Lockdown em Candeias: multa pra quem descumprir isolamento é de R$ 250

CORREIO visita a cidade no primeiro dia de lockdown e flagra pessoas na rua sem máscara e até bebendo

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  • Daniel Aloísio

Publicado em 12 de junho de 2020 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Naldo Freitas/CORREIO

Parecia uma cidade fantasma, deserta. Se você olhasse com mais atenção, iria perceber uma pessoa ou outra descumprindo o decreto que instituiu o lockdown em Candeias, que começou a valer na quinta-feira (11) e vai até às 5h da próxima terça-feira (16). Na lei, só é permitido circular com máscara e por motivo essencial, como comprar alimentos ou medicamentos, comparecer ou acompanhar paciente em uma unidade de saúde e receber o auxílio emergencial. 

Todas essas medidas foram tomadas para frear o avanço da covid-19 na cidade que, apenas no mês de junho, registrou 177 casos da doença. Só nas últimas 24h, segundo a Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab), foram 44 novos registros. O número total de infectados chega a 345. 

Apesar do cenário, o barbeiro Nilton Conceição, 43 anos, estava na calçada com amigos para beber algumas cervejas. “Meu salão de beleza estava funcionando nessa pandemia. Hoje (quinta-feira), quando fui abrir, o pessoal da prefeitura disse que não podia funcionar”, afirmou. Chateado, Nilton reuniu mais três amigos para “afogar as mágoas na bebida”, como ele mesmo explicou.  

Segundo o Diário Oficial do Município, se flagrado pela fiscalização, o barbeiro vai levar uma advertência. Com reincidência, haverá multa diária de R$ 250. Já seu salão de beleza recebeu a advertência e foi fechado. Caso Nilton resolva abri-lo novamente durante o lockdown, a multa diária é de R$ 10 mil, a ser duplicada por reincidência. No caso dos estabelecimentos de grande porte, essa multa sobe para R$ 50 mil, também com a possibilidade de duplicação. 

O prefeito Dr. Pitágoras (PP) falou sobre a importância deste tipo de medida mais rigorosa. “A gente já tinha decretado um toque de recolher antes, que inclusive foi ampliado, além de aderir ao feriadão antecipado do governo do estado, mas os números não paravam de crescer”, lamentou.  

Médico, Pitágoras contraiu o coronavírus e sentiu na pele o perigo da doença, embora seu caso não tenha evoluído para um quadro grave de saúde. “Graças a Deus que os sintomas foram leves em mim, mas a gente sabe que em outras pessoas são muito graves, chegando até a morte”.  

Localizada na Região Metropolitana de Salvador (RMS) e a 50 quilômetros da capital, Candeias tem uma população de cerca de 90 mil pessoas. A cidade não possui leito público de Unidade de Terapia Intensiva (UTI).  

“Temos duas unidades de saúde que se enquadram como pronto atendimento para covid-19. Temos inclusive respirador, caso o paciente precise de ventilação mecânica. Mas em casos graves, que precise de um leito de UTI, fazemos a transferência para unidades de referências em Salvador”, explicou o superintendente de gestão em saúde, Marcelo Cerqueira.   Barreira montada na BA-522 (Foto: Naldo Freitas/CORREIO) Dentro da cidade, puderam funcionar serviços de urgência e emergência, inclusive veterinárias, farmácias, agências da Caixa para pagamento do auxílio emergencial e outros programas sociais, postos de gasolina, funerárias, mercadinhos de bairros situados fora do centro comercial, padarias (entre 6h e 11h), além de determinadas industrias e serviços, como obras públicas.  

Até supermercados localizados no centro comercial de Candeias tiveram que ser fechados e funcionar no esquema de delivery, somente. Sem atender as exigências do decreto, o Bompreço, que fica na frente da rodoviária da cidade, foi interditado. 

