Os 50 anos do tri e a história de George, o melhor

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  • Paulo Leandro

Publicado em 13 de maio de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Poderia até escrever sobre mais um aniversário do Esporte Clube Vitória, no dia da suposta abolição, uma coincidência fortuita, daria um bom arrazoado, mas não, seria lugar-comum demais, quem sabe para o ano, até por nem termos certeza se vamos voltar a ter qualquer vitória ou bahia, no ritmo crescente da pandemia nestas plagas...

Vamos por outra trilha, outra cachoeira. Uma boa razão para lutar bravamente pela vida, mesmo, ao menos até o próximo dia 21 de junho, é poder brindar ao cinquentenário de uma das boas conquistas compatíveis com a mentalidade média do brasileiro comum: o tricampeonato mundial de 1970 no México.

Os seres integrantes deste aspirante a país conhecem de cor e salteado, se bem alcançaram a doce condição de alienados, as qualidades daquele escrete, cujo padrão foi, com muita competência, apropriado pelo grupo político alçado ao poder na mais recente eleição direta.

Basta lembrar serem nossos atacantes camisa 10 em seus times de origem: o ritmo artilheiro do Furacão Jairzinho; a sagacidade do Rei Pelé; a patada atômica de Riva; e a inteligência de Tostão. 

A categoria de Clodô revezava no meio-campo com a maestria de Gérson, ambos à frente de uma sólida defesa, feita de bons casamentos: Brito batia, Piazza saía jogando... Carlos Alberto apoiava, Everaldo guardava posição.

Outra boa dica para nós, alienados, não esquecermos jamais da qualidade do scratch: basta verificar o banco de reservas. Paulo César, Roberto, Edu, Fontana, Marco Antônio, onde a vista batia, tinha algum puto jogador de bola tecnicamente aquecido.

Ah, mas foi Saldanha o responsável por armar o time, e mimimi... Este debate é menor e pende mais para política, pois João-sem-medo não agradava aos herdeiros do marechal Deodoro da Fonsêca, proprietários da república dita brasileira por terem sido seus legítimos fundadores. Terminou exonerado do posto enquanto seus companheiros de ideal perdiam a vida no calabouço.

O tri da Seleção em 1970 é a afirmação de uma materialidade inequívoca: “o que é, é; o que não é, não é”, numa leitura muito rasa e arriscada de Parmênides, convocado aqui apenas para tentar puxar conversa em favor de alguém cuja lacuna é um absurdo e todo este meu prolegômeno sobre os 50 anos do México foi apenas para alcançar este sempre misterioso território do invisível. 

Trata-se de George Best, sim, o melhor, o norte-irlandês ídolo do Manchester United, alguém cuja autobiografia registra simplesmente a seguinte frase: “se eu quisesse, seria melhor do que Pelé”.

Pelé teria reconhecido esta concorrência, ao dirigir-lhe uma carta, já nos seus últimos dias de vida, subtraída em 2005, ao considerá-lo “o segundo melhor jogador do mundo”, numa tentativa, talvez, de tirar Maradona de tempo, pois o tal "rei" não é de fazer estes agrados sem alguma malícia.

O melhor jogador da Inglaterra naqueles idos de 1970 teria sido o encaixe perfeito no team da rainha, derrotado por 1x0 pelo Brasil, gol de Jairzinho, depois de Pelé rolar a bola para o Furacão, dentro da área, atraindo a marcação destinada ao jogador do Botafogo.

Mas Best nascera em Belfast e a Irlanda do Norte não ganhou vaga na Copa e nem ele podia cometer a blasfêmia de sequer levar em conta a possibilidade de reforçar os ingleses, pois este é um assunto tabu nas entranhas do Reino pra lá de Desunido.

O ponta esquerda era magrelo e balançava o corpo fácil, aliando a velocidade a um controle de bola de grudar a redonda no pé, ou o pé à redonda, de forma a tornar-se um único ser, inviabilizando qualquer marcação dos intrépidos mas apavorados laterais.

A carreira de Best foi banhada no néctar da marvada da birita, ainda mais numa terra onde pub é nome sofisticado de boteco e o uísque é sagrado e guardado décadas para ficar bem amendoado.

Para completar a farra, as mulheres de perfil estético mais padronizado, conforme a eugenia reinante, eram loucas por ele, conferindo-lhe o cobiçado título, este sim abençoado, de tricampeão sexy do mundo, ao ser devorado por três vencedoras do Miss Universo.

Entre um gole e outro, destruiu as defesas do Benfica e do Madri, em lendárias vitórias do Manchester, além de ter brincado de entortar seus marcadores e balançar os filós britânicos, sem passar a bola para ninguém, justificando o apelido: fominha!

Tão fominha era Best a ponto de tirar Bob Charlton, seu parceiro de time, da famosa fleuma inglesa. Certa vez, em mais um momento de sair do sério com aquele chato coleguinha individualista, Bob exclamou: “seu irlandesinho safado!". Ao perceber o desfecho do lance, retificou, meio sem jeito: "...que golaço, heim!” hahaha

Morreu de cirrose, isso depois de ter feito transplante do fígado, e ainda assim continuar em altas doses cowboy (sem gelo), provando a correção da proposta de Sêneca em relação a aproveitar o tempo, devido à “brevidade da vida”.

É do filósofo George Best a famosa frase: “Gastei quase tudo que ganhei em bebidas, velozes carros importados e noitadas fantásticas com namoradas lindas! O resto eu desperdicei”.

Sua própria esposa não o teria reconhecido, ao passar por um senhor corcunda e maltrapilho, numa das suas noitadas perdidas, já nos estertores de sua vida intensamente sorvida em alegrias e delícias.

Falido e doente, depois de ter alcançado os píncaros da glória em um país habitualmente xenófobo, em especial a irlandeses (irish é significado como bobão em Londres), Best desceu ao inferno, ao roubar, quando já não havia outro recurso para saciar a sede.

Falido, doente, mas adorado por todos e todas quantos o conheceram por seu jeito afetuoso e sempre risonho, disposto a extrair da vida todo seu potencial de felicidade. Basta lembrar terem sido 100 mil pessoas a chorar sua morte no velório no Parlamento norte-irlandês e depois, a invasão ao cemitério, bêbados e sóbrios, todos malucos por George The Best. 

Por tudo isso, ao lembrarmos do sucesso deste lugarejo aparentado a país, nos 50 anos do tri, podemos por tabela, registrar o quanto a Copa e o mundo perderam, por deixarem na dimensão do ‘nada’ o futebol e a história de George, o melhor.

Aqui você pode melhorar, aperfeiçoando seu inglês e conhecendo um pouco mais de Best, o grande campeão, sem nunca ter sido: https://www.youtube.com/watch?v=T6LHlqtTDuQ

Paulo Leandro é jornalista e prof. doutor em Cultura e Sociedade