Salvador Unida: grupo doa alimentos para evitar que pessoas saiam de casa para trabalhar

Pessoas que viviam na rua e sem renda fixa recebem auxílio de voluntários da Igreja da Graça

Publicado em 22 de março de 2020 às 09:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marina Silva/CORREIO

Todos devem ficar em casa, essa é uma das indicações dos órgãos governamentais para combater o novo coronavírus (Covid-19). Para quem trabalha com atividades informais, como reciclagem e comércio ambulante, ficar em casa significa não ter como ganhar dinheiro, nem para se alimentar. Pensando na condição das pessoas com trajetória de rua durante a pandemia da doença, voluntários da Igreja de Nossa Senhora da Graça, com auxílio do Mosteiro de São Bento, criaram a campanha Gesto Solidário para recolher doações a serem entregues a pessoas que estão desamparadas durante a quarentena.

O pedido é que cidadãos e fiéis doem água; álcool gel; sabonetes em barra ou líquidos; lenços de papel; papel toalha e papel higiênico para a campanha. De acordo com a Coordenadora do grupo, psicóloga e oblata, Cristiane Moraes, o grupo atende cerca de 70 pessoas com histórico de situação de rua, que receberam casas ou possuem auxílio aluguel, mas continuam necessitando de assistência. “Não se apaga anos de rua da vida de uma pessoa”, disse.

As reuniões do grupo acontecem sempre nas sextas-feiras das 14h às 17h. No encontro desta semana, na Igreja da Graça, os voluntários entregaram cestas básicas para as pessoas que recebem o auxílio e também ressaltaram a importância de ficar em casa enquanto durar a quarentena. Vinte e oito pessoas buscaram os alimentos até o momento. Na ocasião, ficou combinado um encontro daqui a 15 dias para pegar mais alimentos.

“A dificuldade maior é quem está no Bosque das Bromélias e que não vai conseguir chegar na Graça. Essa parte da população, a gente vai ter que ver como fazer para levar se ainda tiver na quarentena daqui a 15 dias. Pessoas que têm crianças em casa levaram duas cestas, o que dá para 20 dias se manter direito”, disse. 

Junto com uma médica, que integra a ação da igreja, a equipe explicou, no dia 13 de março, às medidas que devem ser tomadas para reduzir os riscos de contágio pelo coronavírus. “Levamos o álcool e a conscientização para realizar a higienização e para o distanciamento entre as pessoas. A médica também explicou quando procurar posto de saúde”, contou.

Quem tem onde cozinhar recebe alimentos para a preparação em casa, já idosos do grupo que não podem cozinhar, recebem alimentos prontos para lanchar e dinheiro para comer no Restaurantes Populares do Comércio e da Liberdade, onde o prato sai por R$ 1.

O grupo ainda que auxilia pessoas em situação de rua, mas a quantidade de beneficiados varia a cada semana devido a locomoção desses moradores pela cidade. A médica voluntária também passou orientações para a população que ainda está na rua. 

“Quando acaba a reunião na Igreja da Graça, vamos para a Cidade Baixa, onde ficam muitos idosos na rua. Passamos pela região das Obras Sociais Irmã Dulce e seguimos no sentido Ribeira. Como vamos muito lá, já conhecemos as pessoas e tentamos organizar os pedidos que elas têm para entregar na próxima visita’, explicou.

As idas à Cidade Baixa estão suspensas durante a quarentena necessária para conter o coronavírus. Neste período, Cristiane diz se sentir impotente por não poder ajudar pessoas que também podem se infectar pelo vírus, mas não tem onde se alojar. “Desejo que a população de rua tenha o amparo das entidades governamentais neste período de isolamento. Ela não tem acesso a água potável, assim é difícil cumprir com as medidas de prevenção contra o vírus, como se higienizar e lavar a roupa”, conta entristecida.

Dentre as necessidades destas pessoas, também está a alimentação e o acesso à saúde durante a pandemia do novo coronavírus. “Seria importante que essas pessoas que estão na rua tivessem pontos para tomar banho e lavar suas coisas. Com muitas pessoas isoladas, deveria haver mais locais para a população em situação de rua ficar isolada. É preciso dar alimentação porque eles não podem exercer suas atividades e até pagar R$ 1 no restaurante popular vai ser muito caro. A pessoa também deve poder ter acesso à saúde durante essa crise”, afirmou.

As doações ao grupo poderão ser entregues no Mosteiro de São Bento (Largo de São Bento – Avenida Sete de Setembro) ou na Igreja da Graça (Largo da Graça), de segunda a sexta-feira, das 09h às 17h.

O grupo Criado há cerca de 3 anos na Igreja da Graça, o grupo é laico, apesar de ter relações com uma instituição católica. Desde evangélicos até candomblecistas, todos se reúnem em prol da luta por habitação na capital baiana. A rede de apoio à pessoa em situação de rua tem o apoio da Prefeitura de Salvador e do Governo do Estado. “Conseguimos auxílio aluguel e doações de casa para algumas pessoas, até já pagamos do nosso bolso o aluguel enquanto um apoio governamental não era liberado. Também acompanhamos pessoas que ainda estão na rua”, contou Cristiane. A oblata tem uma história antiga com ações sociais. Em 1999, a mãe de Cristiane participava da luta antimanicomial em Salvador. Nesta época, começou a relação da família da coordenadora do grupo com o auxílio ao próximo. “Esse ano, a gente teve na Igreja da Graça uma família com 6 filhos que conseguiu uma casa. A gente acompanhou essa família por mais de sete anos, antes do grupo existir. Vi alguns desses filhos dessas pessoas na barriga” relatou.

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*Com orientação da subeditora Clarissa Pacheco