Mundo BANI compromete saúde no trabalho; entenda como funciona

Autogentileza e ações humanizadas ajudam a reforçar a saúde emocional do colaborador e garantem desempenho positivo

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  • Carmen Vasconcelos

Publicado em 19 de janeiro de 2022 às 05:26

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Shutterstock/reprodução

Uma pesquisa realizada pela Ipsos para o Fórum Econômico Mundial mostrou que 53% dos brasileiros relatam piora na saúde mental no último ano. O dado dialoga com um levantamento da Associação Brasileira de Psiquiatria que aponta um aumento de 25% das consultas  psiquiátricas no período e mostram como as pessoas tem tido dificuldade em sair do modelo conhecido como VUCA, acrônimo das palavras inglesas Volatility, Uncertainty, Complexity e Ambiguity, surgido nos anos 90, para o chamado modelo BANI, acrônimo que faz referências às palavras inglesas Brittle, Anxious, Nonlinear and Incomprehensible, reflexo da pandemia de Covid-19, que deixou o mundo um ambiente frágil, ansioso, não-linear e totalmente incompreensível. 

Mentora em Desenvolvimento Humano e Organizacional, Aila Cardial destaca que, como o universo do trabalho é um dos aspectos mais relevantes da convivência em sociedade, as transformações que ocorrem no mundo VUCA/BANI são vivenciadas constantemente nesse ambiente. 

“No mundo corporativo, algumas variáveis interferem diretamente nas relações e rotina. Mudanças bruscas e constantes que dificultam o planejamento a longo prazo, decisões rápidas, aumento da competitividade, evolução da tecnologia, atualização de políticas e processos, ambiente com várias gerações convivendo o tempo todo acabam contribuindo”, diz.

Aila lembra que as incertezas que a pandemia desencadeou ampliou a fragilidade, carregando a ansiedade junto e interferindo diretamente na tomada de decisão. “Outro ponto relacionado ao que é incompreensível, é a velocidade com que as informações chegam em excesso dificultando a solução de problemas e tomada de decisões assertivas”, reflete.

Produtividade em risco

O professor do curso de Psicologia da Unijorge Claudio Seal diz que o impacto do BANI no ambiente de trabalho se dá, primariamente, na produtividade desse trabalhador, na dificuldade de render normalmente. “Além disso, vão aumentar as faltas ao trabalho em decorrência desses efeitos emocionais, desses efeitos cognitivos, e claro, físicos sobre esse trabalhador”, avalia.  Claudio Seal destaca como a BANI pode desencadear doenças psicossomáticas e atrapalhar a vida produtiva nas organizações (Foto: Divulgação) Ele lembra que nessas situações são comuns o surgimento das doenças chamadas psicossomáticas, como hipertensão, problemas gastrointestinais, diabetes, problemas imunológicos, dores. “Se a pessoa está num estado emocional muito afetado e vivencia o dia a dia do trabalho com bastante ansiedade e angústia, com sofrimento emocional, isso vai refletir na relação com os colegas”, esclarece. 

O psicólogo salienta que os profissionais dentro desse contexto apresentam uma tendência ao isolamento, a um comportamento mais irritado, aumentando os conflitos e dificuldades de interação, principalmente, se estiver trabalhando no ambiente que necessita de uma Interação em equipe para tomada de decisões. Para Claudio, todas as questões impactam de maneira negativa, deletéria à empresa como um todo, levando a pouca motivação no trabalho de uma forma geral. 

Saúde emocional

A mestre em Psicologia Positiva Adriana Drulla acredita que o modelo BANI é o oposto do que o ser humano necessita para ter saúde emocional e resiliência. “Durante a pandemia, 75% das empresas desenvolveram ações de apoio psicológico aos funcionários, segundo a pesquisa Gestão de Pessoas na Crise de Covid-19 divulgada pela Fundação Instituto de Administração (FIA)”, explica a especialista. 

Para Adriana, como as pessoas passam grande parte do dia no trabalho, e frequentemente desempenham múltiplas funções em casa, o profissional não tem tempo para cuidar de si. “Em vez de recriminar o colaborador que tira um dia na semana para fazer terapia, as organizações deveriam incentivar este comportamento, até custeando parte do tratamento terapêutico, por exemplo”, defende. 

Para a psicóloga, os colaboradores precisam ser recompensados pelo movimento de construírem recursos internos e externos para enfrentarem o mundo com mais resiliência. “Vale lembrar que a depressão e ansiedade são as doenças que mais frequentemente causam o afastamento do trabalho”, reforça o posicionamento.

Autogentileza

Na opinião de Adriana, os efeitos danosos da BANI podem ser neutralizados com o exercício da autocompaixão. Para reforçar a tese, a psicóloga cita a pesquisadora que é referência no tema, Kristin Neff, e reforça que a autocompaixão está operacionalizada em três elementos: mindfulness, humanidade compartilhada e autogentileza. Adriana Drulla destaca o poder da autogentileza para superar os efeitos danosos do mundo BANI na vida do indivíduo (Foto: Divulgação)  “Nos momentos difíceis, faça uma pausa, e passe mentalmente por cada um deles. Primeiro investigue sua experiência com mindfulness, ou seja, com curiosidade e abertura em vez de negar o sofrimento ou lamentar excessivamente”, sugere.  A dica seguinte é considerar que o sofrimento é inerente à condição humana. “Se você está nervoso, triste ou ansioso, não significa que tenha algo de errado com você. É natural operarmos no nosso sistema de ameaça quando nos sentimos em perigo”, diz, afirmando que, quando se entende que as dificuldades são parte da experiência comum e não provas de incompetência ou fraqueza, fica mais fácil acolher o que se sente com o terceiro elemento da autocompaixão, a autogentileza.

“Para nos sentirmos seguros, precisamos sentir que somos bons o suficiente e que temos apoio. A autocompaixão é sobre sermos apoio para nós mesmos. Seja para o nosso crescimento pessoal ou profissional, é preciso conectarmos com o nosso valor interno e termos mais autocompaixão”.

A especialista destaca que autogentileza é diferente do conceito de autoestima, que é o sentimento positivo quando o indivíduo se avalia bem, quando se compara com o mundo e se  sente competentes. “É muito fácil sentir-se valioso quando tudo vai bem. Mas a resiliência emocional depende de nos sentirmos valiosos quando tudo vai mal. A autocompaixão é o acolhimento que podemos dar a nós mesmos quando nos deparamos com a dificuldade e com as nossas limitações”, finaliza.

Passos para a saúde emocional no trabalho

1.    Desenvolver uma liderança humanizada;

2.    Promover um ambiente mais leve com menos pressão contribui bastante para a qualidade de vida dos colaboradores;

3.    Promover a qualidade de vida aos funcionários através de horário flexível, encontros informais como happy hour e cafés, capacitações também contribuem pra minimizar as consequências negativas do mundo BANI;

4.    Efeitos danosos da BANI podem sem combatidos com resiliência, flexibilidade e inteligência emocional, intuição, pensamento crítico, empatia e compaixão;

5.    As empresas colaboram com a saúde emocional dos colaboradores quando investem em uma  comunicação assertiva com transparência através do desenvolvimento da comunicação não violenta; 

6.    Desenvolver estratégias criativas para resolução de problemas através de metodologias ágeis e design thinking é essencial. A autogestão é super importante, principalmente na realidade do home office .