Relações de trabalho tensas: aprenda a não paralisar com os erros e transformá-los em lições

Autoperdão ajuda a lidar com ansiedade gerada por relações de trabalho difíceis

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  • Carmen Vasconcelos

Publicado em 28 de junho de 2021 às 06:00

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Shutterstock/reprodução

Errar é humano e o erro pode ser uma ferramenta excelente para se alcançar acertos. Se o oficial médico inglês Alexander Fleming (1881-1955), por exemplo, não tivesse saído de férias e esquecido as culturas das bactérias em seu laboratório, no Hospital St. Mary, em Londres, sem o acondicionamento correto e sem nenhuma supervisão, ele jamais descobriria a penicilina. 

Apesar desse aspecto educativo, o erro, especialmente nos ambientes de trabalho, pode ter um efeito paralisante, fazendo com que o autor do desacerto fique remoendo a situação e o foco no erro estimule que novas situações ocorram. O Correio ouviu especialistas que dão dicas sobre como usar o erro tão humano numa ferramenta de aprimoramento pessoal.  Mino Rios salienta os traços de personalidade como um enfatizador da ansiedade diante de tarefas e de autocrítica, mas reforça a importância de um ambiente salutar de trabalho (Foto: Divulgação) O professor do Curso de Psicologia da Unijorge, Mino Rios diz que, em contextos informais, o erro pode ser encarado com muita naturalidade e até servir como elemento de relaxamento. A coisa só ganha outros contornos quando há uma auto cobrança envolvida. “Existe um traço de personalidade que a psicologia denomina neuroticismo que pode ajudar a entender um pouco essa questão. Quanto mais intensificada essa característica, maior a probabilidade da pessoa apresentar ansiedade diante de tarefas, de se sentir insegura consigo mesma e manifestar níveis elevados de autocrítica”, explica. 

Paralisia Para o professor, o contexto onde o erro ocorre também pode favorecer uma certa paralisia diante do erro. “Pense em uma pessoa que se depara com uma ameaça: se for uma ameaça simples e que ela possa dar conta, ela vai enfrentar. Se for algo que ofereça muito risco, ela tende a fugir. Acontece que na nossa vida cotidiana as coisas nem sempre são tão simples. Várias situações envolvem riscos intensos, mas que não nos permitem escapar fugindo simplesmente. Esse é o caso no ambiente corporativo”, diz.

A psicóloga Carmen Rezende lembra que quando se erra e isso é acessado por outras pessoas, quem errou fica exposto, ativando a insegurança, especialmente em tempos difíceis como os atuais. “Essa insegurança é oriunda, muitas vezes, de alguns pensamentos mais ‘catastróficos’ das consequências daquele erro (medo de ser demitido, medo de não se recolocar bem depois no mercado de trabalho, medo de ficar com uma má referência do último emprego)”, esclarece.  A psicóloga Carmen Rezende lembra que ninguém erra por gostar do fracasso e que é preciso ter uma atitude mais compreensiva consigo próprio diante do erro (Foto: Arquivo Pessoal) No contexto de trabalho, a tendência de uma exigência maior ocorre por diversos motivos, sobretudo, porque há uma busca por resultados. Mino Rios salienta que esse fator tende a se tornar mais comum e intensificado em cenários onde acontece o assédio e/ou onde existem riscos elevados, se intensificando em situações inesperadas. “É importante destacar que fatores de contexto mais amplo começam a interferir também, quando nossa sociedade se torna sistematicamente mais crítica, menos tolerante ao erro, mais “controladora” e mais sobrecarregada de tarefas. Tudo isso somado tende a ocasionar um efeito acumulado onde falhas são menos toleráveis, mas mais recorrentes”, pontua.

Auto aceitação

Mas se o erro já foi cometido, o que fazer para romper o ciclo da paralisia/cobrança/vergonha? A psicóloga salienta que ninguém erra porque gostaria de errar, mas algumas pessoas agem no momento da falha com muita severidade a si mesmas. 

“Essas pessoas, inconscientemente, tem a crença de serem incompetente e uma autocrítica muito grande, então fica difícil se perdoar, pois elas estão sempre se exigindo demais e mais que os outros. Não conseguem admitir as coisas positivas e boas que já desenvolveram no decorrer da sua trajetória, constantemente minimiza os desafios bem-sucedidos que tiveram”, completa.

Carmen Rezende explica que a capacidade do auto perdão está diretamente relacionada à auto-aceitação. “Quando conseguimos exercitar o auto perdão, reconhecemos que também temos direito de falhar e isso não me faz um profissional ruim, pois temos muitas qualidades vieram conosco e que fomos desenvolvendo em nosso caminho”, pontua, lembrando que auto perdão é tomar consciência de quem você é: nem melhor nem pior do que ninguém.

Mino Rios vai além e esclarece que não se trata de ser complacente com os erros simplesmente, mas de entender que os erros fazem parte do processo, que se pode (e deve) tentar aprender com eles. Para ele, as empresas e organizações e os profissionais podem desenvolver estratégias para gerir pessoas de forma mais eficiente e que isso passa por formas de lidar melhor com a ansiedade e com o erro, e não de fomentar ou tensionar as relações com a desculpa de colocar tudo a e todos continuamente à prova. “Para isso, é essencial uma revisão na postura dessa relação postura pessoal, desenvolvendo resiliência, bem como na relação líderes e liderados, compreendendo o erro como parte do processo de toda ação humana”, completa.

Se errar é humano, é preciso aprender a lidar com ele e o professor afirma que a prática do perdão pessoal é benéfica e preventiva de novos erros. “Existem estudos que indicam o efeito na saúde física e mental de quem realiza essa prática, inclusive a redução das emoções negativas associadas a ofensa como culpa, vergonha, remorso e/ou autocondenação. Quanto mais eu mantenho uma carga de remorso/ culpa, maior a minha ansiedade e meu estresse em situações futuras que potencialmente envolvam o erro”, explica. 

Passo a passo para superar a culpa

1.    Reconheça a falha entendendo que ela faz parte do processo de aprendizagem de todo mundo.

2.    Reduza ansiedade em relação ao que precisa ser corrigido, pois ela impede que a reflexão sobre os detalhes de determinados resultados.

3.    Tente entender como você pode aprender com seus erros. Lidar com os erros por meio da observação dos erros cometidos é aprender a caminhar melhor. 

4.    Faça acordos consigo mesmo, lembre-se de suas conquistas na vida. Tudo que conquistamos requer um passado com erros.

5.    Admita que, se precisar, você pode começar de novo. Em resumo, assuma sua responsabilidade, aprenda a lição subentendida e desprenda-se do fardo da culpa que, não somente não define a situação ruim, como consegue torná-la pior.