Para-brisa limpo, prato vazio

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  • D
  • Da Redação

Publicado em 4 de julho de 2019 às 08:08

- Atualizado há um ano

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Nossa história já presenciou cinco extinções em massa, que funcionaram como um recomeço evolucionário. Há 450 milhões de anos, 86% de todas as espécies vivas foram mortas. Setenta milhões de anos depois, 75%. Cem milhões de anos após, 96%. Cinquenta milhões de anos depois, 80%, e 150 milhões de anos depois, mais uma vez, 75%. De todas elas, apenas uma, a que matou os dinossauros, foi provocada por um asteroide. Todas as outras foram em função de mudanças no clima da Terra. Uma sexta extinção está em marcha, e você pode percebê-la de uma forma mais fácil que imagina.

A sensação de que o número de insetos que se espatifam nos para-brisas tem diminuído é uma pista para percebermos como a população de abelhas, gafanhotos, libélulas, formigas, besouros, borboletas, entre as mais de 1,5 milhão de espécies conhecidas - três vezes mais do que o número de espécies de outros animais somadas -, tem diminuído. E esse declínio pode significar a extinção de uma boa parte da vida do planeta.

Pesquisadores da Universidade de Sydney e da Academia Chinesa de Ciências Agrárias perceberam que os insetos estão caminhando para a extinção, o que nos levaria a um “colapso catastrófico dos ecossistemas da natureza”, ao analisaram 73 estudos de longo prazo sobre o declínio de insetos ao redor do mundo. A conclusão é de que mais de 40% das espécies de insetos estão sofrendo quedas populacionais em um ritmo constante, e a uma velocidade oito vezes maior, em média, do que a dos mamíferos, aves e répteis. Estudo publicado na Science, analisando dados de pesquisas de campo da Sociedade de Entomologia de Krefeld, Alemanha, desde 1989, constatou que a biomassa de insetos que fica presa em equipamentos de captura diminuiu 80%.

As abelhas venceram o plâncton na “final” da escolha realizada pelo Instituto EarthWatch, em novembro de 2008. De acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), abelhas ou outros insetos são necessários na polinização de cerca de 84% das culturas para consumo humano. Estudo da própria FAO, que comparou 344 regiões agrícolas na África, na Ásia e na América Latina, concluiu que a produtividade é mais baixa nos terrenos que atraíram um menor número de abelhas durante a temporada principal de floração.

Diversas são as causas apontadas desse declínio: a urbanização, a agricultura intensiva, o uso de pesticidas e as mudanças climáticas que alteram, por exemplo, os períodos de sincronia entre a floração das plantas e a chegada ou a eclosão dos insetos. Sem eles, o colapso da cadeia alimentar, causado por uma cascara trófica de baixo para cima, atingirá desde predadores até as plantas, aniquilando ecossistemas inteiros, com prejuízos econômicos incalculáveis.

Para impedir essa tragédia, é urgente uma drástica redução no uso de produtos químicos como herbicidas, fungicidas e pesticidas, que, quando aplicados, atingem espécies não-alvo, e os neonicotinoides, que têm sido associados ao declínio mundial das abelhas. Infelizmente, de maneira irresponsável, o Brasil bateu recordes na liberação de quase 200 novos agrotóxicos só este ano, alguns proibidos na Europa há mais de uma década.

O desaparecimento dos insetos é o golpe final no complexo sistema que sustenta a vida na Terra. Se eles desaparecerem, não irão sozinhos.

André Fraga é engenheiro ambiental e secretário de Sustentabilidade, Inovação e Resiliência de Salvador