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Da Redação
Publicado em 17 de junho de 2019 às 14:05
- Atualizado há um ano
No início do século XX, na Alemanha, ganhava visibilidade e reconhecimento a sociologia compreensiva de Max Weber, com a qual o autor de A Ética Protestante e O Espírito do Capitalismo reservava lugar de destaque às subjetividades e às teias de significados nas quais os homens “se enroscavam”.
Compreender como compreendiam tornou-se uma ferramenta interpretativa fundamental para analisar o lugar das ideias nos contextos em que são afirmadas as diretrizes dos tempos que se projetam como “novos” (o novo) e ganham sínteses pretensiosas como “nova era”, “nova política” e assim por diante.
Dessa rica e atual fortuna crítica recebemos também as referências para compreender a configuração do “prestígio” como categoria de análise.
Em poucas palavras, em determinadas configurações sociais o prestígio é afirmado não quando a pessoa ostenta o que tem, mas quando ostenta que tem aquilo que nem todos têm.
Em relação à Universidade Pública brasileira, essa conceituação pode nos ajudar a perceber que o prestígio da instituição muitas vezes esteve associado à seletividade decorrente da escassez de vagas.
Embora em nenhum momento de sua história, que é recente, a Universidade Pública brasileira contasse apenas com as camadas ricas da população, registrando-se sempre a presença de personagens de todos os estratos sociais, a escassez de vagas contribuía para que o acesso à vaga fosse assimilado socialmente como expressão singular de mobilidade social.
Em relação ao século XX, a novidade no início do século XXI é que a Universidade Pública brasileira, retomando uma frase de Darcy Ribeiro, “tingiu-se de povo”.
Os gastos para manter estruturas com densa produção intelectual no âmbito do ensino, da pesquisa e da extensão, nunca foram de pequeno porte. Mas passaram a ser considerados “inexequíveis”, “insustentáveis” e até “irresponsáveis” no momento em que não é mais possível associar a vaga ao “prestígio” de se ter aquilo que somente alguns têm.
No final da década de 1950 e início dos anos 1960, na cidade de São Paulo foram escritos inúmeros editoriais na grande imprensa expondo a preocupação daqueles que “respondiam pela riqueza nacional” a respeito das propostas de ampliação do acesso ao ensino ginasial público, o equivalente ao que hoje denominamos ensino médio.
Sem meias palavras, afirmava-se que a escola pública seria destruída pelo povo se ao povo fosse concedido acesso “sem custos”.
É bastante usual a referência a uma época de ouro da escola pública, aludindo ao tempo em que ensinava, mas, na verdade, suspirando de saudades por um momento em que a educação pública tinha prestígio porque era de alguns. Era considerava efetiva quando tinha na seletividade uma de suas bases estruturais.
A ampliação do acesso à Universidade Pública configurou-se como utopia inclusiva e conseguimos em poucos anos uma expressiva elevação nos números de matrícula.
Esses números, se observados com a lupa da análise social, revelam que entraram em cena personagens altamente improváveis.
As Universidades Federais brasileiras têm escolas, faculdades e institutos nos quais mais de 70% dos matriculados têm renda familiar inferior a R$ 1.800.
A instituição ganhou qualidade, profundidade, diversificação, e tornou-se mais acessível, ainda que lute para concretizar-se como espaço verdadeiramente mais inclusivo.
Porém, perdeu prestígio quando se pintou de povo. Pintada de povo passou a ser identificada com a instabilidade orçamentária irresponsável e passou a receber prognósticos sombrios: somente sobreviverá se cobrar mensalidades.
É fundamental enfrentar crises políticas e econômicas preservando os mínimos ganhos inclusivos que essa sociedade escandalosamente desigual conseguiu.
Comparados às reais necessidades, são irrisórios os números da expansão do acesso à Universidade Pública no Brasil, mas teremos que defender esse pouco como se fosse tudo, porque esse pouco corre o risco de ser submetido a irreversível sucateamento.
A Universidade Pública como utopia inclusiva é patrimônio de nossa juventude. É de todas as classes, raças, etnias e gêneros.
O país ganhará se reconhecer que essa Instituição não precisa voltar a ter prestígio (que é diferente de reconhecimento). O país precisa aprender com a história e entender que prestígio é inútil quando a escola se pinta de povo.
Gilberto Giusepone é diretor do Cursinho da Poli e presidente da Fundação PoliSaber
Opiniões e conceitos expressos nos artigos são de responsabilidade dos autores