Os fantásticos artefatos do afeto

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  • Kátia Borges

Publicado em 15 de dezembro de 2019 às 05:09

- Atualizado há um ano

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Nascer leva anos. Lembro do dia em que os gêmeos chegaram. Família cresce nessas horas de muitos modos. Minha mãe amava a ideia de serem dois. Eu também. A primeira vez que vi os pequenos, ela olhava o mundo com curiosidade. Falei seu nome, buscou minha voz. Ele chorava, vermelho de tão branco, a plenos pulmões.

Guardo uma recordação igualmente viva do nascimento da mãe deles. As pernas compridas de bailarina. A primeira neta, a primeira sobrinha. Um aprendizado de dores e delícias que atravessou infância e adolescência. Amar é, sobretudo, risco. Pede coragem. Se hoje escrevo sobre isso, a mesma alegria me envolve.

Alegria é coisa que se aprende. Voltei a ser criança quando minha sobrinha mais nova nasceu. Na época, a prole de crianças da família já havia crescido outra vez. Agora havia um menino. Um garoto que se parecia muito com nosso avô paterno. Um moço que esticou em milhões de centímetros nosso infinito de afetos.

A mais nova dos sobrinhos costumava passar as tardes conosco, quando eu ainda morava com meus pais. Improvisávamos brincadeiras malucas. Criamos uma estação de rádio só nossa, treinamos mentalizações silenciosas para chamar o cachorro. Amadureci um pouco (e ri muito) com cada um deles.

Família é escolha, dizem os amigos, certamente pensando em seus amigos. Família é carma, vaticinam os que sofrem com seus parentes. Penso que ter uma família é bênção, desafio e exercício, tudo a um só tempo. Se você tenta se conectar com aquelas pessoas, já está no lucro. Sim, porque conexões não são mecânicas.

Com paciência, ao longo de muitos anos, minha irmã mais velha encontrou o caminho para o meu coração arisco de capricorniana. Sua alma franca, seu sorriso largo. A força alquímica dos raios que a protegem. Aos seus cuidados, deixou-me a nossa mãe. Mais ainda, sábia e cuidadosa, entregou-nos uma aos cuidados da outra.

E ainda tive a sorte de ganhar mais uma irmã na vida adulta. Não crescemos juntas, mas parece que ela esteve comigo sempre. Nos vemos pouco, mas cada abraço nos reconecta imediatamente. Quando faz tempo ruim, as minhas duas irmãs abrem os seus guarda-chuvas. São fantásticos, esses artefatos do afeto.