Segundo assessoria de comunicação do município, o objetivo também dessas medidas foi evitar o recebimento diário de pessoas de outras cidades da região, que iam fazer compras no centro comercial de Candeias. “Mesmo na pandemia, esse fluxo continuou intenso. Agora, não entra mais transporte intermunicipal em Candeias e veículos dessas cidades”, disseram.    A frente da rodoviária de Candeias estava vazia (Foto: Naldo Freitas/CORREIO) “Realmente, a circulação no centro da cidade estava alta e as pessoas não respeitavam o toque de recolher imposto pelo município”, disse o barbeiro Nilton Conceição. O radialista Tailan Henrique destacou que esse fluxo aumentou nessa semana, pois as pessoas chegaram a entender erroneamente que não ia ter mercado aberto na cidade, durante o lockdown. “Acho que houve uma falha de comunicação da prefeitura”, disse.  

Tailan estava justamente fazendo a sua compra semanal no Mercado Carro Cheio, localizado no bairro Santo Antônio, o mais afetado pelo coronavírus, segundo a prefeitura. Ele não é morador do local, mas esteve lá, pois os mercados do seu bairro foram considerados como pertencentes do centro comercial e tiveram que fechar. “Acho que ainda tem muita gente na rua, levando a situação como se fosse a de um feriado”, disse.   Máscara e álcool em gel são itens obrigatórios exigidos pela Prefeitura para os mercados (Foto: Naldo Freitas/CORREIO)  O CORREIO flagrou ainda pessoas sem máscara circulando na cidade e um feirante, que foi advertido pela fiscalização da prefeitura e teve que voltar para casa. O barbeiro Nilton Conceição que bebia a cerveja na porta de casa usava a máscara no pescoço. “Assim como o prefeito, eu já tive o vírus e estou imune”, afirmou. Cientistas dizem que ainda não é possível saber com certeza se a infecção por coronavírus confere imunidade, mas a experiência indica que é raro ser infectado duas vezes.   

Outras cidades 

Quinta-feira também começou o lockdown em Uruçuca, no sul baiano, a 337 quilômetros da capital. A medida vai impor a suspensão total das atividades não essenciais por cinco dias, indo, portanto, até segunda-feira. Com cerca de 20 mil habitantes, Uruçuca já conta com 160 casos confirmados de covid-19, de acordo com a Sesab. Com isso, a circulação de pessoas ficará proibida na cidade e no povoado de Serra Grande. 

Durante esse período de cinco dias, a barreira sanitária do município proibirá até a circulação de moradores que desejem sair ou entrar na cidade para serviços não essenciais.  A vigilância sanitária e a secretaria de Administração e Finanças irão multar quem insistir em descumprir a lei. Conforme o decreto, as pessoas podem receber desde advertência, suspensão de alvarás de funcionamento até multas diárias que variam de R$ 150 (pessoa física) a R$ 15 mil (pessoa jurídica). 

Já Monte Santo, no nordeste da Bahia, a 388 quilômetros de Salvador, iniciará nesta sexta-feira (12) um bloqueio total de atividades, o chamado lockdown. As restrições terão duração de cinco dias, indo até a próxima terça-feira (16). A prefeitura do município decidiu fechar até as farmácias, que só poderão funcionar em sistema delivery. Com cerca de 50 mil habitantes, Monte Santo conta com 15 casos confirmados de covid-19, segundo o boletim epidemiológico estadual desta quarta-feira. 

O decreto de lockdown determina a suspensão total das atividades comerciais para conter o avanço da nova doença na cidade. O toque de recolher foi instituído e é proibida a circulação de pessoas durante o horário das 20h às 5h do dia seguinte. A gestão municipal também decidiu fechar os serviços de auto-atendimento de agências bancárias e suspendeu a realização da feira livre na cidade e nos povoados. 

Só poderão funcionar postos de combustíveis e serviços de atendimento de saúde, como as Unidades Básicas de Saúde (UBS). As farmácias terão que fechar e colocar contato telefônico na fachada do estabelecimento para a realização de pedidos. A realização de cultos, missas ou eventos religiosos será proibida e os espaços religiosos devem manter as portas fechadas. 

O não cumprimento das medidas estabelecidas pode render em penalidades como perda de alvará e multa no valor de R$ 1.000. A fiscalização nas ruas será feita pelo setor de Tributos, Guarda Municipal, Vigilância Sanitária e Vigilância Epidemiológica, que, pelo decreto, têm poder para entrar em qualquer estabelecimento comercial, residencial e similares para investigação e adoção de medidas de combate à covid-19. Se identificada irregularidade, os agentes ainda podem solicitar o apoio da Polícia Militar. 

* Com orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro