Marinha e a Universidade do Mar

O oceano é vital para a economia mundial. Três bilhões de pessoas no mundo vivem hoje em zonas costeiras

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  • Eduardo Athayde

Publicado em 15 de março de 2021 às 18:23

- Atualizado há um ano

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Reprodução Quando a ONU declarou estrategicamente os anos 2021 a 2030 como Década dos Oceanos, visou chamar atenção para as tendências internacionais que vêm sendo observadas sobre a corrida para o mar, a chamada Economia Azul, que acelera rapidamente em todo o mundo. A economia oceânica é definida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) como a soma das atividades econômicas das indústrias baseadas no oceano, juntamente com os ativos, bens e serviços fornecidos pelos ecossistemas marinhos.

De acordo com o Banco Mundial, a economia azul é o "uso sustentável dos recursos oceânicos para o crescimento econômico, melhores meios de subsistência e empregos, preservando a saúde do ecossistema oceânico", a Comissão Europeia, por sua vez, define como "todas as atividades econômicas relacionadas aos oceanos, mares e costas".

O oceano é vital para a economia mundial. Três bilhões de pessoas no mundo vivem hoje em zonas costeiras, treze das maiores megametrópoles são costeiras e mais de 90% do comércio global utiliza rotas marítimas como fonte de empregos para milhões de pessoas nas atividades portuárias, na aquicultura marinha, pesca, processamento de peixes, nas atividades eólicas offshore. A demanda de longo prazo por fontes marinhas de alimentos, energia, minerais e atividades de lazer cresce junto com a população global enquanto se multiplicam os ecossistemas de startups. 

Uma das quatro maiores empresas de auditoria do mundo, a Deloitte, alinhada a governanças socioambientais (ESG), estimou no seu “Deloitte Review”, o montante de US$ 19 bilhões (R$ 105 bilhões) por ano como custos anuais mundiais associados à poluição marinha por plástico - apenas para setores econômicos selecionados como gastos do governo para limpezas costeiras e perdas econômicas na pesca, aquicultura e turismo, em 2018 - sem incluir o impacto econômico para o ecossistema marinho, saúde pública e todos os setores da economia azul.

Comparativamente, o orçamento total do Ministério da Defesa do Brasil (Exército, Marinha e Aeronáutica) previsto para 2021, é de R$ 110,7 bilhões, incluídas as atividades da Marinha na Amazônia Azul, uma rica Zona Econômica Exclusiva de 5.7 milhões de km² contígua à toda costa brasileira, mais da metade da nossa massa terrestre, com as riquezas biológicas da lâmina d’água, solo e subsolo, incluídos o pré-sal com 85% do petróleo nacional, 75% do gás natural, e metais como níquel, cobre, cobalto e manganês, além de 45% do pescado produzido no país. Nas rotas marítimas da ‘BR da Amazônia Azul’ - indevidamente chamada de BR do Mar - são movimentados mais de 95% do comércio exterior brasileiro."O conhecimento, mais que a força, determina a base para a razão" - Almirante de Esquadra Ilques Barbosa Júnior, Comandante da Marinha.Na perspectiva da Economia Azul que avança na geração de pesquisas e conhecimentos, a Marinha do Brasil, responsável pelo Plano Setorial para os Recursos do Mar [PNRM], investimentos em Ciências do Mar [cienciasdomarbrasil.furg.br] e na Mentalidade Marítima que busca desenvolver o conhecimento da sociedade brasileira sobre o mar, seus recursos e sua importância para o Brasil - é uma Universidade do Mar - colocada à serviço da sociedade com pessoal preparado para articulações nacionais e internacionais onde a inteligência artificial, sensores, robótica, novos materiais, big data, processamento de imagem e algoritmos avançados transformam a bioprospecção, o uso e o mapeamento do mar.

