O Rio e as oportunidades perdidas

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  • Waldeck Ornelas

Publicado em 26 de maio de 2022 às 05:28

- Atualizado há um ano

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Diante de mim, relendo, um exemplar de Trilhas para o Rio, um esperançoso e entusiástico roteiro para o desenvolvimento da cidade maravilhosa, do sociólogo André Urani, precocemente desaparecido. Produzido em 2008, onde via o Rio como uma “baleia encalhada” face às potencialidades que apresenta vis-à-vis a falta de iniciativas com força suficiente para fazê-la nadar.  

De fato. O Rio foi a única cidade do mundo capaz de desperdiçar a oportunidade de projetar-se a partir da realização de uma Olímpiada. Antes, cidades como Munique, Montreal, Seul, Barcelona e Atlanta tornaram-se cidades globais a partir da realização dos jogos olímpicos. Maior destino turístico internacional do Brasil e da América Latina, quiçá do Hemisfério Sul, a capital fluminense – cidade brasileira mais conhecida no exterior – degradou-se rapidamente, ao invés de melhorar após as Olímpiadas de 2016, com graves prejuizos para a própria imagem do país. 

Adicionalmente, premiados com elevados royalties do petróleo, o estado do Rio e vários de seus municípios viram desabar as receitas ante gastos permanentes elevados, contratados por 35 anos, no caso de pessoal, com base em uma receita instável. Esta lição indica que se impõe incorporar como aperfeiçoamento à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), a exclusão das receitas oriundas de royalties de qualquer natureza do cálculo da receita corrente liquida (RCL). Assim, os gastos de custeio – especialmente a conta de pessoal – deixariam de ser usuários de uma “folga” orçamentária instável e, por definição, temporária, prevenindo desastres como o que hoje em se verifica, com o estado do Rio dependurado no programa federal de recuperação fiscal. 

Adicionalmente, em relação ao petróleo – e isto vale também para a escala nacional – é preciso ter em conta os efeitos das políticas de descarbonização, que crescem na medida em que avançam as ações de combate aos impactos das mudanças climáticas, a indicar que o desenvolvimento brasileiro – e em especial o do Rio de Janeiro – não pode mais se apoiar na riqueza gerada pelos combustíveis fósseis, cuja data de vencimento já está fixada pelos acordos internacionais; cujo abandono está visível na reconversão dos processos produtivos; e, finalmente, precificado pela adoção das práticas ESG nas empresas.

Hoje, lamentavelmente, o Rio constitui um exemplo e uma referência negativa para o Brasil e o mundo sobre o que não deve ser feito quando a oportunidade bate à porta. Vítima da escassez de estadistas entre os seus políticos, da carência de planejamento de médio e longo prazo, da falta de uma estratégia objetiva de desenvolvimento. É case para estudo nas universidades, daqui e de fora.

Pior é que, entre nós, isto ocorre e se repete, em maior ou menor escala, a cada dia, como quando o Congresso Nacional e o Poder Executivo – e agora também o Judiciário – não sabem fazer a separação entre os interesses de governos e os interesses de Estado, deixando, por exemplo, de aprovar as reformas estruturais necessárias e indispensáveis para que o país possa vislumbrar o seu futuro; de tratar a Educação com a seriedade e o respeito que ela precisa e merece; de tomarem decisões estratégicas para o médio e longo prazos, ao invés de focarem em resultados imediatos, mas insustentáveis, comprometendo o presente e hipotecando o futuro.  

O Rio tornou-se, infelizmente, um laboratório de oportunidades perdidas e experiências negativas que precisa servir de aprendizado para todos – nacional, regional e localmente – fruto de uma situação que se deriva da falta de abertura de novas trilhas – como propunha André Urani – em favor do imediatismo e da mesmice de sempre, apoiada na política miúda da corrupção e do “baixo clero”, denominação que, aliás, precisa ser resgatada, para possibilitar o descortínio de um país melhor para todos os brasileiros.

Waldeck Ornélas é especialista em planejamento urbano-regional e autor de Cidades e Municípios: gestão e planejamento.