Puxadinhos da pandemia: auxílio emergencial faz aquecer mercado de material de construção

Associação dos Comerciantes de Material de Construção da Bahia aponta aumento de quase 10% nas lojas de material de construção das periferias

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  • Marcela Vilar

Publicado em 13 de julho de 2020 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Tiago Caldas/CORREIO

Com o auxílio emergencial, que foi recebido por mais de 60% da população da Bahia, a renda média das famílias baianas aumentou 25,9% no mês de maio: o valor passou de R$ 628,7 para R$ 791,5 por pessoa, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Com essa renda extra, os baianos aproveitaram a pandemia para reformar suas casas e as vendas aumentaram nas lojas de material de construção, principalmente nas periferias.  “A partir do momento que o governo liberou o auxílio, a gente sentiu um aumento progressivo das vendas, principalmente em maio e junho, em que elas foram superiores ao do ano passado”, constata Hebert de Souza, sócio da loja de materiais de construção Construsouza, em São Marcos. “Com tudo bloqueado -  shoppings, festas e praias -, as pessoas passaram a investir esse dinheiro em casa”, avalia o gerente da empresa, onde o lucro aumentou 29% em junho deste ano em relação ao mesmo mês de 2019. O dado foi ratificado pela Associação dos Comerciantes de Material de Construção da Bahia (Acomac-BA): enquanto que o consumo nas lojas de material de construção que ficam no centro da cidade reduziu em 12%, ele aumentou cerca de 8% nas lojas do segmento na periferia. Para o presidente da Acomac-BA, Geraldo Cordeiro, esse crescimento na periferia é consequência direta do auxílio emergencial. A conclusão também foi tomada a partir da análise do perfil do cliente, que compra aos poucos e num valor abaixo de R$ 150. “É o consumo formiguinha, de construir um puxadinho, que vem segurando o setor. As pessoas destinaram uma parte do auxílio para poder ajustar a casa”, explica Cordeiro.  “Todos os bairros da periferia, não só de Salvador, mas em outras cidades da Bahia, tiveram um bom volume de vendas”, informa o presidente da Acomac, após um levantamento feito com lojistas baianos e citando os bairros de Paripe, Plataforma, Cajazeiras, Pau da Lima, Periperi e São Caetano como alguns dos principais protagonistas. Codeiro ainda alerta que, no geral, não houve crescimento do setor de material de construção, e, sim, uma queda menor em relação ao início da pandemia. Dados mais recentes do IBGE apontam que, enquanto que em abril houve redução de 24%, em maio, o percentual foi de 5,1%, quando comparado aos mesmos meses de 2019. Ou seja, houve uma grande recuperação da categoria, principalmente em relação a outros setores, como o automobilístico, que continuou em baixa, agora de mais de 50%.“Meus clientes de classe média sumiram todos, só quem tá comprando é do auxílio emergencial”, diz Gilberto Cerqueira, 60, proprietário de uma das maiores lojas de material de construção de Salvador: O Fazendão, em Cajazeiras.“A clientela que tá entrando na loja é gente que não tinha nada dentro de casa. Você vê a felicidade de comprar um só item”, narra Cerqueira, que diz ainda que seus clientes não compram muito. “Não tem compra grande, de R$ 1 mil. Sempre quando vem, compra um pouquinho. É coisa de 20m² de piso”, exemplifica. Quem aproveitou para fazer reforma na casa foi Gabriela Silva, 23, que mora em Tancredo Neves. Por ser mãe solteira do menino Ian, 3, e não ter carteira assinada, ela teve direito a um auxílio mensal de R$ 1,2 mil. Começou a arrumar o andar de cima do imóvel em que morava com a mãe, além de estar construindo um muro na frente da casa. “As paredes já estavam levantadas, mas não tinha reboco. Coloquei forro PVC, piso, vaso sanitário, pia do banheiro e vou pintar as paredes”, planeja. Carolyna Teixeira, 29, estudante de pedagogia e moradora de Lauro de Freitas, também conseguiu o mesmo valor do auxílio. Mãe solteira de duas crianças e beneficiária do Bolsa Família, Carolyna já tentava fazer a reforma em sua casa há quase três anos, mas nunca sobrava dinheiro. “Tinha que me dividir por três”, diz. Depois que começou a receber as parcelas de R$ 1,2 mil, a estudante reformou seu quarto, mudou a parede, comprou beliche e um guarda-roupa para os filhos. Com as próximas parcelas, ela planeja ainda comprar uma TV para a avó. “Nada mais justo do que investir neles”, completa. Segundo a Acomac-BA, os produtos mais comprados são blocos, cimento, piso e cerâmica para a construção, assim como telhas e materiais impermeáveis para se proteger das chuvas - o mês de abril de 2020 foi o mais chuvoso dos últimos 14 anos, de acordo com a Codesal - e também equipamentos para a manutenção da rede elétrica, como resistências e disjuntores, além de varais e louça sanitária.

Recorde A Bahia foi o estado em que mais se comprou materiais de construção no mês de junho, segundo a jornalista Miriam Leitão, colunista do O Globo e do CORREIO. A Vedacit, que produz materiais impermeabilizados e tem fábrica em Salvador, bateu seu recorde de faturamento e teve alta de 32% nas vendas.  O CEO da empresa, Marcos Bicudo crê o auxílio emergencial teve impacto no resultado e o que destaque no estado veio pelo consumidor que faz pequenas compras por mês. “Metade do setor de material de construção é movimentado por informais, que fazem pequenas compras. O impacto é grande e julho deve manter o ritmo de junho”, conta o executivo. No setor industrial, a fabricação de produtos de materiais de construção retraiu 11,9% em maio deste ano se comparado a maio de 2019, como foi informado pelo último relatório da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb). A avaliação da área técnica da Fieb é de que o setor não está muito diferente dos demais. A maior queda foi no segmento de veículos automotores, com baixa 97,2%, seguido do setor de equipamentos de informática, que caiu 62,7%. Os setores que apresentaram maior aumento em maio em relação ao mesmo mês do ano passado foram o de refino de petróleo e biocombustíveis, que cresceu 26,8%, seguido da indústria alimentícia, com alta de 7,9%. Em Simões Filho, a Blocos Líder, que produz pré moldados de concreto, como pisos e blocos, foi uma das teve retração com a pandemia. “Como não fazemos estoque e nossa produção é em função da demanda, deu uma diminuída”, esclarece o gerente administrativo Márcio Luede. A fábrica, que estava em crescimento de 11% no primeiro trimestre em relação a 2019, registrou baixa de 12%.

Serviços gratuitos  Para as famílias com renda de até três salários mínimos, a Prefeitura de Salvador, através da Secretaria Municipal de Infraestrutura e Obras Públicas (Seinfra), disponibiliza arquitetos e engenheiros para elaboração de projetos de construção ou de obras de ampliação de imóveis. O serviço é gratuito e oferecido pelo Escritório Público de Arquitetura, Urbanismo e Engenharia, localizado na sede da Seinfra, no Vale dos Barris, 125 (após o pátio da Transalvador). A atividade, contudo, está suspensa com a pandemia, pois só pode ser realizada após atendimento presencial. A Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia (Faufba) também tem um Escritório Público. Para mais informações, é só mandar e-mail para a coordenadora do projeto, professora Rosana Muñoz: [email protected]

*Sob orientação da chefe de reportagem Perla Ribeiro