Pouco menos de 24h antes de começar o desfile do Afro Fashion Day na Estação CCR de Metrô Campo da Pólvora, Oda Taylor (@oda_tlr, no Instagram) dava duro atendendo clientes no Bar Velho Espanha, nos Barris, onde trabalhava como garçonete para garantir uma renda extra. Entre um atendimento e outro, a garota de 22 anos, natural de Cairu, pensava no quanto a vida dela mudou nos últimos anos. E ainda iria mudar mais: no outro dia, desfilava na passarela mais negra do Brasil. Um mês depois, estreou na semana de moda mais famosa do país, o São Paulo Fashion Week.
Filha de Cairu, multiartista, negra e travesti. É assim que Oda se define para o mundo, enquanto aproveita para descobrir a cada dia. “Vai saber o que Oda tem que eu ainda não sei”, disse sorridente em entrevista ao CORREIO. A primeira manifestação artística que a tocou foi a música: num trabalho de escola, cantou Milton Nascimento e sentiu que a partir dali tudo era diferente. “Às vezes eu sinto que nasci ali, não lembro muito de minha infância, era uma criança muito tímida e também passei por situações que acho que bloquearam essa fase de minha vida”, contou.
Foi a música quem fez com que ela desejasse expandir os horizontes. Saiu de Cairu e foi para Valença estudar no Instituto Federal, onde concluiu o Ensino Médio e fez curso técnico. Sentiu que precisava de mais e, em 2019, veio para Salvador estudar na Escola de Belas Artes, onde cursa Desenho e Plástica, na Universidade Federal da Bahia (Ufba). Foram momentos difíceis, inclusive internamente: Oda se identificava como um homem gay, mas ao mesmo tempo gostava de ficar com meninas. Por ser, na época, um rapaz magro, com voz fina e jeito ‘afeminado’, era empurrada para uma caixinha, mas sentia que ainda não era aquilo que te contemplava.
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Além do Afro Fashion Day, Oda também desfilou na São Paulo Fashion Week deste ano (Foto: Nara Gentil/CORREIO) |
Pensou em desistir da moda porque, após chegar a uma agência em Salvador, comprou books, cursos e no final das contas nunca era chamada para nada: só um perfil de pessoas era chamada e eram todas brancas. Uma seletiva do Afro Fashion Day foi o que começou a mudar isso. Ao ver a quantidade de pessoas negras no meio da rua sendo aplaudidas, acreditou que aquilo poderia mudar. E deu certo.
Foi encontrada pelo scouter Vinny Vasconcellus e desfilou no Afro Fashion Day deste ano: a sua primeira vez desfilando, inclusive. A modelo integrou o bloco Black Panther, que abriu o desfile e teve inspirações no Partido dos Panteras Negras, símbolo na luta antirracista até os dias atuais.
"Sou travesti, preta, já morei numa casa de acolhimento para pessoas LGBTQIA+ em Salvador, chamada Casa Aurora. Foi lá onde comecei a me entender como uma travesti e graças às pessoas que me acolheram lá eu criei embasamento para desmistificar esse nome, nos tirando desse lugar de marginalização. Essa é a minha identidade, não é algo ruim", afirmou.
Menos de um mês depois e ela desfilou para o público pela primeira vez. E na semana de moda mais importante do Brasil. Oda esteve na passarela representando A la garçone, Rocio Canvas, Handred Studio, Walerio, Silverio, Apartamento 03 e Isaac Silva. Para desfilar, também fez a sua primeira viagem de avião - fato que ilustra bem até onde Oda Taylor quer chegar: no céu, nas nuvens ou onde ela bem entender.
O Afro Fashion Day é um projeto do jornal Correio com o patrocínio do Grupo Boticário, Hapvida, TikTok, com apoio Institucional da Prefeitura Municipal de Salvador, Sebrae, apoio do Shopping Barra, Laboratório CLAB, CCR Metrô, Vizzano, Clube Melissa e Suzano.