O PNRM, com vigência de 1º de janeiro de 2020 a 31 de dezembro de 2023, que inova focando no desenvolvimento sustentável e na economia azul, planejamento marinho e cultura oceânica, e na sistematização das atividades de pesquisa para a exploração sustentável, monitoramento da Amazônia Azul e o gerenciamento costeiro; pode valer-se da realidade aumentada (AR) para ajudar a atingir seus objetivos aportando vantagens competitivas. "O conhecimento, mais que a força, determina a base para a razão", destaca o Almirante de Esquadra Ilques Barbosa Júnior, Comandante da Marinha.

Na crescente corrida internacional azul, o Brasil, com 17 estados costeiros, tem a rica cadeia produtiva do mar pouco desenvolvida e ainda não despertou para importância da formação acadêmica superior específica para economia do mar, como acontece no resto do mundo. O Grupo Técnico Formação de Recursos Humanos em Ciências do Mar (PPG-MAR), coordenado pelo Ministério da Educação (MEC), tendo em vista a complexidade e as oportunidades dos desafios, precisa ser ampliado para equiparar o Brasil aos parceiros internacionais que visam os sustentáveis novos lucros da economia do mar.

Nos EUA, onde estatísticas abundam, dados revelam que um entre cada seis empregos - cerca de 28 milhões de postos de trabalho - é gerado pela economia do mar e áreas costeiras americanas são o destino de 190 milhões de turistas anualmente. No Brasil, com 84% da população vivendo em áreas costeiras, a economia do mar que produz cerca de 20% do PIB nacional precisa ser incentivada para andar pari passu com iniciativas das nações alinhadas com a “Década dos Oceanos”.

Internacionalmente, a World Maritime University [wmu.se], sediada em Malmo, Suécia, é um centro de excelência em educação marítima e pesquisa com plano de negócios alinhados com a Agenda 2030 da Internacional Maritime Organization (imo.org). Nos EUA, o National Oceanic and Atmospheric Administration - NOAA [noaa.gov] divulgou o Plano Estratégico de Economia Azul para 2021-2025, traçando roteiro com novas maneiras de promover a Economia Azul que dobrará de valor para US$ 3 trilhões na próxima década. Em Portugal, o Centro de Ciências do Mar [mare-centre.pt], tem competências técnicas e científicas focados em ecossistemas aquáticos, incluindo estuários, ecossistemas marinhos costeiros e oceânicos. Na China, a Ocean University of China (eweb.ouc.edu.cn) é uma das principais universidades com graduação e pós-graduação em economia, engenharia, pesca, farmacêutica, gestão, direito, história e arte. Algumas entre as várias potenciais parceiras das instituições brasileiras.

No Brasil, a Empresa Gerencial de Projetos Navais – Engepron, empresa pública vinculada à Marinha do Brasil, tem como finalidades promover a indústria naval nacional, gerenciar projetos e serviços oceanográficos, apoio logístico e comercialização de produtos e serviços da indústria da defesa nacional. A Amazônia Azul Tecnologias de Defesa S.A. (Amazul), também vinculada ao Ministério da Defesa, tem o objetivo de desenvolver atividades do Programa Nuclear da Marinha (PNM), Programa de Desenvolvimento de Submarinos (PROSUB) e do Programa Nuclear Brasileiro (PNB), usando a tecnologia nuclear para melhorar a qualidade de vida das pessoas e garantir a segurança energética com energia limpa.

Neste novo ciclo tecnológico que empurra a pesquisa científica e empresarial para a diversificação de suas fontes e áreas de atuação, outras articulações empreendidas localmente visam acelerar focos, pesquisas e investimentos no mar. A bicentenária Associação Comercial da Bahia (ACB), fundada em 1811, parceira secular alinhada com a Marinha, estimulando a ação empresarial para o desenvolvimento do patrimônio marítimo nacional, declarou estrategicamente, em 2014, a Baía de Todos os Santos como Capital da Amazônia Azul, visando dar visibilidade internacional a área e atrair investimentos. Por sua vez, a Marinha instalou o Escritório Técnico de Ciência e Tecnologia, no Senai Cimatec, em Salvador, um dos mais destacados centros de pesquisa e ensino do país, plantando mais uma semente da Universidade do Mar.

Eduardo Athayde é diretor do WWI Brasil. [email protected]