Salvador, cidade das laranjeiras, com fama para além da fronteira

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  • Nelson Cadena

Publicado em 7 de dezembro de 2018 às 05:02

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Existiu uma cidade no Hemisfério Sul onde as flores brancas das laranjeiras embelezavam os campos e jardins e expeliam o seu peculiar aroma que se assemelhava ao do jasmim, impregnavam ruas e vielas de um odor relaxante; cidade pacata onde o vento refrescava as sacadas das residências na virada da maré, bem antes do tiro de canhão do forte que, às 17 horas, anunciava o entardecer.

Na cidade das laranjeiras também havia fartura de mangas quase que o ano inteiro, nas áreas mais elevadas, vistosas plantações de orquídeas para exportação; nas baixadas, amoreiras para o bicho de seda tecer os seus ricos fios; e por toda parte esplendidos coqueirais. Os visitantes apreciavam a doçura das uvas e os mais afoitos comiam no pé os frutos das cajazeiras e pelo menos uma visitante famosa (Maria Graham) admirou os pimenteiros da Índia em volta do Dique.

Essa localidade era a Cidade da Bahia, hoje conhecida como Salvador, embora privada para sempre de sentir o refrescante aroma das flores de laranjeiras que encantava os viajantes estrangeiros e seduzia as mulheres da terra, instadas ao preparo de emplastros para a pele e os cabelos. As flores de laranjeira acalmavam os nervos e diziam que, aplicadas com outros fitoterápicos, apressavam a cura do beribéri. Essa cidade que se transformou em uma metrópole não exibe hoje um único pé de laranjeira visível.

Quando o contrabandista Inglês Thomas Lindley aportou na Bahia, em 1808, após um passeio consentido no entorno do Forte do Barbalho, escreveu no seu diário: “Os vales vizinhos têm muitas laranjeiras, agora todas floridas. O ar ficou logo excepcionalmente impregnado de sua fragrância”. Chamou a atenção para as valas circulares cheias de água como proteção contra as formigas. Maria Graham, dama de companhia de Maria da Glória, filha de Dom Pedro I, também observou na Bahia os regos com água para evitar que as laranjeiras fossem depenadas por “milhões de formigas”. Exagerava.

Pela mesma época, o holandês Maurice Ver Huell, na sua estada compulsória na cidade, logo após baixar âncoras, recebeu a visita de um canoeiro e se fartou de “bananas, ananás e laranjas” e no dia seguinte, subindo as ladeiras, reparou ao longo do dorso da montanha “nos aprazíveis jardins de laranjeiras e altivas palmeiras”. Dias depois, convidado a visitar a casa de Dona Maria Violante, na Cidade Baixa, entusiasmou-se com os beija-flores e borboletas e “as laranjeiras carregadas de flores e frutos, ao mesmo tempo, espalhando-se entre umbrosas e altivas mangueiras”. 

As laranjeiras exibiam seus frutos por toda parte, as do Cabula granjearam fama, as chácaras do bairro ostentavam magníficos exemplares da fruta. Em 1919,  a Bahia Ilustrada destacava a exuberância de nossos laranjais: “Dão fruto que é o mais formoso e grande que há no mundo”. Não exagerava. A fama da laranja da Bahia ultrapassara as fronteiras desde o remoto ano de 1873, quando a espécie de umbigo foi introduzida na Califórnia, a partir de três mudas do Cabula, origem dos ricos laranjais que hoje tornam o estado americano entre os maiores produtores do mundo.

Os laranjais da cidade da Bahia aos poucos desapareceram, enquanto o cultivo da fruta se expandia pelo interior, a partir da estação de citricultura de Alagoinhas, que chegou a distribuir (1939) um milhão de mudas. Perdemos o privilégio de ter em nosso quintal a melhor laranja do mundo. E a sua decantada fragrância. No século XVIII, uma rua do Pelourinho ganhou esse nome. Próxima  semana conto como isso aconteceu.