Sobre mulheres, assédio e futebol

Linha Fina Lorem ipsum dolor sit amet consectetur adipisicing elit. Dolorum ipsa voluptatum enim voluptatem dignissimos.

  • Foto do(a) author(a) Miro Palma
  • Miro Palma

Publicado em 10 de maio de 2019 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: .

Conversando com a minha companheira sobre o episódio de assédio que uma torcedora do Bahia vivenciou no último domingo, durante a partida entre o tricolor baiano e o Avaí, na Fonte Nova, ela me disse que “por essas e outras não vai sozinha ao estádio”. Eu sempre soube que ela não se sentia confortável para ir aos jogos sem companhia. Mas, confesso que pouco me interessei a entender o que seriam “essas e outras” que a limitavam a depender de alguém para torcer pelo seu time.

Não precisou de muito esforço para ela cuspir uma lista de situações desconfortáveis comuns às mulheres em jogos de futebol. E eu confesso que não fazia ideia da maioria. Por exemplo, eu não me lembro de segurar o xixi por nenhum outro motivo que não fosse a eminência de um lance importante na partida. Ela, por sua vez, me contou que optou diversas vezes por não ir ao banheiro, especialmente quando o estádio estava cheio, por medo de invasão masculina. Ou, então, esperou a companhia de alguma amiga ou, até mesmo, a minha para ir com ela até a porta – o que acontece em diversos outros ambientes, diga-se de passagem.

Ela também revelou que faz um verdadeiro contorcionismo quando precisa dar passagem aos homens que circulam pela arquibancada. Veja, eu sei que o espaço entre os assentos é bem pequeno, vira e mexe precisamos abrir caminho para quem cruza de um ponto a outro. Mas, isso nunca foi um problema para mim, por exemplo. Já pra ela, a simples circulação entre torcedores traz o risco de uma roçada inesperada.

O único ponto em que, digamos assim, convergimos no desconforto foi quando ela falou dos torcedores que ficam em pé nas pontas das escadas. Sentindo-se donos e proprietários de todo o estádio, eles se instalam de pé no guarda-corpo das escadas mesmo quando há inúmeros assentos vazios na arquibancada. E quando alguém reclama que não está conseguindo ver o jogo, costumam responder com agressividade. Então, se para mim já é difícil lidar com a falta de noção de gente assim, pelo risco de entrar em uma briga desnecessária, imagine pra ela.

Lastimável, meus caros. Lastimável que mulheres precisem passar por diversas coerções até em momentos de lazer. Situações, inclusive, que poderiam ser evitadas com bom senso e, na falta dele, ações simples como, por exemplo, um fiscal na porta dos banheiros femininos e nas escadas. Algumas coisas já estão sendo feitas e merecem o reconhecimento como a presença da Ronda Marinha da Penha nos estádios. O Bahia, por sua vez, através do Núcleo de Ações Afirmativas, prometeu criar um dispositivo para localizar vítimas em aplicativo de celular, fazer panfletagem e intensificar a ação da Polícia Militar. É um começo.

É muito importante que clubes e instituições administradoras de estádios entendam seu papel no combate à violência contra a mulher. E, principalmente, que nós, torcedores homens, exercitemos a empatia por elas, não só nos estádios. Não é difícil agir com respeito. Ao menos, não deveria ser. Encerro esta coluna com o meu mais sincero muito obrigado às torcedoras que seguem, mesmo com todos esses percalços, se mantendo presente nas arquibancadas. Espero que, em um futuro próximo, torcer não seja mais um esforço para vocês.

Miro Palma é subeditor de Esporte. Escreve às sextas-feiras.