Home office é tendência na Bahia mesmo antes da pandemia

Só em Salvador 114 mil pessoas exerciam suas profissões dentro de casa em 2019

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  • Vinicius Nascimento

Publicado em 27 de agosto de 2020 às 05:45

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Acervo Pessoal

A explosão de pessoas trabalhando em home office por conta do coronavírus só aumentou uma tendência que já é realidade na Bahia há muito tempo. Seja no trabalho informal ou até com iniciativas de empreendimento mais formalizadas, a verdade é que o baiano tem escritório em casa desde antes disso virar moda ou necessidade.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o  número de pessoas que trabalhavam em casa seguiu em alta na Bahia e em Salvador durante o ano de 2019. No estado como um todo, no ano passado, 298 mil pessoas tinham a própria residência como local de trabalho, o que representava 6,2% da população ocupada. Houve aumento de 60 mil pessoas nessa situação em relação a 2018, quando 238 mil pessoas trabalhavam em casa.

Já na capital baiana, em 2019, 114 mil pessoas exerciam suas profissões de dentro do próprio lar. Isso representa aproximadamente 1 em cada 10 pessoas, ou 9,5% de todos os trabalhadores da cidade.  Esse número cresceu em 15 mil pessoas frente a 2018, quando 99 mil trabalhavam no próprio domicílio em Salvador - 8,2% do total.

Arquiteta e urbanista com mais de 15 anos de carreira, Adriana Vieira tinha o seu próprio escritório mas aos poucos foi reduzindo de tamanho até que a partir de 2018 começou a resolver o seu ofício dentro de casa. No início a medida aconteceu quase que de forma forçada, para diminuir custos, mas aos poucos a empresária tomou gosto pelo novo formato.

Muitos fatores podem explicar esse fenômeno do trabalho em casa. A estudante Arielle Reis, 22, precisava levantar dinheiro de alguma maneira que conciliasse com seus horários na faculdade e foi assim que começou a vender seus famosos brigadeiros. Os docinhos fizeram sucesso e aos poucos ela foi ampliando o cardápio: bolos de pote, brownies, bolos para aniversário e a realização de encomendas começaram a surgir no horizonte da moradora do bairro de São Rafael.

Aliado a esse crescimento, Arielle procurou estudar mais sobre empreendedorismo e formalização. Dessa forma abriu o seu CNPJ e nomeou o seu negócio: AriBrigs. Antes da pandemia ela participou de feiras e eventos com sua iniciativa, mas o coronavírus atrapalhou um pouco as coisas.

"Foi algo que foi surgindo de acordo com necessidades e pelas faltas de oportunidades no mercado formal. Vinha dando certo e conseguia fazer minhas coisas, mas a pandemia mudou um pouco disso. Optei por encerrar o meu CNPJ devido à baixa demandas de vendas durante a quarentena, que acabou me fez repensar os gastos e custos do negócio", explica Arielle. Arielle precisou mudar dinâmica do seu negócio (@aribrigs no Instagram) por conta da pandemia (Foto: Acervo Pessoal) Também empreendedora, Arizinha Souza trabalha dentro de casa há 10 anos. É dentro do seu lar que confecciona suas pinturas, brindes, utensílios e -com a pandemia- máscaras personalizadas de onde tira o seu sustento. Assim como Arielle, ela começou a trabalhar no lar porque foi a maneira que encontrou de conciliar com os estudos do nível superior.

Enquanto acompanha achando engraçado a adaptação que outras pessoas de dentro de sua casa precisaram passar por começarem a trabalhar dentro da própria residência, ela fez algumas adaptações em sua rotina de trabalho para manter o negócio de pé.

A principal delas foi que parou de fazer as próprias entregas e precisou encontrar um motoboy para realizar o serviço. Além disso, fez parceria com a loja de uma amiga, que se tornou ponto de retirada das mercadorias. Arizinha Souza trabalha em sua própria casa com pinturas, brindes e esculturas de gesso há 10 anos. O trabalho está disponível no Instagram @arizinhapresentes (Foto: Acervo Pessoal) Analista de dados do IBGE, Mariana Viveiros explica que este é um fenômeno que acontece em todo o país e tem uma forte ligação com a informalidade. Historicamente, o mercado de trabalho baiano absorve muita gente pela informalidade e isso pode ser uma justificativa para esses números."As pessoas trabalham por conta própria seja por opção ou falta dela. Você tem a casa onde você mora e aproveita para levantar dinheiro sem ter nenhum custo extra para trabalhar neste local", explica.Presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos Seccional Bahia (ABRH-BA), Wladimir Martins acredita que o número de pessoas trabalhando em suas próprias casas tende a crescer nos próximos anos como uma consequência da pandemia e aponta que esse aumento registrado pelo IBGE é resultado da crise econômica que o país enfrentou a partir de 2014.

"O recurso disponível era adotar atividades relacionadas com seu ambiente de casa como fazer um bolo, algum alimento, artesanato e coisas que pedem um investimento baixo para iniciar a atividade. A informalidade veio para dentro de casa por conta desse período de crise", explica.

Muitas empresas que foram inicialmente forçadas a adotar o trabalho em sistema de home office acabaram gostando do formato. De acordo com Wladimir Martins, há estudos apontando que a produtividade aumentou em muitas empresas e que por conta disso a tendência é que alguns nichos mantenham a ideia - aumentando ainda mais o número de pessoas trabalhando dentro de casa, ainda que em um outro perfil."Vejo muitas empresas sinalizando que vão adotar parte de suas rotinas em home office porque isso representa redução de custos fixos. Não para uma carga de trabalho completa, mas uma parte do seu quadro. Uma área administrativa, por exemplo, consegue funcionar dessa maneira com toda a tranquilidade", acrescenta.CNPJ O IBGE também registrou que o registro no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) foi um pouco maior entre mulheres do que entre os homens no ano passado. 

Em 2019, enquanto no geral só 11,1% dos trabalhadores por conta própria tinham CNPJ no estado, entre os homens autônomos esse percentual caía a 10,4% (120 mil dos 1,1 milhão que trabalhavam por conta própria tinham o registro), e subia a 12,3% entre as mulheres (77 mil das 621 mil autônomas possuíam CNPJ).

"Creio que as mulheres não têm tanta oportunidade de emprego e ter um CNPJ dá um aumento na credibilidade", diz Arielle. Arizinha Souza concorda com esse argumento e pontua que elas costumam gostar das coisas mais organizadas. Além disso, ter o CNPJ dá oportunidade de participação em feiras e eventos.

De toda maneira, os números da Bahia -para elas e eles- estão abaixo do que é visto no resto do país. No Brasil como um todo, as mulheres também estavam à frente nesse indicador: 19,2% dos homens que trabalhavam por conta própria tinham CNPJ, enquanto entre as mulheres o percentual ia a 21,8%.

Entre os empregadores, a diferença em benefício das mulheres era ainda maior: quase 3 em cada 4 mulheres empregadoras tinham registro no CNPJ (74,7%), enquanto entre os homens a proporção era 10 pontos percentuais menor. No país como um todo, 85,8% das mulheres empregadoras estavam formalizadas no CNPJ, enquanto, entre os homens, 77,9% tinham o registro.