O livro perdido de Jorge Amado

Linha Fina Lorem ipsum dolor sit amet consectetur adipisicing elit. Dolorum ipsa voluptatum enim voluptatem dignissimos.

  • Foto do(a) author(a) Nelson Cadena
  • Nelson Cadena

Publicado em 16 de julho de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: .

Está faltando um livro no catálogo da Fundação Casa de Jorge Amado. Não consta também da relação de obras do autor, na Wikipedia, e nem de nenhuma página da internet, das que elencam as obras de Jorge. Estranho esse sumiço de um livro que teve na época (1933) uma edição de 3 mil exemplares. Sobrou um, pelo menos, em péssimo estado de conservação e sem a capa; semana passada estava à venda no Mercado Livre por R$ 1.500,00. O livro tem o título “Descoberta do Mundo”, 58 páginas, edição de Maia & Schmidt, sucessora da Livraria Schmidt, fundada em 1930 pelo poeta Augusto Frederico Schmidt.

A obra, voltada para o público infantil, foi escrita a quatro mãos, por Jorge e sua primeira esposa, Mathilde Garcia Rosa, ilustrado por Tomas Santa Rosa __ morou na Bahia, em 1931, antes de fixar residência definitiva no Rio de Janeiro__ que fez fama como cenógrafo e ilustrador de livros de grandes autores brasileiros. Jorge Amado tinha alguma afinidade com a literatura infantil: foi leitor assíduo da revista Tico-Tico, sabemos disso pelas cartas que aos 10 anos de idade enviava para a publicação, resolvendo as charadas; seu nome consta da relação de garotos que concorriam a prêmios por ter solucionado os enigmas. Enviou uma carta, também, com votos de boas festas (1922) para a revista O Malho, da mesma editora.

O casal Amado recebeu 200 mil reis de adiantamento pelos direitos autorais da obra e mais 800 mil reis em parcelas, quitadas até o Natal de 1933. A editora publicou anúncios nos jornais da capital, o que nos permite ter uma ideia da capa do livro, ilustrada com o desenho de uma baleia, em cujo dorso navegam três dos personagens: o galo Esporão Grande, o gato Zê Pinho e um garoto que imagino seja o Tenente.

O crítico Valdemar Cavalcanti, no Boletim do Ariel, taxou a narrativa como “admiravelmente tecida que se realizou mediocremente”. Afirma, porém, ser “das melhores páginas que tenho lido em volumes para crianças”. Faz a ressalva em torno do uso de “pretéritos mais que perfeitos ... um palavreado sem força de impressionar a retentiva infantil”. O mesmo Cavalcanti, em artigo publicado no Diário de Notícias, definiu a narrativa como “uma história em pregas soltas, de um lirismo de invenção raro, no gênero, entre nós”.

Mathilde e Jorge integravam a redação da famosa revista Rio Magazine, junto com Arthur Ramos, Gilberto Amado, Passos Guimarães, Agripino Griecco, Álvaro Moreira, dentre outros. Santa Rosa era o ilustrador. Não conhecemos nenhuma crônica, ou artigo do casal. Lamentavelmente, não existem em lugar nenhum (Biblioteca Nacional, IHGB, Arquivo Nacional) coleções do período 1933-1944. Neste último ano, a revista foi adquirida por Alfredo Thomé, teve seu auge e prestígio na década de 1950, interrompeu a circulação em 1964. Voltou no final da década, já combalida.

Quando a “Descoberta do Mundo” foi escrito, Jorge Amado já tinha publicado O País do Carnaval (1931) e abortado a ideia de publicar “Ruy Nº 2”; chegou a ser enviado à editora que adiantou para um jornal carioca um trecho do primeiro capítulo. Jorge e Mathilde dedicaram o livro infantil a Margarida, Lolita, Joelson, James e Luciane. Joelson e James eram irmãos de Jorge (tinham 13 e 10 anos na época). Quem eram os outros? Não sabemos.

*Nelson Cadena é publicitário e jornalista, escreve às quintas-feiras