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Da Redação
Publicado em 29 de outubro de 2019 às 05:00
- Atualizado há um ano
Certa feita, um amigo sergipano mostrava-me fotografias feitas por ele no litoral de Salvador. Eram fotografias impactantes, em preto e branco, recurso utilizado pelos fotógrafos para nos imprimir uma maior carga interpretativa e possibilitar ver o que uma imagem colorida ofusca.
A partir daquele dia, percebi que a beleza das praias do nordeste brasileiro que estávamos acostumados a ver era composta, principalmente, por gente. O azul, com seus mais variados tons que nos encantam de Maceió a Jeri, de Morro de São Paulo a Pipa, também tem sua versão P&B. Quando uma foto nos é apresentada em preto e branco surgem as gentes, as pessoas com alma, o que Sebastião Salgado fez ao fotografar Serra Pelada na década de 80.
O derramamento de óleo no litoral brasileiro tem feito o mundo perceber que existem pessoas ao redor da beleza do mar. Essa capacidade que o preto e banco oferta como ponto de inflexão nos faz lembrar que a mancha de óleo, além de poluir e tirar a beleza do mar, ela afeta a vida cotidiana de uma camada de pessoas invisíveis no dia a dia: marisqueiras, pescadores, vendedores ambulantes, ribeirinhos, donos de bares e restaurantes, garçons e barraqueiros. Pessoas que vivem do/no mar, e não apenas vão ao mar.
Com a notícia do derramamento de óleo no litoral do nordeste brasileiro, evidencia-se o que se pode considerar um dos maiores desastres ambientais na história do Brasil. Todos os nove estados do Nordeste foram afetados.
A Constituição Federal de 88 prevê, no art. 225, que o meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito de todos, mas para garanti-lo como bem essencial à sadia qualidade de vida, impõe-se tanto ao Poder Público quanto à coletividade o dever de preservá-lo e defendê-lo. O que os nordestinos têm feito é a demonstração de que as palavras do constituinte têm uma força vinculante e uma efetividade sem precedentes.
Independentemente da omissão do poder público, a população visível apenas no preto e branco tem demostrado que o meio ambiente, direito difuso que é, pertence a todos e é dever de preservação também por todos.
Os pintores nordestinos têm feito uma bela obra de arte, descortinando o que se entende pela arte da pintura do óleo sobre a tela. Aqui, a arte se encontra justamente em devolver à natureza o que lhe pertence. Mãos, pás e vassouras assumem papel de pincel sobre uma tela azul e branca onde o óleo é externalidade não bem-vinda. É o direito ambiental na prática.
Diego Pereira é Procurador Federal (AGU) e autor da obra Vidas Interrompidas Pelo Mar de Lama (Lumen Juris, 2018). Professor em Curso de Direito, costuma escrever sobre direito, literatura e cotidiano.
Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade dos autores