Idosos enfrentam ‘maratona’ e não conseguem se vacinar

Manhã de terça-feira (6) foi confusa com falta de doses e longas filas na capital

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  • Daniel Aloísio

Publicado em 7 de abril de 2021 às 00:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Nara Gentil/CORREIO

Para tentar tomar a tão sonhada primeira dose da vacina da covid, o porteiro desempregado Raimundo Oliveira Santos, 62 anos,  enfrentou uma verdadeira maratona. Morador de Pituaçu, ele acordou às 5h e foi de transporte municipal para a fila do 5º Centro de Saúde Clementino Fraga, nos Barris. “Horas depois, quando a fila já tinha começado a andar, um funcionário veio e disse que não tinha dose suficiente para todo mundo da fila”, lembra. Essa só foi a primeira baixa do dia.  

Ele decidiu ir até a Arena Fonte Nova, mas lá descobriu que eram vacinadas apenas pessoas que estavam dentro dos carros. O local de vacinação funciona no esquema drive-thru. Persistente, Raimundo se dirigiu ao Centro Universitário Jorge Amado (Unijorge) e, quando chegou no local, às 11h, soube do mesmo problema que acontecia no 5º Centro: falta de doses.   Na fila da Unijorge, seu Raimundo tinha a esperança de ser vacinado (Foto: Nara Gentil/CORREIO) A fila de pedestre estava grande e, mais uma vez, um funcionário da prefeitura alertou que nem todo mundo conseguiria ser vacinado. Dessa vez, ele preferiu ficar no local. Após ter tomado chuva, sol e ficar a manhã toda sem comer, quando faltavam apenas três idosos para entrar na universidade, viu o portão ser fechado. Não havia mais doses disponíveis. "Então, eu pedi para um casal que estava na fila dos carros deixar eu entrar com eles, pois ainda tinham doses para o drive-thru", lembra. 

Por volta do meio-dia, quando o carro já tinha entrado na universidade e ele já tinha entregue os documentos de identificação para a funcionária, foi informado que haviam apenas duas doses disponíveis e que alguém teria que ficar sem vacina. “Acabei não sendo imunizado depois disso tudo. Eles fecharam o portão e todos os carros que estavam antes da gente tiveram que ir embora. Eu fiquei desolado, minha sorte foi que um amigo veio de carro me pegar, pois estava muito triste com o que vivi”, desabafa.  

Sem dose  A manhã caótica não foi vivida exclusivamente pelo seu Raimundo. Em todos os postos de vacinação da primeira dose, em Salvador, não havia mais vacinação ao meio-dia. Na Unijorge, as doses chegaram a acabar às 10h30, mas um novo lote foi destinado rapidamente ao local e, às 11h, a vacinação tinha sido retomada até o horário do almoço. Elisabete Rodrigues, 64 anos, foi uma das que estavam na fila e não conseguiram ser vacinadas.  “A fila estava enorme. Eu não imaginava que ia acabar meio-dia, pois tinha muita gente esperando. Peguei chuva, sol, estava abafado, uma loucura e, no meio de tudo isso, fomos informados de que não teria vacina para todo mundo. Aí eu saí da fila, fui lá tentar entender o que estava acontecendo. Fiquei revoltada, pois a vacina é nossa, devia ter mais organização. A fila é um tumulto, a gente tá aglomerado, corre o risco de pegar o vírus”, relata.   A longa fila gerou revolta em dona Elisabete (Foto: Nara Gentil/CORREIO) Esse não foi o primeiro dia que ela tentou, sem sucesso, ser imunizada. “Moro na Praia do Flamengo e no sábado fui para o Centro de Convenções de carro, mas foi a mesma coisa. Eles disseram que as doses tinham acabado. Agora eu resolvi vir de pé, pois achei que ia ser mais tranquilo, mas não adiantou nada”, diz.  

Na segunda-feira (5), dona Zereide Santos, 62 anos, foi até o estádio Barradão, mas perdeu a viagem. Lá estava sendo aplicada apenas a 2ª dose. “Então me mandaram ir ontem na Universidade Católica, mas quando cheguei, umas 9h, descobri que idosos não poderiam tomar a vacina lá”, relata. O jeito foi tentar aventurar na Unijorge, onde ela viveu a mesma experiência. “Eu saí de lá era 13h. Fiquei esperando eles terem compaixão e retornarem à vacinação. Tomei chuva, fiquei com fome, sede, perdi o horário de tomar meu remédio... é complicado”, desabafa.    Como uma atleta, dona Zereide posa para a foto com a mão sobre o peito (Foto: Nara Gentil/CORREIO) Plataforma  No Subúrbio de Salvador, a Unidade de Saúde da Família (USF) de Plataforma, onde estava sendo aplicada a primeira dose da vacina, também teve um dia caótico. Uma técnica de enfermagem que não quis se identificar disse que a quantidade de doses enviadas incialmente não tinha sido suficiente para todo mundo que estava na fila. “Quando isso acontece, normalmente, eles mandam mais doses durante o dia, mas hoje isso não aconteceu. É complicado, pois é a gente que tem que informar para as pessoas que não vai ter vacina e aí a situação fica muito chata”, diz.  

Um rapaz que mora na frente da USF disse que as filas no local são comuns, principalmente no horário da manhã. Como ele tem 62 anos, poderia ter sido vacinado hoje, mas não conseguiu por causa do tamanho da fila. “Às 4h já começa a aparecer gente que quer tomar essa vacina. Eu como moro na frente, prefiro não enfrentar isso, espero a situação melhorar. Mas do jeito que tá não vai ter melhora. É muito desrespeito com o povo”, reclama.  

O CORREIO esteve no local por volta das 13h e mesmo com a vacinação já encerrada e a fila dispersada, idosos chegavam ao local na esperança de conseguir alguma dose. Dalva dos Santos, 66 anos, foi uma dessas pessoas. “Eu tenho que tomar essa vacina já tem tempo, mas só hoje que eu pude vir. Quando cheguei, disseram que tinha acabado. Antes daqui fui em outro local que só aplicava 2ª dose. Nessa história eu já gastei R$ 30 de uber e esse dinheiro vai fazer muita falta”, apontou.  

Retorno Em nota, a Prefeitura de Salvador informou que a aplicação da primeira dose da vacina contra a covid-19 será retomada nesta quarta-feira (7), das 8h às 16h, para idosos com idade igual ou superior a 62 anos nascidos entre 7 de abril de 1958 e janeiro de 1959. "Terão acesso também ao imunizante os agentes de segurança pública, trabalhadores da saúde e autônomos, pacientes em hemodiálise, além do Vacina Express", disseram. 

A estratégia será realizada após a Secretaria Estadual da Saúde (Sesab) repassar 44 mil unidades do imunizante para aplicação da segunda dose sendo que, desse total, 10 mil serão utilizadas como primeira dose. A reposição será feita após o Ministério da Saúde enviar novo lote nos próximos dias. O secretário municipal, Leo Prates, afirma que as segundas doses estão garantidas para toda a população que já foi imunizada e não há motivos para preocupação.

* Com oirientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro..