pena visitar também o Museu Reina Sofia. O espaço é dedicado às artes modernas. A obra mais famosa da coleção é Guernica, de Pablo Picasso

* O jornalista visitou os dois museus a convite da companhia espanhola Iberdrola